MADISON — Lutando para salvar sua campanha e provar sua capacidade de permanecer no cargo, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden afirmou em uma entrevista veiculada nesta sexta-feira, 5, na ABC News, que seu desempenho no debate de semana passada foi um “episódio ruim” e insistiu que está apto para um segundo mandato. A entrevista foi a primeira televisionada desde que começaram os crescentes pedidos para que ele desistisse da corrida de 2024.
“Foi um episódio ruim. Nenhuma indicação de qualquer condição séria. Eu estava exausto”, disse Biden, ao jornalista George Stephanopoulos, da ABC, na aguardada entrevista pós-debate. “Não dei ouvidos aos meus instintos em termos de preparação e — e uma noite ruim.”
Stephanopoulos perguntou se Biden havia assistido à gravação dos 90 minutos de debate, e o presidente respondeu: “Acho que não.”
No debate, ele falou com uma voz baixa e rouca e muitas vezes paraceu confuso e lutou para completar frases, no que a Casa Branca justificou se tratar de um forte resfriado. O democrata então culpou, esta semana, as recentes viagens ao exterior por seu fraco desempenho, embora tenha retornado da Europa 12 dias antes do debate.
Leia também
Stephanopoulos questionou essa justificativa, observando que Biden passou seis dias em Camp David se preparando para o debate, e o presidente disse então que achava estar com covid-19.
“Como eu estava doente, estava me sentindo péssimo. Na verdade, o médico estava comigo, perguntei se eles fizeram um teste de covid porque eu estava tentando descobrir o que havia de errado”, disse Biden. “Estava apenas com um resfriado muito forte”, explicou o presidente, acrescentando que estava exausto.
A Casa Branca disse à imprensa nesta sexta-feira que Biden fez um “check-in verbal” com seu médico sobre o resfriado antes do debate, depois de dizer aos repórteres no início da semana que ele não fez nenhum exame médico. A Casa Branca também não mencionou teste de covid.
Biden tem enfrentado muitas críticas desde seu fraco desempenho no debate, perdendo o apoio de doadores e outros democratas em meio a apelos para se afastar da corrida de 2024. Questionado se estava sendo honesto consigo mesmo sobre sua capacidade de derrotar Donald Trump, o democrata afirmou: “Não acho que ninguém seja mais qualificado para ser presidente e vencer esta corrida do que eu.”
Quando confrontado sobre sua condição física e mental para governar, Biden repetiu a estratégia usada nos últimos dias por ele e por seus assessores, rejeitando afirmações que ele está velho demais para seguir no cargo e listando suas realizações políticas durante o primeiro mandato.
“Olha, eu tenho um teste cognitivo todo santo dia”, Biden disse a Stephanopoulos, referindo-se às tarefas que ele enfrenta como mandatário, depois que o apresentador perguntou se ele havia feito testes cognitivos. Ele insistiu que não estava mais frágil e que “ainda está em boa forma”, afirmando que passa por uma “avaliação contínua” feita por seus médicos pessoais e que eles “não hesitam em dizer” se algo estiver errado.
Ele também minimizou várias vezes os números recentes de pesquisas que indicam Trump à frente tanto na eleição geral quanto em Estados críticos.
“Se você puder ser convencido de que não pode derrotar Donald Trump, você desistirá?”, perguntou Stephanopoulos. “Depende se o Senhor Todo-Poderoso descer e me disser isso, eu posso fazer isso”, disse Biden.
Mais ataques a Trump
A entrevista foi ao ar no mesmo dia em que o democrata realizou um comício em Wisconsin. Quando questionado se ele interromperia sua campanha, ele disse aos repórteres que estava “descartando completamente essa possibilidade” e disse que está “positivo” de que poderia servir por mais quatro anos.
Biden, que mais uma vez contou com a ajuda de um teleprompter para seus comentários, atacou seu provável desafiante republicano no discurso, ao apontar que o Trump disse uma vez que “o exército de George Washington venceu a revolução ao tomar o controle dos aeroportos dos britânicos”. Em meio a risos, Biden continuou: “Fale sobre mim falando errado”.
O democrata tem intensificado ataques a Trump como parte deste esforço renovado de campanha. Na entrevista da ABC News, Biden disse que os gritos do republicano durante o debate o afetaram e, em outro momento, argumentou que o ex-presidente mentiu, segundo ele, por pelo menos 28 vezes.
“Deixei que isso me distraísse. Percebi que eu simplesmente não estava no controle”, disse Biden. Stephanopoulos respondeu que Biden teve problemas desde a primeira pergunta no debate e ele respondeu: “Bem, eu só tive uma noite ruim.”
No comício, Biden tentou inverter as questões que circulavam sobre sua idade, perguntando retoricamente à multidão se ele era “velho demais” para ter aprovado uma legislação sobre armas, criado empregos e ajudado a aliviar a dívida de empréstimos estudantis — ao mesmo tempo em que sugeria que faria mais em um segundo mandato presidencial.
Também houve alguns sinais de descontentamento no comício, com um apoiador no palco acenando uma placa que dizia “Passe a tocha, Joe” enquanto o presidente saía.
Cresce pressão interna
No entanto, os esforços de Biden para corrigir seu desempenho ainda não foram suficientes para acalmar as frustrações internas do partido. O senador Mark Warner, de Virgínia, entrou em contato com outros senadores ao longo desta semana para discutir se deveriam pedir a Biden para sair da disputa, de acordo com três pessoas próximas ao assunto que falaram ao Washington Post sob condição de anonimato.
Os movimentos de Warner chamam a atenção, visto que ele é presidente do Comitê de Inteligência do Senado e tem uma reputação como um legislador que apoia Biden. Uma das fontes disse que há democratas do Senado suficientes preocupados com a capacidade de Biden de concorrer à reeleição para tomar algum tipo de atitude, embora ainda não houvesse consenso sobre qual seria esse plano.
Em paralelo, pelo menos quatro democratas do Congresso pediram que Biden abandonasse a corrida, com o deputado Seth Moulton de Massachusetts se juntando ao deputado do Texas Lloyd Doggett e ao deputado do Arizona Raúl Grijalva. Mais tarde, Mike Quigley fez o apelo a Biden, segundo a Reuters. Embora não tenha ido tão longe, a governadora de Massachusetts, Maura Healey, disse em uma declaração cuidadosamente redigida nesta sexta-feira que Biden agora tem uma decisão a tomar sobre “o melhor caminho a seguir”
Depois que Stephanopoulos perguntou a Biden, na entrevista da ABC, se ele estava ciente dos pedidos para que ele se afastasse, Biden disse que tinha ouvido apenas “da imprensa”./Associated Press e The New York Times.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.
