Opinião | China vs. Taiwan: o perigo real e imediato de um confronto

Cordão de isolamento com bloqueios navais legítimos poderia afetar o abastecimento de Taiwan e deixar para os EUA o ônus de qualquer ação militar

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Foto do author Rubens Barbosa

Recente estudo divulgado pelo think tank Center for Strategic and International Studies (CSIS), de Washington, DC., examinou alternativas para a China impedir a independência de Taiwan e implementar a política de Uma Única China. Pequim publicamente afirmou que impedirá a independência de Taiwan e promoverá sua inclusão no território chinês por todos os meios, inclusive, se necessário, pela força. A não condenação da invasão da Ucrânia pela Rússia pode ser um sintoma da preocupação com a possibilidade de uma intervenção armada contra a ilha. A outra opção seria um bloqueio militar da ilha.

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O trabalho do CSIS explora uma terceira opção, não militar. Um cordão de isolamento que chamam de quarentena (embargo). A China poderia isolar a ilha sem dar um tiro.

Como se desenvolveria a ação chinesa? O cordão de isolamento na realidade é uma zona cinzenta, pois não se trata de um ato de guerra, como um bloqueio naval. Sua execução poderia ficar a cargo da Guarda Costeira Chinesa, formada por mais de 150 embarcações e de mais de 400 barcos de pequeno porte.

Uma guarda de honra participa de uma cerimônia de hasteamento da bandeira no Memorial Chiang Kai Shek em Taipé, Taiwan, em 12 de janeiro de 2024 Foto: Louise Delmotte/AP

A Guarda Costeira é uma agência de aplicação da legislação chinesa que controla o tráfego marítimo e aéreo. Como a China considera Taiwan parte de seu território, no mar territorial chinês poderia exercer sua atividade e inspecionar os navios que chegam a Taiwan para abastecer a ilha em uma operação de busca e apreensão.

A quarentena poderia ser parcial ou total, cortando acesso aos portos e impedindo a chegada de insumos (inclusive energia). Essa possibilidade permite uma operação de âmbito limitado, podendo focar apenas, por exemplo, o porto de maior movimento na ilha, Kaohsiung, responsável por 57% das importações e pela maior parte da importação de energia por mar.

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‘O embargo não obrigaria a China a fechar ou restringir o acesso ao Estreito de Taiwan, que separa a ilha do continente, preservando a liberdade de navegação em águas internacionais’

Além disso, o embargo não obrigaria a China a fechar ou restringir o acesso ao Estreito de Taiwan, que separa a ilha do continente, preservando a liberdade de navegação em águas internacionais, o que significaria que Washington e seus aliados perderiam um de seus argumentos para intervir sob a lei internacional.

Por outro lado, China e Taiwan têm uma economia muito interconectada. Em 2023, 35% das exportações taiwanesas foram para a China continental, a maioria representada por circuitos integrados, células solares e componentes eletrônicos. As importações da China continental representam 20% do total importado pela ilha. Entre 1991 e 2022, as empresas de Taiwan investiram cerca de US$ 203 bilhões na China.

Recentemente, operação semelhante foi feita em um recife, território marítimo contestado entre a China e as Filipinas no Mar do Sul da China. Embarcações da Guarda Costeira abordaram, abalroaram e dispararam canhões de água contra elas.

O recife fica no meio de zona econômica exclusiva das Filipinas e centro de uma indústria pesqueira. Houve protestos do governo de Manila, mas a operação foi bem sucedida. Talvez essa primeira operação seja um treinamento para operações futuras, inclusive, como sugere o CSIS, para bloquear o acesso à ilha de Taiwan.

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O Exército chinês fez no mês passado, quando da posse do novo governo, exercício em que foi simulado o cerco da Ilha em larga escala, com navios e caças no que o governo de Pequim chamou de “forte punição por atos separatistas das forças independentista do novo governo”, para testar a habilidade das Forças Armadas de conjuntamente tomar o poder, lançar ataques conjuntos e “ocupar áreas críticas”.

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Caso essa alternativa venha a ser empregada pelo governo chinês, deixaria para os EUA a opção de iniciar uma operação militar para impedir o embargo pelo cordão de isolamento. O ônus de iniciar uma ação militar ficaria com Washington porque certamente haveria uma reação bélica de Pequim, cujas Forças Armadas viriam em apoio à Guarda Costeira. A rigor não estaria sendo iniciada uma operação militar contra a ilha, mas uma ação de inspeção prevista pelas leis internacionais.

O trabalho do CSIS é mais uma especulação sobre as pretensões da China sobre Taiwan, reforçada por acontecimentos recentes. Pode vir a ser utilizada, mas implica em riscos para a China.

Por outro lado, fornecedores de energia e insumos industriais para a ilha poderão não querer arriscar a inspeção e apreensão de seus produtos pela Guarda Costeira chinesa e poderão evitar o transporte marítimo desses produtos. Um embargo desse tipo poderia demorar um ou dois meses para efetivamente afetar Taiwan e representaria um desgaste para Pequim.

A incógnita em uma operação desse tipo é a reação dos EUA e da aliança militar formada no Mar do Sul da China com o Japão, a Austrália, o Reino Unido e os EUA. A operação recente no recife no mar territorial das Filipinas pode indicar que se tratou de um treinamento para eventual utilização contra a Ilha.

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Como a questão China-Taiwan vai se desdobrar é difícil de prever. Os métodos “não letais”, isto é, sem ação bélica, são claramente uma tentativa da China de evitar uma confrontação direta com os EUA.

Opinião por Rubens Barbosa

Presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Irice), foi embaixador do Brasil em Londres (1994-99) e em Washington (1999-2004)

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