Conforme as eleições presidenciais na Colômbia se aproximam, os candidatos ao cargo tentam descreditar o processo eleitoral, falando em tentativas de golpe e acusações de espionagem. O favorito nas pesquisas, Gustavo Petro (Pacto Histórico), fez diversas denúncias de um suposto golpe de estado que deveria ocorrer na última quarta-feira, 25. Por outro lado, Federico Gutierrez (Equipo por Colombia), disse ter sido espionado e que grupos paramilitares estariam pressionando eleitores a votarem em seu oponente.
Petro, que é o candidato da chapa de esquerda e está em primeiro lugar nas pesquisas de intenção de votos com mais de 40%. “Não querem que as eleições ocorram no dia 29 de maio porque sabem que vão perder. Eles estão tentando um golpe contra o voto popular, assim como já fizeram com o povo de Medellín”, citando o afastamento de Daniel Quintero da prefeitura desta cidade.
O atual presidente da Colômbia, Iván Duque, imediatamente respondeu às acusações de Petro, dizendo que não havia “absolutamente nenhuma base para toda essa quantidade de boatos que alguns dos candidatos espalharam na semana passada dizendo que a votação seria suspensa”.
A vice-presidente, Marta Lucía Ramírez, também rechaçou as denúncias. “Não houve e não haverá um golpe de Estado, por isso é a democracia mais estável da América Latina, por isso a estabilidade deste país é sem dúvida o bem mais importante que todos temos que proteger”, respondeu Ramírez.
O selo de “democracia mais estável” dado pela vice se dá porque a Colômbia é um dos únicos países da América Latina que não sofreu com ditaduras como seus demais vizinhos. Ainda assim, analistas questionam essa estabilidade, já que a democracia colombiana é marcada por intensos episódios de violência a candidatos e líderes sociais e políticos, inclusive sequestrados e mortos.
Embora tenha feito a acusação mais séria, Petro não foi o único a descreditar o pleito deste domingo. Seu adversário, “Fico” Gutierrez acusou grupos armados de estarem forçando a população a votar no candidato do pacto Histórico. “Ilegais armados obrigam as pessoas a votar em Gustavo Petro em algumas regiões”, disse o candidato a observadores da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Dias antes, Fico denunciou que a equipe de Petro estaria supostamente espionando seu gabinete. “Quero denunciar publicamente que foi encontrado um aparelho em uma de nossas sedes de campanha que aparentemente estaria transmitindo informações em tempo real sobre o que estava sendo discutido lá. Quero perguntar a Petro, por que eles estão nos espionando? O que eles estão tentando fazer?”, disse à imprensa no dia 17 de março.
As autoridades policiais confirmaram a existência de microfones e câmeras no gabinete, mas ainda investigam quem teria colocado. Gustavo Petro negou as acusações de Gutierrez.
‘Fraude’ nas legislativas
Os argumentos de fraudes e golpes ocorrem após as conturbadas eleições legislativas ocorridas em 13 de março no país. Na ocasião, a apuração final atribuiu quase 400.000 votos para a esquerda que não tinham sido incluídos na pré-contagem divulgada no dia da votação. A coalizão chefiada por Petro obteve três assentos adicionais no Parlamento, chegando a 45, tornando-se a principal força política junto com os liberais.
O episódio gerou críticas intensas, tanto entre os partidos prejudicados na contagem quanto pelo próprio partido de Petro. Os políticos passaram a pedir a troca do chefe do Registro Nacional do Estado Civil Alexander Vega Rocha, responsável por organizar as eleições, um ato que a Misión de Observación Electoral (MOE) caracterizou como “golpe de Estado”.
Edgar Andrés Londoño, cientista político pela Universidad Nacional de Colombia e doutor pela UERJ, explica que as diferenças de votos na pré-contagem e na contagem oficial costumavam ser muito pequenas, de 1% a 2%. Desta vez, porém, a diferença foi de 7%, o que causou espanto. “Isso fez com que muitos dissessem que havia um interesse do Pacto Histórico e da coalização que apoia Petro e que eram irregulares esses novos votos”, afirma.
Segundo a imprensa local, o problema teria sido no software de totalização dos votos. “Houve propostas para mudar o Registrador [Alexander Vega Rocha] , o que seria problemático nas vésperas das eleições. Mas a gestão dessas autoridades de Registraduria foram muito questionados tanto por candidatos de esquerda quanto de direita”, pontua Londoño.
“O discurso da fraude é usado tanto pela direita quanto pela esquerda”, concorda Laura Calle, antropóloga pela Universidade Nacional da Colombia e professora da Universidade Complutense de Madrid. “Se você olhar para as notícias e os tweets de alguns líderes políticos após as eleições para o Senado, ambos [os lados] disseram que houve fraude só que diziam que esta fraude estava afetando os resultados para eles.”
A fim de acalmar os ânimos, a MOE produziu um documento com sugestões de medidas para evitar tanto as desconfianças no processo eleitoral quanto as narrativas de golpe. No documento, a missão ressalta que “é preferível aumentar os controles ao longo do processo e fortalecer as auditorias do que abrir caminho para um golpe cívico-militar.”
A pesquisadora do Brics Policy Center e professora da PUC-Rio, Maria Elena Rodriguez, acredita que mesmo com esse discurso para desacreditar as eleições, os eleitores colombianos ainda acreditam em seu processo. “Existe um movimento político para desqualificar as eleições, mas ele não chegou a manchar. Se criaram muitos mecanismos participativos e sociais de verificação das eleições.”/Com informações de EFE e AFP