BRASÍLA E SÃO PAULO - O Brasil se absteve de apoiar uma resolução do Conselho de Direitos Humanos (CDH) das Nações Unidas que investiga a violação de direitos contra mulheres, crianças e minorias étnicas no Irã. Aprovada por maioria dos votos nesta quinta-feira, 4, a resolução estende as atividades do relator especial da ONU no país e cobra que o governo iraniano colabore com a investigação.
Durante a sessão, o embaixador brasileiro na ONU, Tovar da Silva Nunes, justificou a abstenção do voto por considerar que o governo iraniano está cooperando com as investigações desde que tiveram início em novembro de 2022. “No entendimento de que o Irã fortalecerá os esforços para melhorar a situação de direitos humanos no país e baseado no espírito do diálogo construtivo, o Brasil vai se abster”, declarou.
“Encorajamos o Irã a seguir aumentando seu envolvimento com mecanismos de direitos humanos num espírito de cooperação e abertura”, acrescentou.
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A investigação da ONU no Irã começou após a morte da jovem iraniana Mahsa Amini depois de ter sido presa por supostamente usar o véu islâmico de forma incorreta e os consequentes protestos que se seguiram no país, reprimidos pela polícia. Na ocasião em que foi criada, em novembro de 2022, o Brasil também se absteve de votar.
No início do discurso desta quinta-feira, Tovar Nunes afirmou que o Brasil “continua profundamente preocupado” com as violações de direitos humanos no país, em especial contra mulheres, crianças e minorias religiosas. Ele pediu o fim da pena de morte, incluindo contra crianças, e garantias para a realização de protestos pacíficos no país.
“Há também a necessidade de revogar leis discriminatórias de gênero em vigor e promover os direitos das mulheres e meninas, incluindo a participação na vida política”, disse o embaixador.
A abstenção não está de acordo com a política de igualdade de gênero prometida por Lula durante a sua campanha eleitoral. Há um mês, a primeira-dama, Rosangela Janja da Silva, representou o Brasil no encontro da ONU sobre os direitos das mulheres, na qual ela afirmou que a igualdade de gênero era o seu compromisso de vida.
A resolução foi aprovada por 24 votos favoráveis, 8 contras e 15 abstenções. Além do Brasil, Bangladesh, Camarões, Costa do Marfim, Geórgia, Gana, Índia, Cazaquistão, Kuwait, Quirguistão, Malásia, Maldivas, Qatar, África do Sul e os Emirados Árabes Unidos se abstiveram.
Os votos contrários foram de Argélia, Burundi, China, Cuba, Eritreia, Indonésia, Sudão e Vietnã.
Quando foi criada, a Missão Internacional Independente de Apuração dos Fatos, como é chamada a investigação, foi aprovada por 25 votos a favor, 6 contra e 16 abstenções, incluindo a do Brasil.
A investigação foi determinada depois de uma série de protestos duramente reprimidos pelo governo, embora tivessem conotação pacífica.
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Os atos de grandes proporções foram motivados pela morte da jovem Mahsa Amini, de 22 anos, detida e agredida violentamente pela polícia moral do Irã por supostamente usar de forma inadequada um véu obrigatório cobrir a cabeça na lei islâmica vigente no país.
Muitas mulheres e meninas contestaram a lei deixando de vestir o véu negro ostensivamente, dando início a uma onda de protestos pelo país. Autoridades de Teerã chegaram a anunciar que a polícia da moralidade seria suspensa e revista, mas ela voltou a operar.
Havia denúncias de prisões arbitrárias, uso excessivo da força e mortes por parte da polícia, tortura, desaparecimento forçado, tratamento desumano, violência sexual e de gênero, especialmente contra mulheres e meninas. O conselho manifestou grave preocupação com os direitos de participação igualitária das mulheres iranianas em todas as esferas da vida na sociedade e se disse alarmado por relatos de prisões arbitrárias de crianças e buscas em escolas e internação em centros psicológicos.
O Irã executou com enforcamento um série de manifestantes que haviam sido presos e condenados à pena de morte, por participação nos protestos e sob alegação de que estariam envolvidos em atos de violência e na morte de agentes de segurança que atuavam na repressão.
O Estadão pediu esclarecimentos ao Itamaraty sobre o que motivou a abstenção do Brasil e questionou se o posicionamento não se choca com políticas do atual governo de promoção dos direitos femininos. Segundo o ministério, as justificativas foram expostas no discurso do embaixador Tovar Nunes.