É óbvio, a partir de sua desastrosa reunião no Salão Oval, que Volodmir Zelenski não entende o presidente Donald Trump ou aquilo que o motiva quando se trata de acabar com a guerra na Ucrânia.
O presidente ucraniano não está sozinho. Os críticos estão convencidos de que Trump ama Vladimir Putin e se inclina para a Rússia, enquanto muitos da direita anti-Ucrânia acreditam que ele compartilha sua animosidade em relação a Kiev. Ambos estão errados e tendem a escolher as declarações dele que mais apoiem seus próprios preconceitos, enquanto ignoram as muitas coisas que ele disse que minam essas narrativas.
A verdade é mais complexa. Passei muitas horas conversando e entrevistando Trump a respeito da Ucrânia e examinando tudo que ele disse sobre o assunto desde a invasão em grande escala da Rússia, há três anos. Posso não concordar com todos os elementos da abordagem de Trump, como sua decisão de interromper a ajuda militar e o compartilhamento de inteligência com Kiev. Mas, a menos que os líderes da Ucrânia entendam as verdadeiras metas e objetivos de Trump, eles continuarão a se encontrar em desacordo com o homem que tem o destino de seu país nas mãos.

Aqui estão cinco coisas que muitos americanos, ucranianos e outros observadores não entendem sobre Trump quando se trata da Ucrânia:
1. O objetivo mais urgente de Trump é parar a luta. A primeira coisa que Trump fala quando surge o assunto da Ucrânia é que a) a guerra nunca teria começado se ele fosse presidente e b) ele quer que a matança acabe. “Sinto que tenho a obrigação de tentar fazer algo para parar as mortes”, disse ele durante sua reunião de 28 de fevereiro com Zelenski. “De ambos os lados, estamos perdendo muitos soldados. E queremos ver isso parar. E queremos ver o dinheiro ser destinado para diferentes tipos de uso, como a reconstrução.”
É por isso que ele quer um cessar-fogo imediato, enquanto as negociações para um acordo de paz de longo prazo prosseguem. O dano real que Zelenski fez durante sua reunião no Salão Oval não foi alienar Trump pessoalmente (embora ele certamente tenha feito isso), e sim convencer Trump de que ele não quer a paz. Zelenski rejeitou sumariamente um cessar-fogo imediato porque disse que Putin já havia quebrado outros acordos de cessar-fogo 25 vezes, dizendo a Trump: “É por isso que nunca aceitaremos apenas um cessar-fogo. Não funcionará sem garantias de segurança”. Ele questionou o valor da diplomacia, exigindo do vice-presidente JD Vance: “De que tipo de diplomacia, JD, você está falando?” E enquanto Zelenski detalhava as atrocidades de Putin, o que Trump percebeu foi um homem tão cego por seu desprezo por Putin que não queria que a guerra acabasse. “Você vê o ódio que ele tem por Putin. É muito difícil para mim fazer um acordo com esse tipo de ódio”, disse Trump enquanto a reunião se desenrolava.

Isso produziu o pior resultado possível: Trump decidiu, como ele disse na rede social Truth Social, que Zelenski “não está pronto para a paz”. Zelenski então reforçou essa impressão dizendo aos repórteres em Londres que o fim da guerra “ainda está muito, muito longe”, mas que ele esperava que a ajuda militar dos EUA continuasse porque “a Ucrânia tem uma parceria forte o suficiente com os Estados Unidos da América” para manter o fluxo de ajuda. Resposta errada.
Isso convenceu Trump — que quer acabar com a guerra em meses, não anos — de que a assistência militar dos EUA estava encorajando a intransigência de Zelenski. “Esse cara não quer que haja paz enquanto ele tiver o apoio dos EUA”, ele declarou em uma publicação nas redes sociais. Então, ele pausou a ajuda militar e o compartilhamento de inteligência para a Ucrânia como forma de pressionar Zelenski a aceitar um cessar-fogo.
Obstáculo
Zelenski deveria ter aceitado o cessar-fogo de Trump incondicionalmente, o que colocaria o ônus sobre Putin: se o líder russo o rejeitasse ou violasse, ele seria objeto da ira e coerção de Trump, não Zelenski. Quanto mais cedo Zelenski descobrir isso e convencer Trump de que quer acabar com a luta, mais provável será que a ajuda militar seja retomada, e ficará claro que Putin é o verdadeiro obstáculo à paz.
2. Trump quer ajudar a Ucrânia a conseguir o melhor acordo possível. Trump tem o compromisso de ajudar a Ucrânia a sobreviver como um país soberano e independente. É por isso que o primeiro acordo que ele negociou ao retornar à Casa Branca foi “uma parceria durável” com Kiev para desenvolver conjuntamente os minerais e terras raras da Ucrânia — o qual, uma vez assinado, significará que os EUA estarão, literalmente, investindo financeiramente na sobrevivência da Ucrânia.

Trump também quer ajudar a Ucrânia a recuperar o máximo possível de seu território na mesa de paz. Durante um debate presidencial da CNN, em junho, Trump foi questionado se as exigências de Putin de que a Rússia “mantivesse o território ucraniano que já reivindicou” eram aceitáveis para ele. “Não, elas não são aceitáveis”, ele respondeu. E durante uma reunião no Salão Oval com o primeiro-ministro britânico Keir Starmer no mês passado, ele revelou que planejava ajudar a Ucrânia a recuperar o território perdido. “Grande parte do litoral foi tomado, e falaremos sobre isso”, disse Trump, “e veremos se podemos recuperá-lo ou obter grande parte dele de volta para a Ucrânia”.
Trump também entende que a Ucrânia precisa de garantias de segurança. Ele considera o acordo de minerais uma dessas garantias. “Vamos trabalhar lá. Estaremos na terra. E... ninguém vai mexer com nosso pessoal quando estivermos lá”, explicou Trump. Mas ele sabe que mais será necessário — e é por isso que, durante sua reunião com Zelenski, ele disse publicamente que estava aberto à possibilidade de enviar tropas dos EUA como parte de uma força de manutenção da paz. “Sei que outros países farão isso, e eles estão bem ali ao lado. Não nos comprometemos, mas poderíamos vir a fazê-lo”, disse ele.
Trump está aberto a outras ideias para medidas de segurança de longo prazo. Mas ele acredita que a segurança é a última coisa a ser negociada, não a primeira. “A segurança é tão fácil. Isso é cerca de 2% do problema. Não estou preocupado com a segurança. Estou preocupado em fechar o acordo”, disse ele no mês passado. Não tenho certeza se ele está certo — e Zelenski certamente discorda — mas se Zelenski exigir medidas de segurança logo de cara, como condição para acabar com a luta, ele estará caindo de cabeça na estratégia de negociação de Trump. Isso é imprudente.

3. Trump está dizendo coisas boas a respeito de Putin como uma tática de negociação. Como Trump realmente se sente a respeito da invasão russa da Ucrânia? “O ataque russo à Ucrânia é terrível”, ele disse à Conservative Political Action Conference, em 2022. “É um ultraje e uma atrocidade que nunca deveria ter ocorrido.”
Negociações
Mas, agora que o presidente está liderando as negociações de paz, ele não vê utilidade em denunciar as atrocidades de Putin. “Você quer que eu diga coisas realmente terríveis sobre Putin e depois diga: ‘Oi, Vladimir, como estamos indo no acordo?’ As coisas não funcionam assim”, ele explicou durante a visita malfadada de Zelenski.
Trump acredita que precisa ser visto como um árbitro neutro para conseguir um acordo. “Bem, se eu não me alinhasse com os dois, nunca teríamos um acordo”, disse ele no Salão Oval. “Não estou alinhado com Putin. Não estou alinhado com ninguém. Estou alinhado com os Estados Unidos da América e pelo bem do mundo.” Em público, Trump é neutro. Mas, na verdade, ele está tentando ajudar Kiev a sobreviver.
E embora seus críticos sugiram que ele realmente está do lado de Putin, Trump não sente que precisa provar sua boa-fé com a Rússia. “Ninguém foi mais duro com a Rússia do que eu”, ele me disse em 2020, antes de expor a ladainha de ações que tomou contra a Rússia durante seu primeiro mandato, de sanções a ataques cibernéticos. Não há razão para pensar que ele não faria isso de novo se decidir que Putin é a parte intransigente.

Putin disse a Trump que quer paz, então Trump está aceitando seu “sim” — por enquanto. Mas, em algum momento em breve, o líder russo terá que provar isso com ações, não com palavras. Se Putin acabar enganando Trump, ele descobrirá o quão rápido Trump se voltará contra ele. De fato, depois que Putin intensificou os ataques com mísseis contra cidades ucranianas na semana passada, Trump teria ficado cada vez mais indignado e alertou que estava se preparando para impor “sanções bancárias, sanções e tarifas em larga escala à Rússia até que um cessar-fogo e um ACORDO FINAL DE PAZ SEJAM ALCANÇADOS”.
Putin pode não perceber, mas sua coleira é curta. A melhor estratégia para Zelenski é ser o mais cooperativo possível com Trump e colocar Putin em uma posição em que ele se veja puxando essa coleira, tentando evitar ir para onde Trump quer conduzi-lo.
4. Trump quer proteger os contribuintes americanos. Trump criticou o quanto os Estados Unidos gastaram em ajuda à Ucrânia, mas isso porque ele acredita que a guerra nunca deveria ter acontecido e nunca teria acontecido sob sua supervisão. Ele apoiou tacitamente o pacote de ajuda que o Congresso aprovou no ano passado, dando ao presidente da câmara Mike Johnson (republicano de Louisiana) luz verde para aprová-lo durante uma reunião em Mar-a-Lago. Trump queria que fosse na forma de empréstimos, não de ajuda. Hoje, um ano depois, muitos apoiadores da Ucrânia no Congresso agora concordam que a maneira de armar a Ucrânia daqui para frente é por meio de empréstimos de Financiamento Militar Estrangeiro com juros apoiados por minerais ucranianos como garantia.
Trump diz que os Estados Unidos gastaram US$ 350 bilhões ajudando a Ucrânia. Ele não explicou como chegou a esse valor, mas suspeito que ele esteja contando tudo o que os americanos gastaram desde a invasão em grande escala da Rússia — incluindo o reforço das defesas da Otan na Europa e o envio de tropas e armas adicionais para a Polônia e os estados bálticos — como um custo da guerra para os contribuintes dos EUA.
Em contraste, Zelenski subestimou imprudentemente as contribuições financeiras dos EUA, declarando que “no total, os EUA nos deram separadamente cerca de US$ 67 bilhões em armas, e recebemos US$ 31,5 bilhões em apoio orçamentário”. Esse é um erro grave; todos os membros do Congresso sabem que votaram por US$ 183 bilhões em ajuda à Ucrânia em cinco projetos de lei, muitos sob fogo da direita anti-Ucrânia por causa disso. Subestimar esse apoio prejudica os aliados da Ucrânia, e parece ingratidão.
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Sobrevivência
Trump acredita que pode ajudar a Ucrânia a sobreviver e se reconstruir enquanto ressarce os contribuintes americanos, e o acordo de minerais é a maneira de fazer isso. Zelenski seria sensato se parasse de subestimar o nível de apoio dos EUA e assinasse o acordo o mais rápido possível.
5. Trump não compartilha da hostilidade da direita anti-Ucrânia. Na verdade, ele se considera o melhor amigo que a Ucrânia tem. Ele gostava de Zelenski (pelo menos antes de sua reunião na Casa Branca) e acredita que foi o líder ucraniano que o salvou durante seu primeiro impeachment. “Ele era como um pedaço de aço”, disse Trump, ao lado de Zelenski na Trump Tower no verão passado. “Ele disse: ‘O presidente Trump não fez absolutamente nada de errado’. Ele disse isso alto e claro. E a farsa do impeachment morreu ali mesmo. ... E eu reconheci isso.”
Zelenski pegou toda essa boa vontade e a desperdiçou com uma reunião desastrosa. Passar dos elogios efusivos e da afeição genuína que Trump derramou sobre ele na Trump Tower para ser expulso sem cerimônia da Casa Branca foi um feito diplomático.

O fato é que Zelenski tinha a amizade de Trump, e a perdeu. Ele precisa reconquistá-la, porque — goste ou não — o destino de seu país depende disso. E a única maneira de fazer isso é convencer Trump de que, como Trump disse ao lado de Zelenski no verão passado: “Nós dois queremos ver essa [guerra] acabar”. Se Trump não acredita nisso, sua gratidão pelo apoio de Zelenski durante o impeachment não significará muito.
Talvez eu esteja errado a respeito de algumas ou todas essas coisas, conforme as negociações se desenrolam. Se estiver, serei o primeiro a admitir isso e chamar a atenção de Trump. Mas, pelo que vi nos três anos mais recentes, acredito que aqueles que afirmam que Trump está do lado de Putin contra a Ucrânia estão simplesmente incorretos. E aqueles que sussurram o contrário no ouvido de Zelenski não estão ajudando. Eles o estão preparando para o confronto e o fracasso. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL