Classe média venezuelana engrossa fluxo crescente de refugiados no Brasil

Profissionais graduados em universidades na Venezuela, militares e até mesmo funcionários públicos servem mesas, atendem em caixas de supermercado e fazem unhas para sobreviver em Boa Vista após fugir da crise econômica em seu país

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Por Pablo Pereira, Pacaraima e Roraima 

O fluxo de cidadãos venezuelanos que atravessam a fronteira de Roraima fugindo da crise política e econômica não está transferindo para o Brasil somente mão de obra sem qualificação, como os operários que fazem bicos em Boa Vista ou indígenas warao, etnia de cultura diferenciada e cultura nômade da Venezuela. 

Parte do contingente é de profissionais graduados em universidades venezuelanas ou em cursos técnicos, trabalhadores e profissionais liberais qualificados que podem ser encontrados trabalhando no comércio e serviços na capital de Roraima, primeira parada dos refugiados.

Gabriela Tenorio, engenheira de TI, trabalha como manicureem Boa Vista Foto: Gabriela Biló/Estadão

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“Está muito difícil a situação na Venezuela”, afirmou na quinta-feira o bioquímico Rhodell Pérez Albornoz, de 40 anos, que optou por deixar seu país há cinco meses e trabalha como garçom em Boa Vista. Com a mulher, Gheyser, de 33 anos, médica especializada em medicina do trabalho e ultrassonografia, Rhodell trabalha à noite em um bar da cidade, junto de pelo menos outros sete compatriotas que também tentam sobreviver com a documentação de refugiados.

“Mas está muito difícil também aqui”, disse ele na quinta-feira, na entrada do prédio da Polícia Federal de Roraima, onde foi renovar os documentos de refúgio. Com um filho de 14 anos para criar, o casal está vivendo somente com a renda de Gheyser. Ela é formada na Universidade Rómulo Gallegos, de San Juan de Los Morros, Estado de Guárico, e veio para o Brasil atraída pelo Programa Mais Médicos. “Esperava ter uma oportunidade”, disse a médica, que trabalhou em uma clínica privada na Venezuela até decidir abandonar o país para tentar a sorte no Brasil. 

Hoje, Gheyser é caixa de supermercado em Boa Vista e está arcando com o sustento da família porque o marido está com pelo menos dois meses de salários atrasados no bar onde serve bebidas e espetinhos de carnes. “Somente com aluguel e as taxas de moradia, vão R$ 700, explica Rhodell. Ao relembrar das dificuldades em seu país e também da situação que enfrenta em Boa Vista, Gheyser decidiu encerrar a entrevista. “Não quero mais falar sobre isso. Não resolve nada”, disse ao marido.

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Rhodell desculpou-se e explicou que a mulher está cansada e nervosa. “Gostaríamos de ir para outra cidade, onde houvesse mais oportunidades de trabalho, mas as passagens estão muito caras”, relata o rapaz. Ele explica que a situação na Venezuela está se agravando a cada dia.

Para a engenheira de Tecnologia da Informação Gabriela Tenório, de 26 anos, a vida em Boa Vista já foi melhor para os refugiados. Até a semana passada, ela trabalhava à noite como garçonete, mas também teve os salários atrasados. “Está difícil para o dono do restaurante também”, explicou Gabriela.

Na noite de quarta-feira, ela contou que deixou o bar e está trabalhando de manicure “fazendo unhas”. Formada pela Universidade de Santiago Mariño, de Maturin, ela conta que adora sua profissão, sonha em trabalhar com linguagem de programação e pensa em migrar ainda mais para o sul do Brasil. O namorado de Gabriela, também venezuelano, técnico em TI, já tem contatos para conseguir vaga em Florianópolis, para onde o casal planeja se mudar logo que conseguir os recursos para a viagem.

Na manhã de sexta-feira, Freyo Viana, presidente da Associação Venezuelanos no Brasil, que funciona na periferia de Boa Vista, contou que o cadastro dele já contava com pelo menos 542 venezuelanos de diversas profissões. “Temos médicos, engenheiros, contadores e advogados, além de pedreiros e pintores”, disse.

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