Por 18 meses, a agenda ambiental do presidente Joe Biden esteve num limbo. A Casa Branca e os senadores democratas empreenderam turbulentas negociações com o senador Joe Manchin III (democrata da Virgínia Ocidental), em conversas que com frequência deram a parecer que não chegariam a lugar nenhum (e em certas ocasiões colapsaram). Enquanto isso, o governo se conteve em relação a vários temas cruciais – como mais extrações de petróleo em terras federais, o que violaria a promessa de Biden para o meio ambiente – enquanto esperava para ver se Manchin cederia.
Então, em junho, em uma decisão antecipada havia muito, a Suprema Corte cortou as asas do governo ao limitar a maneira como a Agência de Proteção Ambiental pode regular os níveis de emissão de gases-estufa.
Mas agora, Biden finalmente desfruta de um forte vento a favor, enquanto começa a moldar a política ambiental do restante de seu mandato. Depois de ser aprovado no Senado, o maior pacote legislativo ambiental da história dos Estados Unidos também foi aprovado pela Câmara dos Deputados – e agora ele segue para sanção presidencial.
A parte difícil, porém, ainda não acabou. Veja algumas das difíceis decisões diante do governo após Biden sancionar a lei.
Intensificar a regulação
Com o projeto de lei ambiental cruzando a linha de chegada, a atenção do governo se voltará para a formulação de uma série de regras para combater o aquecimento global previstas pela legislação.
Por exemplo, um dos elementos centrais da Lei de Redução da Inflação é uma taxa sobre a emissão de metano, um potente gás-estufa. Instalações de processamento de petróleo e gás natural passarão a pagar US$ 900 a cada tonelada processada.
Mas, para o imposto funcionar conforme foi projetado, a APA precisa acabar de redigir uma regulação pendente sobre o metano. Em novembro, a agência avançou com um rascunho das regras para monitorar e capturar melhor o poluente que aquece o planeta, mas ainda tem de finalizar sua formulação.
Outra regulação crucial que a equipe de Biden pretende completar: limites de poluição de veículos fabricados de 2027 em diante.
Esses padrões funcionariam conjuntamente com os bilhões de dólares em deduções tributárias destinadas a carros elétricos recém-fabricados previstas na nova lei, projetadas para encorajar fabricantes e motoristas a trocar os veículos beberrões de gasolina pelos modelos elétricos.
Quando se trata de regular a poluição emitida pelos carros, “eles têm muita autoridade nesse campo”, afirmou Jamal Raad, um dos cofundadores e diretor-executivo do grupo ambientalista Evergreen Action. A APA planeja finalizar a regra para emissões de veículos até 2024.
O tempo urge: Se Biden perder a reeleição, qualquer regramento finalizado nos últimos meses de seu governo corre o risco de ser derrubado no Capitólio por meio da chamada Lei de Revisão do Congresso. Se Biden ou algum outro democrata vencer, porém, as regras estarão a salvo.
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Decisões difíceis na prospecção de petróleo
Para conquistar o apoio de Manchin, a concessão feita na lei ambiental prevê a liberação de prospecções no Golfo do México e na costa do Alasca. E também vincula a construção de turbinas eólicas em plataformas marítimas na Costa Leste e a instalação de campos de painéis solares e fazendas eólicas em terras federais no Oeste aos atuais leilões para concessão de extração de petróleo e gás natural já em andamento.
A nova lei torna praticamente impossível para Biden cumprir sua promessa de campanha de pôr fim a novas extrações em terras e águas federais, especialmente se ele quiser construir infraestrutura de geração com fontes renováveis. “Chega de extrair petróleo em terras federais, e ponto final”, afirmou ele durante a campanha. “Ponto final, ponto final, ponto final.”
Agora, seu governo terá de descobrir uma maneira de equilibrar a meta de limitar as emissões produzidas pelas reservas federais de petróleo e gás natural com o objetivo de manter os preços da gasolina sob controle e atender às provisões da nova lei.
Existem alternativas para limitar novos empreendimentos em petróleo e gás natural caso o governo opte por isso.
O Departamento do Interior, por exemplo, poderia elevar os royalties de prospecções terrestres e estabelecer novas regras para emissões de metano, ambas medidas que encareceriam a produção. E o governo poderia conduzir a maioria de suas concessões eólicas mais cedo, para evitar ter de organizar tantos leilões de concessões para prospecção de petróleo e gás natural.
“Há manobras que o Departamento do Interior pode adotar seguindo a letra da lei”, afirmou Kevin Book, diretor-gerente da firma de consultoria ClearView Energy Partners, “que não são necessariamente contrárias à intenção inicial do presidente, segundo o espírito de pôr fim às novas concessões expresso durante sua campanha”.
A Casa Branca se recusou a comentar a respeito do futuro do programa de concessões de extração de combustíveis fósseis.
As mudanças climáticas ainda são uma emergência?
Retoricamente, Biden tem sido claro: As mudanças climáticas, afirmou ele repetidamente, são uma “ameaça à existência”. Mas a Casa Branca não chegou a declarar oficialmente as mudanças climáticas uma emergência nacional.
Invocar a Lei Nacional para Emergências e outras legislações existentes poderia permitir ao governo cumprir uma série de objetivos que compõem a lista de desejos de muitos legisladores democratas e muitos ambientalistas: cessar as exportações de petróleo, direcionar dólares da defesa para fontes renováveis de energia e tolher o investimento em projetos de prospecção de combustíveis fósseis no exterior.
Neste verão, a Casa Branca considerou a ideia de uma declaração de emergência como meio de avançar com sua agenda ambiental diante da ausência de colaboração do Congresso quando as negociações com Manchin empacaram. Esta opção ainda está na mesa para Biden, mas por agora o governo tem sido cauteloso a respeito do que fará.
“Neste momento, estamos satisfeitos em ver que o Congresso atendeu ao chamado”, afirmou a repórteres a secretária de imprensa da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, no mês passado, respondendo uma pergunta a respeito da possibilidade do governo declarar uma emergência climática.
Muitos ativistas ainda advogam pela declaração. “Biden pode e deve fazer mais”, afirmou Jean Su, diretora de iniciativas do Centro para Diversidade Biológica. “Quando o presidente sancionar essa lei, ele deve também declarar emergência climática e usar plenamente a força de seus poderes executivos para encarar de frente a mortífera indústria dos combustíveis.”
Essa manobra, porém, implicaria em riscos políticos num momento em que os republicanos buscam maneiras de atacar os democratas em relação aos preços da gasolina e outros temas durante a campanha para as eleições de meio de mandato, que ocorrem em novembro. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
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