Colômbia: pesquisadores afirmam que reação de governo Petro à crise da coca é lenta

Segundo estudo do Programa Mundial de Alimentos, da ONU, crise ‘tem tido um forte impacto na atividade econômica e na segurança alimentar’ de colombianos

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Foto do author Luciana Dyniewicz
Atualização:

ENVIADA ESPECIAL A BOGOTÁ - A crise no mercado de coca na Colômbia é considerada por especialistas como uma oportunidade para o governo induzir uma substituição de cultivo entre os pequenos agricultores – um projeto que o país já tentou desenvolver antes, mas fracassou, e que, agora, está em uma velocidade aquém do ideal.

Diante da queda do preço da pasta de coca, alguns agricultores já estão deixando de cultivar a planta voluntariamente. Os números de área cultivada mais recentes são de 2022 e ainda não indicam esse movimento. Mas pesquisadores apostam que os dados de 2023 deverão provar essa desmobilização de pequenos produtores. Eles lembram também que já houve um freio no ritmo de crescimento do total de hectares destinados à coca. Enquanto o aumento foi de 43% em 2021, em 2022 ficou em 13%.

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Por causa da dificuldade para vender a pasta de coca, Andrés Gómez (nome fictício), um produtor rural da região de Catatumbo, no norte do país, espontaneamente reduziu seu cultivo de coca e e substituiu por tomate, feijão e café. Gómez reclama, porém, que as margens dos alimentos são inferiores à da coca e que ele e seus vizinhos não têm apoio institucional para criar uma associação de produtores de café, que poderia facilitar a comercialização do grão. “O governo tem que usar a crise para incentivar que o agricultor substitua seu cultivo”, diz.

O produtor já participou de um projeto assim. Em 2017, ele erradicou 1,5 hectare de plantação de coca e, em três anos, recebeu uma ajuda do governo de13,8 milhões de pesos colombianos (R$ 16 mil). Depois, voltou a cultivar coca. Segundo ele, era preciso pagar propina para os responsáveis pela implementação do programa na sua região, o que o desestimulou a participar.

O auxílio que Gómez recebeu fazia parte do Programa Nacional Integral de Substituição de Cultivos de Uso Ilícito (Pnis), lançado em 2017 como parte do acordo de paz assinado entre as Farc e o então presidente, Juan Manuel Santos, e que previa que os agricultores que acabassem com suas produções de coca receberiam 12 milhões de pesos (R$ 15 mil, na cotação atual) por ano para comprar alimentos, além de uma assistência técnica para adotar outros cultivos.

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Produção de coca no departamento de Cauca Foto: JAIME SALDARRIAGA / REUTERS

O governo, porém, ia levantando recursos aos poucos, conforme o programa caminhava. Acabou faltando verba e o presidente seguinte, Iván Duque, não deu prioridade ao projeto. Das 99 mil famílias envolvidas no projeto, apenas mil o concluíram.

Para a pesquisadora Ana María Rueda, da Fundación Ideas para la Paz, um dos problemas do programa foi ele ser focado em pessoas, e não em comunidades – justamente o erro que o governo atual tenta evitar. “Acabou sendo um projeto de atenção ao beneficiado. Não houve uma transformação cultural e as pessoas voltaram a cultivar coca.”

Agora, um novo programa para que os produtores troquem a coca por outros cultivos está em marcha. A ideia é trabalhar com os agricultores de uma comunidade de forma conjunta, fornecendo assistência técnica para que eles deixem, por exemplo, de produzir a folha e a pasta de coca para cultivarem mandioca e fabricarem também a farinha de mandioca, explica Salomón Majbub Avendaño, assessor da Diretoria de Substituição Voluntária de Cultivos de Uso Ilícito do governo colombiano.

Trabalhadores conhecidos como 'raspachines', que fazem a colheita da folha, carregam coca em uma fazenda no departamento de Guaviare  Foto: JOHN VIZCAINO / REUTERS

Os recursos não serão dados por produtor, mas para as comunidades, e o processo de substituição se dará de forma gradual. “Eles vão acabando com a mata (de coca) conforme o novo investimento for feito”, diz Avendaño.

Rueda, no entanto, critica o fato de o governo ter levado um ano “pensando no que fazer”. Petro assumiu a Presidência em agosto de 2022, quando já existia a crise da coca em algumas regiões do país, e anunciou sua política de combate à droga em setembro deste ano. “O governo está preocupado com o assunto, mas não tem um projeto bem montado”, diz Rueda, que trabalhou em políticas antidrogas em diferentes governos da Colômbia nos últimos dez anos.

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Enquanto o novo programa não se concretiza, os pequenos agricultores que dependiam da coca sofrem. De acordo com um pesquisador que tem entrevistado produtores na região de Catatumbo, grande parte está sem renda e sendo obrigada a deixar as localidades em que vivem. “Não vejo muitos substituindo seus cultivos. Alguns estão indo trabalhar na mineração ilegal (dominada por grupos armados) e outros estão parados.” A preocupação é que, sem dinheiro, jovens que costumavam trabalhar como “raspachines” (colhendo as folhas) sejam recrutados por guerrilhas.

Proteção usada nas mãos de um 'raspachin', o trabalhador que colhe a folha da coca  Foto: JOHN VIZCAINO / REUTERS

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Para esse pesquisador, o momento é ideal para o governo estimular a produção de alimentos no lugar da coca, dado que o argumento para se cultivar a folha da droga sempre foi de que ela era mais rentável. “Mas o governo não está aproveitando a oportunidade.”

Pesquisa do Programa Mundial de Alimentos, da ONU, mostra que a crise da coca “tem tido um forte impacto na atividade econômica e na segurança alimentar dos municípios que tradicionalmente vivem desse cultivo”. O relatório do estudo afirma também que essa é uma “oportunidade para que as comunidades que encontraram na coca sua forma de subsistência possam encontrar alternativas produtivas que lhes permita uma renda estável”.

O pesquisador Lucas Marín LLanes, da Universidad de los Andes, é mais cético em relação a um programa de substituição de cultivo. Na visão dele, o governo precisa avançar com a reforma agrária para destravar a luta contra a droga.

Avendaño, da Diretoria de Substituição Voluntária de Cultivos de Uso Ilícito, reconhece que a transformação que vem sendo feita na política antidrogas é lenta, mas diz que “a aposta é que o governo deixará uma base sólida”.

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