Intensas trocas de tiros ecoaram pelas ruas de Beirute nesta quinta-feira, 14, depois de uma manhã de protestos se transformar na pior violência sectária no Líbano em anos, deixando pelo menos cinco mortos e 30 feridos, disseram as autoridades libanesas.
Os confrontos eclodiram em meio a um protesto liderado por partidos políticos xiitas, incluindo o Hezbollah, o grupo militante islâmico apoiado pelo Irã, para pressionar pela remoção do juiz que investigava a explosão do porto de Beirute em agosto de 2020. O juiz, Tarek Bitar, indiciou vários funcionários, incluindo membros e aliados dos partidos xiitas, que o acusaram de usá-los como alvos políticos.
A violência - principalmente entre xiitas e cristãos - desvelou profundas tensões sectárias que foram exacerbadas por uma crise econômica aguda e o quase colapso do Estado.
O pequeno país mediterrâneo tem 18 seitas reconhecidas, incluindo muçulmanos sunitas e xiitas, várias denominações de cristãos, entre outros. Os conflitos entre eles e suas milícias definem a política do país e frequentemente se transformam em violência.
Testemunhas descreveram que os disparos iniciais partiram de prédios altos e pareciam ser de atiradores não identificados, seguidos de confrontos com rifles automáticos nas ruas próximas do centro de Beirute.
Enquanto os médicos lutavam para retirar mortos e feridos, os residentes se escondiam em suas casas, temendo que os eventos pudessem desencadear uma nova onda de violência em um país com uma longa história de conflitos civis. Uma forte fumaça subiu de fogueiras acesas nas ruas para bloquear o acesso.
Apoiadores do Hezbollah acusaram homens armados do partido Forças Libanesas, um movimento político cristão que se opõe radicalmente ao movimento islãmico, de atacar os manifestantes. Em um comunicado, o Hezbollah e o Movimento Amal, outro partido político xiita, acusou partidos não identificados de abrir fogo contra manifestantes pacíficos na tentativa de "arrastar o país para um conflito deliberado".
“Ainda está muito tenso ao nosso redor”, disse ao The New York Times Joseph Musalem, segurança de uma escola perto dos confrontos, por telefone. Quando os confrontos começaram, os funcionários da escola levaram as crianças às pressas para o porão para proteção e alguns pais puderam correr para buscá-las. Outros ainda esperavam no porão. “Esperamos que o tiroteio acalme para que possamos nos mover e voltar para casa”, disse Musalem.
Os militares libaneses destacaram-se para tentar acalmar as ruas, respondendo a relatos de atiradores se escondendo nos telhados e realizando disparos contra civis. No meio da tarde, os confrontos pareciam ter diminuído depois de cerca de quatro horas.
A tensão aumentou em Beirute por causa da investigação sobre a explosão no porto, que matou mais de 200 pessoas e causou grandes danos à capital. O Líbano também está passando por um colapso financeiro que, segundo o Banco Mundial, pode ser classificado entre os piores do mundo desde meados do século XIX.
A violência estourou em uma área que fica na divisa entre dois bairros com tensões de longa data - um reduto de grupos muçulmanos xiitas e outro de cristãos.
O primeiro-ministro Najib Mikati pediu calma enquanto o exército exortava os civis a deixar a área, alertando que os soldados atirariam em qualquer um que abrisse fogo.
Também houve relatos de pessoas correndo aos bancos desesperadamente para sacar seu dinheiro.
Desde o outono de 2019, a libra libanesa perdeu 90% de seu valor, e a inflação anual no ano passado foi de 84,9%. Em junho, os preços de muitos bens de consumo quase quadruplicaram nos dois anos anteriores, de acordo com estatísticas do governo.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.