Brasil pode contribuir com pacificação do Líbano, diz Temer

Ex-presidente, que é descendente de libaneses, chefia missão humanitária do Brasil ao país depois de explosões devastarem Beirute

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O ex-presidente Michel Temer tem como um de seus principais objetivos ajudar na pacificação política do Líbano após ter sido escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro como chefe da missão humanitária do Brasil ao país. O primeiro-ministro libanês renunciou nesta semana após fortes protestos em Beirute no fim de semana. 

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"Temos toda a razão para imaginar um Líbano pacificado. Se pudermos colaborar com isso, muito bem", afirmou o ex-presidente, para quem a medida também teria um efeito positivo na imagem do Brasil no exterior. "Vou ver se converso (com as autoridades locais) sobre a possibilidade de o Brasil ajudar diplomaticamente na intermediação de acordos. Está muito tumultuada a política lá", afirmou.

Segundo o ex-presidente, Brasil e França são os países que mais têm vínculos com o Líbano e podem ajudar no diálogo. Temer enalteceu o apoio que tem recebido da comunidade libanesa depois das explosões que deixaram 171 mortos, 6 mil feridos e 300 mil desabrigados na capital do país. Na quarta-feira, o governo brasileiro encaminhará seis toneladas de mantimentos para o país em um avião em que viajam Temer e a comitiva brasileira. Depois, o Brasil vai doar quatro mil toneladas de arroz por via marítima. 

Os seus pais são do Líbano e o sr.tem uma relação forte com o país. Como recebeu o convite de Bolsonaro para coordenar a missão brasileira?

Fiquei surpreendido, mas muito honrado. Tenho relações familiares com o Líbano. Meus pais nasceram e cresceram lá, casaram-se no Líbano, tiveram os três primeiros filhos lá e mais cinco depois. Eu sou o último. Portanto, tenho uma ligação umbilical com o país. Quando estive duas vezes lá, sempre fui muito bem recebido, como presidente da Câmara dos Deputados e como vice-presidente.

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No domingo, o presidente Bolsonaro fez o anúncio na reunião com os presidentes Donald Trump (EUA) e Emmanuel Macron (França). O pessoal que ouviu me conhece. Então, recebi entre surpreendido, honrado e emocionado em face das minhas origens. 

O sr. tem contatos com sua família libanesa?

Fui visitar a terra em que meus pais nasceram, uma cidade pequena nas montanhas. No dia em que cheguei, quando era vice-presidente, inauguraram uma avenida modesta na cidade com o meu nome. Tenho primos nessa cidade e em Trípoli (80 km de Beirute). Não falo com eles mensalmente, mas mantenho contato. 

O ex-presidente Michel Temer Foto: Daniel Teixeira/Estadão

O sr. tem alguma determinação específica, além da entrega de mantimentos? Os libaneses querem apoio econômico e investimentos. Até onde vai a margem para o sr. tratar disso?

Posso dizer que, além das 6 toneladas (de mantimentos) no avião e das 4 mil toneladas de arroz por via marítima, em todo o Brasil tem gente querendo contribuir. Além daquilo que está chegando, poderá ir um novo carregamento. O outro ponto é que, como tenho boas relações com as autoridades, vou ver se converso um pouco sobre a possibilidade de o Brasil ajudar diplomaticamente na intermediação de acordos. Está muito tumultuada a política lá. Brasil e França são os que mais têm vínculos com o Líbano e talvez pudessem ajudar no diálogo. 

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Nas últimas semanas, saíram notas na imprensa dizendo que o sr. e o presidente Jair Bolsonaro estão mais próximos. Como está a relação de vocês dois? 

O presidente Bolsonaro nunca criticou o meu governo, pelo contrário. Em várias oportunidades, eu o via dizendo: 'Se não fosse o Temer ter feito a reforma trabalhista, ter enfrentado a previdência...'. Então, ele sempre fez referências elogiosas ao meu governo. Segundo ponto: eu não tenho tanto contato com ele. Tive uns três contatos ao longo do tempo.

Ele deve ter ouvido entrevistas em que dou palpites. Digo: 'Olha, aquela coisa de falar na saída (do Alvorada) não é boa, porque é a palavra do presidente que faz a pauta do dia'. Creio que, às vezes, ele possa ter levado isso em conta. Mas é um contato cordial, tanto que ele me convidou. Aliás, é uma coisa muito típica nos EUA. Não é incomum que presidentes peçam para ex-presidentes realizarem missões humanitárias. 

Forças de segurança em confronto com manifestantes em Beirute Foto: AFP

Em entrevistas, o sr. também evitou fazer críticas contundentes a Bolsonaro e adotou um tom mais diplomático.

Tenho como método fazer observações com cautela. Ex-presidentes, ao meu modo de ver, devem ser discretos com relação ao presidente. Senão você não ajuda o País. Eu faço as observações, críticas, muitas vezes, mas a título de colaboração, e não de oposição. 

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O sr. acredita que Bolsonaro mudou um pouco sua posição com relação ao início do governo? Esse convite para o sr. é uma sinalização nesse sentido?

Pode ter sido. Não sei o que se passa no íntimo dele. Certamente, deve ter passado por ele a ideia de que fui um ex-presidente que teve boa relação com o Congresso, com o Judiciário e sou descendente de libaneses. Isso ele deve ter levado em conta.

Como o senhor avalia a política externa do governo, muito criticada por ex-diplomatas? 

O gesto do presidente Bolsonaro designando um ex-presidente e dando ajuda humanitária ao Líbano é uma mudança na política externa, convenhamos. Especialmente voltada para um país árabe. Segundo ponto: eu sempre sustentei a necessidade do multilateralismo. Precisamos nos dar bem com todos os países. Veja que nossos principais parceiros são China e EUA. China, o primeiro. EUA, o segundo. Eu fazia na ONU aqueles discursos de abertura (da Assembleia-Geral) e sempre enfatizava a ideia do multilateralismo, nunca do isolacionismo. Tenho a impressão de que o presidente Bolsonaro está começando a trilhar esse caminho. 

O sr. acredita que essa ação no Líbano e o fato de o Brasil tentar ter algum protagonismo ao lado da França melhora a imagem externa do País? 

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Acho que contribui muito. Mas é preciso que o governo libanês esteja de acordo com isso, para fazermos essa intermediação. É um mero oferecimento, nada mais do que isso. O Brasil tem de descendentes o dobro de habitantes do Líbano. Então, temos toda a razão para imaginar um Líbano pacificado. Se pudermos colaborar com isso, muito bem. Teria um efeito externo muito positivo. 

Como recebeu a decisão do juiz Bretas que o liberou para a viagem?

Eu tinha certeza que ele autorizaria imediatamente, como autorizou. Não houve dúvida em relação a isso. Nas vezes anteriores, fui convidado para falar em Oxford. Ele negou em um primeiro momento, mas o tribunal deu autorização. Depois, fui falar em Salamanca e em Madri. Ele também negou, mas o tribunal autorizou. Quando vou, falo bem do Brasil, divulgo o País. Nessa hipótese, como se tratava de uma situação humanitária e politicamente importante, ele deferiu imediatamente. Foi muito veloz.