PEQUIM - A China substituiu o Ministro das Relações Exteriores Qin Gang, que foi visto em público pela última vez há exatos 30 dias. O anúncio é combustível para as especulações sobre a política interna do Partido Comunista Chinês que ganharam força com o desaparecimento misterioso do agora ex-chanceler.
A troca no comando da pasta foi confirmada pela imprensa estatal chinesa, sem qualquer explicação sobre o motivo da substituição de Qin Gang pela antecessor Wang Yi depois de apenas sete meses.
O movimento foi aprovado em uma reunião atípica do Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo, o que gerou ainda mais especulação sobre o que estaria acontecendo no Partido. O conselho responsável pela nomeação dos altos funcionários costuma se reunir no fim do mês e foi convocado às pressas para um rápido encontro antes da remoção de Qin Gang do cargo ser confirmada.
No mês passado, o diplomata esteve no centro de um momento crítico para a difícil relação entre Pequim e Washington: a primeira viagem de um secretário de Estado americano à China em cinco anos. O então chanceler se reuniu com Antony Blinken e aceitou o convite de fazer uma visita recíproca aos Estados Unidos.
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Cerca de uma semana depois, no dia 25 de junho, Qin Gang encontrou diplomatas da Rússia, Vietnã e Sri Lanka. De lá para cá, não foi mais visto em público. Os compromissos previstos neste período de um mês foram cancelados ou Wang Yi foi em seu lugar.
O Ministério das Relações Exteriores chegou a atribuir a ausência do chefe a problemas de saúde. A menção, no entanto, foi apagada da transcrição da entrevista coletiva. Desde então, a pasta se limitou a dizer que não tinha informações.
“O longo silêncio tem sido extremamente prejudicial para a diplomacia da China”, avaliou Neil Thomas, especialista em política chinesa do Asia Society Policy Institute, em Washington.
“O vício do partido em segredo em suas operações internas está tendo um efeito debilitante na capacidade do país de trabalhar com o mundo exterior”, disse Thomas ao Washington Post.
A falta de informações abre espaço para diferentes teorias. Uma delas é de que o problema seriam transgressões do diplomata na vida pessoal e até a possibilidade de um caso com uma personalidade da televisão chinesa foi levantada. Nenhum dos rumores, no entanto, foi confirmado.
Carreira em ascensão
Apesar das inúmeras hipóteses, o fato é que a troca de comando no Ministério das Relações Exteriores interrompe a ascensão de Qin Gang, que ganhava cada vez mais protagonismo na diplomacia assertiva da China sob o comando de Xi Jinping.
O ex-ministro de 57 anos se graduou na Universidade de Relações Internacionais de Pequim, que é ligada ao serviço de segurança da China.
No início da década de 1990, entrou na pasta onde fez carreira e ganhou destaque como porta-voz do ministério. Depois, se aproximou de Xi Jinping enquanto atuava diplomata em Londres e organizou viagens do líder chinês.
Em 2021, foi nomeado embaixador em Washington, cargo que ocupou por cerca de um ano e meio até assumir o Ministério de Relações Exteriores passando na frente de diplomatas mais experientes.
No comando da pasta, liderou os esforços para retirar a China do isolamento diplomático que marcou o período da pandemia e tentou aliviar tensões com os Estados Unidos ao mesmo tempo em que se mostrava um expoente combativo das posições chinesas.
Qin era um dos principais proponentes da política externa cada vez mais agressiva de Pequim, incluindo o apoio político e econômico à Rússia durante a Guerra na Ucrânia.
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Apesar da substituição no Ministério de Relações Exteriores, Qin Gang não foi expulso do Partido Comunista e não há informações sobre o cargo de conselheiro que ele ocupava.
No lugar dele, volta à cena o ex-ministro Wang Yi que ocupou o cargo por quase dez anos. O velho conhecido na diplomacia chinesa também atua como conselheiro de política externa.
O movimento não parece sinalizar nenhuma mudança significativa na política externa rígida adotada nos últimos anos por Xi Jinping à frente da segunda maior economia do mundo - e grande rival dos EUA./AP, The New York Times e W. Post
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