Enquanto o terror e a incerteza agoniam os equatorianos, o país sul-americano se prepara para o segundo turno das eleições presidenciais neste domingo, 15, com a esperança de mudar os rumos de uma nação desesperada por solucionar seu maior problema: a extrema violência.
Apenas cinco anos atrás, o Equador era considerado uma anomalia de paz e estabilidade no continente. Mas agora, gangues e cartéis controlam grande parte do país, causando ondas de violência sem precedentes que têm fraturado as instituições, intimidado a população e colocado em xeque o sistema político.
De acordo com um informe recente do Observatório Ciudadano de Violencia Política, uma organização dedicada à pesquisa e defesa de direitos cidadãos, o Equador viveu em 2023 o processo eleitoral mais violento da sua história, registrando ao menos 88 casos de violência política.
Segundo a organização, ataques foram dirigidos contra candidatos, autoridades eleitas, autoridades nomeadas e outros atores políticos. Assassinatos, atentados, ameaças e sequestros tornaram-se comuns no país, em um cenário que tomou repercussão internacional após a morte do candidato presidencial Fernando Villavicencio em 9 de agosto, assassinado a tiros por matadores de aluguel, ao sair de um comício político em Quito.
Desde a morte de Villavicencio, o crime organizado tem aumentado o tom da violência. Em setembro, quatro carros-bomba foram detonados no norte de Quito, na cidade de Cuenca e na província costeira de El Oro. Poucos dias depois, o vereador Bolívar Vera, do município de Durán, foi encontrado morto em um bosque da província de Guayas após ter sido sequestrado.
Em 6 de outubro, os sete indivíduos colombianos que haviam sido presos pelo envolvimento no assassinato de Villavicencio foram encontrados mortos na Penitenciaria del Litoral e na prisão El Inca, deixando em evidência um possível complô de queima de arquivo — José Antonio M. V, diretor da Penitenciaria, teve declarada a prisão preventiva após os acontecimentos.
Neste conturbado contexto, Luisa González e Daniel Noboa, candidatos à presidência do Equador, buscam renovar sua imagem para conquistar eleitores indecisos de um país paralisado. Com coletes à prova de balas, agentes de segurança à paisana, inteligência policial avançada e veículos blindados, os nomes do partido Revolución Ciudadana (RC) e da aliança Acción Democrática Nacional (ADN) saíram às ruas nos últimos dias para tentar conquistar o apoio de sindicatos, trabalhadores e estudantes universitários.
De acordo com analistas ouvidos pelo Estadão, o segundo turno pode ter um resultado bastante apertado e, por isso, a obtenção de qualquer porcentagem do que é considerado como voto até agora indefinido pode mudar o jogo para qualquer um dos candidatos.
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“O Equador está vivendo uma situação democrática completamente anômala”, disse ao Estadão David Chavez, cientista político e docente da Universidade Central do Equador. “Com o final da campanha, a diferença na intenção de votos entre os candidatos tem ficado muito estreita. E em um cenário tão fechado, a tendência é que haja uma disputa pelo voto indeciso, de quem está fora do núcleo ideológico ou partidário”, afirmou.
Para o cientista político, neste último trecho da campanha os candidatos têm buscado mudar o tom e até as estratégias para ganhar espaço, após uma espécie de “guerra de pesquisas de intenção de voto” — com dados mais ou menos favoráveis a ambos candidatos.
Segundo a pesquisa realizada na última semana pela Telcodata, Noboa tem 36,7% de apoio, e González, 36,4%; já o nível de eleitores indecisos neste segundo turno deve ser de 15,9%, de votos nulos, 8,7%, e de votos em branco, 2,3%. Na sondagem da Negocios y Estrategias, Noboa tem 39% da preferência contra 38,63% de González. E outras pesquisas mostram maiores diferenças entre as intenções de voto nos candidatos, também com Noboa na liderança.
Contudo, Chavez acredita que, apesar de Noboa estar em primeiro lugar nas pesquisas, a brecha está se fechando entre os dois candidatos. “Olhando para as últimas pesquisas, é possível concluir que Luisa está subindo bastante rápido na intenção de votos, enquanto Noboa parece ter chegado ao seu teto, do qual não consegue sair. Ficou estagnado. Isso pode ter sido causado pela reação ao último debate”, comentou David Chavez.
“No primeiro debate, Noboa convenceu a grande parte dos eleitores com uma imagem de político sério, com dados muito convincentes; mas na segunda oportunidade, ele não se deu bem. Com Luisa foi totalmente o contrário. No último debate sua estratégia foi falar para os indecisos sem confrontamentos, explicando estratégias concretas e falando com dados; isso funcionou”, afirmou ele.
Criticada pela suposta falta de planos concretos e originais para enfrentar a crise equatoriana, Luisa González mudou nas últimas semanas sua campanha. Antes, o foco estava na comunicação de uma espécie de sentimentalismo pela época em que Rafael Correa governou o Equador, ignorando todas as críticas à sua década na presidência.
Agora, a toda a força política dos tradicionais aliados do ex-presidente Correa está dedicada à apresentação de projetos específicos com um slogan diferente: “pelo bem de todos”. A candidata passou a falar da necessidade de reconciliação e de como sua experiência técnica a serviço de Rafael Correa pode ser útil nos 17 meses de governo que o vencedor terá para mudar os rumos do país.
“Ela tem realizado diversas mudanças no segundo turno, focando nela, pois as pessoas querem conhecer ela”, disse a cientista política equatoriana Ingrid Ríos em entrevista ao Estadão. “Sua imagem agora é muito mais próxima, menos séria. Se deu conta da importância dos jovens para a campanha e agora é até mais presente nas redes sociais. Ela passou a mostrar mais seu perfil como mulher, como a única candidata. E agora parece muito mais confortável com o uso de fontes, de dados, de informações em geral”, comentou.
Ao contrário de Luisa González, Daniel Noboa não tem um sistema partidário para promover sua candidatura. Ele é o primeiro filho do magnata Álvaro Noboa Pontón, o principal herdeiro do empório de bananas Corporación Noboa, que também tentou se tornar presidente da República cinco vezes. Por isso, para o segundo turno eleitoral, o candidato financia sua campanha majoritariamente com seus próprios fundos.
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Aos 35 anos, seu slogan “nós somos a nova geração” é sua grande aposta para atrair os eleitores jovens, mas para convencer os 5,1 milhões de eleitores que não votaram nem por ele, nem por Luisa González, o empresário passou a falar sobre segurança como Jan Topic, candidato que, apesar de ter ficado de fora no primeiro turno das eleições, chamou a atenção de milhões de equatorianos com um discurso de “mão dura” contra o crime e vídeos sensacionalistas e cinemáticos sobre a situação que enfrenta o país.
“Ambos estão tratando de capturar o voto dos indecisos e também de atacar as maiores fraquezas do outro. No caso de Daniel Noboa, a falta de experiência é palpável. E, no caso de Luisa González, a figura de Correa pode ser papel tanto positivo quanto negativo para todos os que ainda acreditam e seguem o Correa, que ainda são muitos, e talvez negativa para todos aqueles que acreditam que isso é algo que vai retornar ao modelo plenamente correísta”, disse Ingrid Ríos.
“Se sabe que obviamente (o governo de Luisa González) vai ser um governo muito parecido ao de Correa, mas que também (os eleitores) estão procurando que ela se apresente não apenas como candidata (correísta), mas que apresente seu tipo de liderança, e eu acredito que ela está fazendo isso”, concluiu a cientista política.
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