NOVA YORK - David Pecker, ex-editor do tabloide National Enquirer, relatou que Donald Trump teria pedido ajuda para eleição de 2016 e detalhou o plano secreto para ocultar histórias negativas sobre o republicano durante a campanha. O depoimento desta terça-feira, 23, é uma peça-chave para acusação no julgamento do caso Stormy Daniels, o primeiro da história americana a ter um ex-presidente no banco dos réus.
Trump é acusado de falsificar registros financeiros para camuflar o pagamento de US$ 130 mil a atriz pornô e evitar que um caso se tornasse público — o que Trump sempre negou. Os promotores argumentam que a compra de silêncio seria parte de uma estratégia mais ampla para influenciar na disputa pela Casa Branca, vencida por Donald Trump.
David Pecker teria um papel complementar no que os promotores de Manhattan descreveram como um “esquema criminoso”, comprando os direitos de publicação de outras histórias comprometedoras sobre Trump para impedir que viessem à tona. A tática é chamada de “catch and kill” ou “pegar e matar”.
Em depoimento, ele disse que tinha uma amizade de décadas com Donald Trump, relação que teria se aprofundado em 2015. Pecker relatou que se reuniu com o magnata na Trump Tower, em Manhattan, para discutir o plano de promover histórias positivas sobre ele e negativas sobre os seus rivais políticos. Michael Cohen, que na época era advogado e homem de confiança de Trump, também estava presidente, segundo o testemunho.
David Pecker teria atuado como “olhos e ouvidos” da campanha, notificando Cohen sobre possíveis escândalos, sobretudo, os que envolviam relacionamentos do candidato com mulheres.
Naquele mesmo ano, o então editor da National Enquirer disse ter fechado um acordo com Dino Sajudin, que era porteiro de um prédio administrado pela Trump Organization e dizia ter ouvido rumores envolvendo um filho fora do casamento. O tabloide verificou que a história era aparentemente falsa, mas Pecker decidiu comprar os direitos de publicação pelo potencial que teria para abalar a imagem do amigo.
“Tomei a decisão de comprar a história por causa do possível constrangimento que ela causaria à campanha e a Trump”, disse ele, acrescentando que era importante que ela fosse “retirada do mercado”. Pelo acordo, Dino Sajudin receberia US$ 30 mil independente de a história ser publicada ou não. O contrato incluía uma cláusula de confidencialidade com multa de US$ 1 milhão, caso ele passasse a denúncia para outro lugar.
A mesma tática também seria usada no caso da ex-modelo da revista Playboy, Karen McDougal, que disse ter tido um caso com Donald Trump. Ela recebeu US$ 150 mil dólares para não tornar a história pública.
Diante do tribunal de Manhatta, David Pecker admitiu ainda que teria publicado histórias para minar as aspirações de dois rivais de Trump no Partido Republicano: Marco Rubio e Ted Cruz. Além de usar a National Enquirer para atingir a imagem da candidata democrata Hillary Clinton, derrotada na eleição. “Mostrava Hillary como facilitadora de casos em que Bill Clinton parecia um mulherengo”, relatou.
O depoimento deve continuar na quinta-feira, 23, quando será retomado o julgamento.
Promotores pedem que Trump seja multado
Antes do testemunho de David Pecker, uma audiência de 90 minutos discutiu a acusação de desacato ao tribunal. A promotoria afirma que Donald Trump violou dez vezes a ordem de 1º de abril que o impede de atacar testemunhas e membros do júri com uma série de publicações na sua rede, a Truth Social.
O promotor Chris Conroy disse que os ataques são “deliberados e flagrantes”. Ele pediu ao juiz Juan Merchan que o republicano seja multado em US$ 1 mil dólares por violação e lembrado que “prisão é uma opção”, caso continue desrespeitando a ordem.
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Do outro lado, o advogado Todd Blanche disse que o seu cliente sofreu ataques políticos de possíveis testemunhas, incluindo Michael Cohen e Stormy Daniels, e apenas respondeu. “Ele está concorrendo à presidência. Tem que ser capaz de responder a isso”, defendeu Blanche.
O juiz ainda não decidiu sobre o pedido da promotoria, mas repreendeu o advogado: “você está perdendo toda a credibilidade junto ao tribunal”, disse ele.
O réu — que nega todas as acusações e diz ser vítima de uma “caça às Bruxas” — aproveitou o intervalo do tribunal para criticar o juiz, a quem acusou de tirar o seu direito à liberdade de expressão, em publicação no Truth Social. “TODO MUNDO TEM PERMISSÃO PARA FALAR E MENTIR SOBRE MIM, MAS EU NÃO TENHO PERMISSÃO PARA ME DEFENDER”, escreveu em letras garrafais.
Se condenado, o ex-presidente e pré-candidato pelo Partido Republicano pode pegar até quatro anos de prisão. Enquanto tenta voltar à Casa Branca, ele responde ainda pelos documentos secretos encontrados na mansão de Mar-a-Lago, Flórida, e pela tentativa de reverter a derrota para Joe Biden em 2020 /Com AFP, EFE, AP, NY Times e W. Post
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