PUBLICIDADE

Aumento da violência urbana no Chile põe em xeque popularidade de Boric e sua política de segurança

Crise na segurança pública se soma a derrotas recentes do governo, como a rejeição à nova proposta de Constituição do país e o fracasso da reforma tributária

PUBLICIDADE

Por Daniel Gateno
Atualização:

O aumento da criminalidade no Chile se tornou mais um problema para o governo do presidente Gabriel Boric, de centro-esquerda, após pouco mais de um ano no cargo. A alta na taxa de homicídios e roubos preocupa os chilenos e ameaça a aprovação ao trabalho do presidente.

PUBLICIDADE

Em 2022, os homicídios cresceram 33,4% em relação ao ano anterior, segundo dados da sub-secretaria de Prevenção da Criminalidade do Chile. O número representa a segunda maior variação na América Latina, perdendo apenas para o Equador, onde se observou um aumento de mais de 80% deste tipo de crime. Os roubos violentos aumentaram 63,1% em 2022 e os de automóveis, 39,8%.

Apesar do aumento porcentual, no entanto, o Chile ainda é um país com uma taxa de homicídios relativamente baixa para a região, com 4,6 mortes para 100 mil habitantes, segundo levantamento da InsightCrime, com números relativos a 2022. Comparado com o resto da América Latina, é a menor taxa do continente, ainda que o levantamento não tenha dados de Argentina, Bolívia Peru e Cuba.

A crise na segurança pública se soma a derrotas recentes do governo, como a rejeição à nova proposta de Constituição do país e o fracasso da reforma tributária, crucial para financiar novos programas sociais, no Congresso. Com isso, a aprovação a Boric, que tem se recuperado lentamente desde o ano passado, mas ainda se encontram em níveis abaixo dos 40%, segundo o instituto de pesquisas Cadem, pode voltar a cair, segundo analistas.

No front político, a oposição batalha pela aprovação de leis mais duras em resposta ao aumento da violência. No Congresso, controlado pela centro-direita, tramita em tempo recorde a lei “Naín-Retamal”, que estabelece uma legítima defesa privilegiada dos policiais para liberar os profissionais da corporação de responsabilidade criminal quanto atuarem em legitima defesa ou para impedir um crime.

Boric visita batalhão de policial morta em confronto com criminosos em Quilpué,no Chile Foto: Presidência Chilena / EFE

O projeto —similar ao excludente de licitude que o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro tentou, sem sucesso, aprovar no Brasil — ganhou força depois da morte de Rita Olivares, uma policial dos carabineros, a polícia militar chilena. Ela foi vítima de uma emboscada ao atender uma ocorrência em Quilpué, cidade a 120 quilômetros de Santiago, em março. Na quarta-feira, 5, o Senado aprovou e encaminhou o projeto de lei “Naín-Retemal” para um terceiro processo legislativo na Câmara dos Deputados.

Diante da pressão popular por leis mais duras contra o crime, Boric se vê diante de uma encruzilhada. Eleito com uma proposta de esquerda crítica ao abuso da violência policial, sobretudo durante os protestos contra o governo Sebastián Piñera, em 2019, o presidente procura uma saída para a crise na segurança pública sem desagradar sua base política nem uma fatia maior dos chilenos. Segundo analistas, em 2021, muitos eleitores alinhados ao centro preferiram votar nele para evitar a vitória do ultradireitista José Antonio Kast.

Publicidade

Mudança de tom

Nesta semana, Boric passou a apoiar as ações mais contundentes contra a criminalidade. “São os criminosos que devem sentir medo, não as instituições, muito menos os cidadãos honestos e trabalhadores, que são a grande maioria”, disse o presidente na terça-feira, 4.

Apesar disso, ele defendeu cautela com a tramitação da lei. “Peço que votemos essa lei com um grande sentido de responsabilidade, ouvindo os especialistas e organizações que alertam para seus riscos.”

De acordo com o professor da Universidade Del Desarollo, em Santiago, Eugenio Guzman, Boric se vê numa encruzilhada porque sua coalizão tem muitas discrepâncias internas sobre como tratar o tema da segurança pública, o que tem dificultado diversos acordos para a tramitação de leis.

“Se a lei não for aprovada, o governo será acusado de não apoiar medidas mais fortes contra o aumento da criminalidade e se o projeto for aprovado, será uma solução de curto prazo porque o problema não será resolvido imediatamente”, disse o especialista ao Estadão.

Alta em roubos e homicídios


Em um comunicado, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), pede ao governo Boric que realize um processo participativo na tramitação dos projetos de Lei Naín-Retamal”.

“É importante que as polícias contem com proteção regulatória para a manutenção da segurança pública, mas o Estado deve garantir uma participação mais ampla que inclua membros da sociedade civil, especialistas, acadêmicos e organizações não governamentais”, disse a CIDH.

Boric é aprovado por apenas 35% da população chilena, segundo o levantamento mais recente do instituto de pesquisa Cadem. 60% da população desaprova o seu governo, que sofre, além da violência urbana, com a alta da inflação, que nos últimos 12 meses foi de 11,9%./

Publicidade

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.