Biden está calibrando um grande acordo no Oriente Médio; leia a coluna de Thomas Friedman

Um pacto entre EUA e Arábia Saudita pode melhorar o entendimento entre Riad e Israel e a Palestina?

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Por Thomas Friedman

Apesar das centenas de milhares de defensores da democracia israelense que tentaram bloquear o golpe desferido na segunda-feira pelo primeiro-ministro Binjamin Netanyahu no Judiciário de Israel, a destituição de competência da Suprema Corte para limitar o poder do Executivo certamente parece uma derrota dolorosa. Eu entendo essa dor, mas não me desespero completamente. O socorro poderá vir de conversas entre Estados Unidos e Arábia Saudita.

Sim, você leu corretamente.

Quando entrevistei o presidente Joe Biden no Salão Oval, na semana passada, minha coluna teve como foco suplicar para Netanyahu não enfiar goela abaixo de Israel a reforma no Judiciário sem alguma tentativa de alcançar um consenso nacional. Mas nós não falamos só disso.

O presidente dos EUA, Joe Biden, em Washington, DC, em 27 de julho de 2023. Foto: BRENDAN SMIALOWSKI / AFP

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O presidente estava em dúvida a respeito de perseguir ou não um pacto de segurança mútuo entre EUA e Arábia Saudita que envolveria a normalização das relações entre Riad e Israel contanto que os israelenses abrissem concessões aos palestinos que mantivessem aberta a possibilidade de uma solução de dois Estados.

Após discussões nas semanas recentes entre Biden, seu conselheiro de segurança nacional, Jake Sullivan; o secretário de Estado, Antony Blinken; e Brett McGurk, a mais alta autoridade da Casa Branca para política externa no Oriente Médio, o presidente despachou Sullivan e McGurk para a Arábia Saudita, onde eles chegaram na manhã da quinta-feira para explorar a possibilidade de algum tipo de entendimento entre americanos, sauditas, israelenses e palestinos.

O presidente ainda não decidiu como irá proceder, mas deu sinal verde para sua equipe sondar o príncipe-herdeiro saudita, Mohammed bin Salman, especulando se algum tipo de acordo é possível e a que preço. Estabelecer um pacto multinacional dessa estatura requererá tempo, será difícil e complexo mesmo que Biden decida levar a negociação para um novo patamar imediatamente. Mas as conversas preliminares evoluem neste momento — mais rápido do que pensei — e são importantes por duas razões.

Primeiro, um pacto de segurança que produza a normalização das relações entre a Arábia Saudita e o Estado judeu — ao mesmo tempo que esfria as relações sino-sauditas — seria um divisor de águas no Oriente Médio maior do que o tratado de paz assinado em Camp David por Egito e Israel, porque a paz entre Israel e Arábia Saudita, país que governa as duas cidades mais sagradas do Islã, Meca e Medina, abriria caminho para a paz entre Israel e todo o mundo muçulmano, incluindo gigantes como Indonésia e talvez até o Paquistão. Seria um legado significativo da política externa de Biden.

Segundo, se os EUA forjarem uma aliança de segurança com a Arábia Saudita — sob a condição de que Riad normalize as relações com Israel e os israelenses abram concessões significativas para os palestinos — a coalizão de governo de Netanyahu, constituída por supremacistas judeus e extremistas religiosos, teria de responder à seguinte pergunta: Vocês podem anexar a Cisjordânia ou alcançar a paz com a Arábia Saudita e todo o mundo muçulmano, mas não podem ter as duas coisas; então, qual vai ser?

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Isso não renderia debates interessantes nas reuniões do gabinete de Netanyahu neste momento?

Eu adoraria ver o ministro das Finanças de extrema direita de Israel, Bezalel Smotrich, discursar em rede nacional explicando ao povo israelense por que é de interesse de Israel anexar a Cisjordânia e seus 2,9 milhões de habitantes — para sempre — em vez de normalizar as relações com Arábia Saudita e todo o mundo muçulmano. A paz entre sauditas e israelenses poderia reduzir dramaticamente a antipatia entre judeus e muçulmanos originada mais de um século atrás no início do conflito judaico-palestino.

Mas antes de uma escolha entre anexação e normalização poder ser apresentada a este governo extremista, muita gente tem de concordar a respeito de muita coisa.

Dito isto, Jake Sullivan não viajou a Riad a turismo.

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Os sauditas querem três coisas principais de Washington: um tratado de segurança mútua do nível da Otan determinando que os EUA acudam em defesa da Arábia Saudita caso o reino seja atacado (mais provavelmente pelo Irã); um programa civil de energia nuclear monitorado pelos americanos; e a capacidade de comprar as armas americanas mais avançadas — como o sistema antimísseis balísticos Defesa Terminal de Área de Alta Altitude — que seriam particularmente úteis para os sauditas se defenderem do crescente arsenal iraniano de mísseis de médio e longo alcance.

Os EUA querem dos sauditas, entre outras coisas, o fim dos combates no Iêmen, onde o conflito felizmente diminuiu no ano recente, um imenso pacote de ajuda, sem precedentes, às instituições palestinas na Cisjordânia e limitações significativas na crescente relação entre Arábia Saudita e China.

Por exemplo, os EUA não ficaram nada satisfeitos quando emergiram relatos no ano passado de que a Arábia Saudita considerava aceitar yuan em algumas vendas de petróleo para a China em vez de dólar americano. Com o tempo, dado o peso econômico da China e da Arábia Saudita, isso surtiria um impacto muito negativo sobre o dólar americano enquanto moeda internacional mais importante. Esse movimento teria de ser cancelado.

O presidente dos EUA, Joe Biden (então vice-presidente), e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em 9 de março de 2016.  Foto: Debbie Hill / REUTERS

Os EUA também querem que os sauditas parem de fazer negócio com gigantes da tecnologia chinesas como Huawei, cujos equipamentos de telecomunicações lançados mais recentemente são banidos nos EUA.

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Seria a primeira vez que Washington assinaria um pacto de segurança mútua com um governo não democrático desde que o ex-presidente Dwight Eisenhower firmou o acordo com a Coreia do Sul pré-democrática, em 1953, e a manobra requer aprovação do Senado americano.

Tão importante quanto, porém, é o que os sauditas exigiriam de Israel para preservar a perspectiva da solução de dois Estados — da mesma maneira que os Emirados Árabes Unidos exigiram que Netanyahu abrisse mão de qualquer tipo de anexação da Cisjordânia em troca de seus Acordos de Abraão.

A liderança saudita não está particularmente interessada nos palestinos e não está a par das complexidades do processo de paz.

Mas se a equipe de Biden estabelecer um pacto sem um componente palestino significativo, isso desprenderia simultaneamente um golpe mortal contra o movimento democrático israelense — por dar de presente a Netanyahu um enorme prêmio geopolítico sem nenhum esforço da parte do primeiro-ministro e depois dele fazer algo tão antidemocrático — e contra a solução de dois Estados, o pilar da diplomacia americana no Oriente Médio.

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Eu não acredito que Biden fará isso. Um acordo nesses termos ocasionaria uma rebelião na base progressista de seu partido e tornaria sua ratificação praticamente impossível.

“Será muito difícil para o presidente Biden vender qualquer acordo assim para o Congresso americano”, disse-me o senador Chris Van Hollen, democrata de Maryland, que integra a Comissão de Relações Exteriores e a Subcomissão de Estado sobre Operações Estrangeiras, que financia o Departamento de Estado.

“Mas eu posso lhe assegurar que haverá uma forte oposição na base democrata a qualquer proposta que não inclua provisões significativas, claramente definidas e aplicáveis no sentido da preservação da possibilidade da solução de dois Estados e que atendam a demanda do próprio presidente Biden de que palestinos e israelenses desfrutem em igual medida de liberdade e dignidade. Esses elementos são essenciais para qualquer paz duradoura no Oriente Médio.”

Eu acredito que, minimamente, os sauditas e os americanos poderiam (e deveriam) exigir quatro coisas de Netanyahu em troca de um prêmio tão colossal quanto a normalização do comércio com um dos mais importantes Estados muçulmanos:

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  • Uma promessa oficial de nunca anexar a Cisjordânia — jamais;
  • Nenhum assentamento colonial a mais na Cisjordânia, nem expansões nos limites dos já existentes;
  • Nenhuma legalização de assentamentos judaicos clandestinos;
  • E transformar o status de parte do território povoado por palestinos na Área C da Cisjordânia (hoje completamente sob controle israelense) em Áreas A e B (sob controle da Autoridade Palestina) — conforme previsto no mapa do caminho estabelecido pelos Acordos de Oslo.
O presidente Biden chegando ao Aeroporto Internacional Rei Abdulaziz em Jedda, na Arábia Saudita, para uma visita que incluiu reuniões com o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, em 15 de julho de 2022. Foto: Doug Mills / NYT

Em troca, a Autoridade Palestina teria de endossar o acordo de paz entre Arábia Saudita e Israel.

Que a verdade seja dita: a Autoridade Palestina não tem condições de negociar de paz com Israel neste momento. Ramallah está uma bagunça. Os palestinos precisam refazer seu governo, mas enquanto não o fazem, os ministros de extrema direita no gabinete de Israel tentam absorver o quanto podem da Cisjordânia o mais rapidamente que conseguem.

A necessidade urgente é parar esse movimento imediatamente — mas não com outra dose de sermões do Departamento de Estado a respeito de quão “profundamente consternados” os EUA ficam com os assentamentos israelenses. Em vez disso, a melhor jogada é uma grande iniciativa estratégica que contenha elementos significativos para todos, exceto os fanáticos de todos os lados.

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Em repito: qualquer acordo requererá meses de negociações difíceis entre EUA, Arábia Saudita, Israel e a Autoridade Palestina — e seu sucesso, na melhor das hipóteses, é duvidoso.

Mas se Biden decidir tentar e Washington conseguir pôr na mesa um acordo que atenda imensamente ao interesse estratégico dos EUA, imensamente ao interesse estratégico de Israel e imensamente ao interesse estratégico da Arábia Saudita (admitindo o reino no exclusivíssimo clube de países sob o guarda-chuva americano de segurança) e ressuscitar as esperanças palestinas por uma solução de dois Estados, este acordo será muito, mas muito importante — enorme.

E bem, não seria a cereja do bolo se Netanyahu fosse forçado a abandonar os extremistas de seu gabinete e trabalhar por uma causa comum com a centro-esquerda e a centro-direita de Israel? / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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