BOGOTÁ - O governo da Colômbia e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) anunciaram ontem que chegaram a um acordo de paz definitivo, que abre caminho para o fim de mais de 50 anos de guerra civil no país. O conflito já deixou mais de 220 mil mortos e milhões de deslocados internos. Agora, o acordo será submetido a votação popular em referendo, que será realizado em 2 de outubro, anunciou o presidente colombiano, Juan Manuel Santos.
“Hoje começa o fim do sofrimento, da dor e da tragédia da guerra”, disse Santos no palácio presidencial em rede de rádio e TV, após seu governo e as Farc anunciarem o acordo definitivo e histórico em Havana. Ele também afirmou que as Farc terão uma participação mínima assegurada no Congresso. “Para que a paz seja duradoura, devemos garantir que os guerrilheiros se reincorporem à vida civil e legal de nosso país”, disse Santos.
Ele acrescentou que as Farc terão até 2018 dois representantes “com voz, mas sem voto” no Congresso para discutir a aplicação dos acordos de paz e, a partir de então, poderão se candidatar com uma representação mínima assegurada por dois períodos.
O fim das negociações havia sido anunciado na noite de terça por fontes do governo colombiano que acompanham as negociações em Havana, onde, desde a semana passada equipes das Farc e de Bogotá estão reunidas para fechar questões que ficaram pendentes dos seis pontos da agenda de diálogos.
Os pontos mais importante que faltavam ser alinhados eram o momento em que a anistia seria concedida aos guerrilheiros que não cometeram crimes graves, as condições da participação política dos chefes da guerrilha e o modelo de reincorporação dos combatentes rebeldes à sociedade. O chefe negociador das Farc, Luciano Marín Arango, conhecido como “Iván Márquez”, afirmou que foi ganha “a mais bonita de todas as batalhas” com o acordo definitivo de paz. “Creio que ganhamos a mais bonita de todas as batalhas, a da paz da Colômbia”, declarou Márquez, número 2 das Farc.
Durante as horas que antecederam o anúncio do acordo final de paz, que vinha sendo negociado desde novembro de 2012, os dois lados da mesa de negociações se pronunciaram com otimismo. “Um país onde as crianças podem crescer sem medo e com esperança está muito próximo”, disse o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, no evento Imaginem Uma Colômbia de Paz, realizado em uma escola de Bogotá.
Pelo lado das Farc, desde as primeiras horas de ontem, o líder da guerrilha, Rodrigo Londoño-Echeverry, conhecido como Timochenko, comemorava o pacto. “Estamos às portas de importantes anúncios que nos aproximam do acordo final”, escreveu no Twitter.
Com todos os pontos da agenda de negociação definidos, os chefes guerrilheiros deverão voltar à Colômbia para informar as tropas sobre os detalhes do acordo, no que será a última conferência das Farc como guerrilha armada. As tropas devem ratificar as decisões para que o acordo seja então assinado – em cerimônia que deve ocorrer na Colômbia dentro de duas semanas, segundo fontes próximas às negociações.
Referendo. Após a publicação do acordo de paz, o governo pode convocar o referendo - marcado para 2 de outubro - que para que a população aceite ou não os termos acertados entre as duas partes. A maioria das pesquisas de opinião indica que os colombianos devem endossar o pacto. Segundo a lei colombiana estabeleceu, uma vez fechados, os textos serão enviados ao Congresso para a realização da consulta.
Apesar do que mostra a maioria das pesquisas, o acordo é malvisto por parcela importante da população, capitaneada pelo ex-presidente Álvaro Uribe, que defende uma vitória militar contra a guerrilha e se opõe a alguns pontos do acordo de desmobilização. O ex-presidente, de partido opositor ao de Santos, alega que assinar a paz com as Farc significa deixar os guerrilheiros impunes.
A maioria dos analistas acredita que o acordo deve contribuir para a economia do país, principalmente nos setores de investimentos e turismo, com um acréscimo no PIB que pode variar de 0,3% a 1% do PIB. Mas, para ser endossado pela população, é preciso que não haja dúvidas sobre o processo de desarmamento da guerrilha.
“Se você tem uma melhora na segurança, o investimento externo e o interno aumentam”, disse a analista Sabine Kurtenbach, do Instituto Giga. “Algumas regras previstas no tratado, como a questão de terras, podem ajudar a economia colombiana.”
A paz com as Farc não garante o fim da violência na Colômbia, uma vez que as conversas do governo com outro grupo guerrilheiro, o Exército de Libertação Nacional (ELN), estão paradas e há relatos de que gangues derivadas de grupos paramilitares de direita assumiram algumas rotas do narcotráfico.
O Ministério de Relações Exteriores do Brasil divulgou ontem à noite um comunicado manifestando “satisfação” com o acordo de paz e felicitando o povo e o governo da Colômbia. / AFP, EFE e REUTERS
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