Como a China pode ajudar a fortalecer a Rússia na guerra? Entenda

Parceria comercial entre Pequim e Moscou enfraquece sanções do Ocidente, que teme que colaboração entre Xi Jinping e Vladimir Putin passe para o fornecimento direto de armas

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Por Redação

A preocupação de autoridades ocidentais com o possível aprofundamento das relações entre China e Rússia, no contexto da guerra na Ucrânia, parece aumentar, a medida que cada vez mais declarações públicas partem do alto-escalão de governos aliados a Kiev.

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Um ano depois do início da guerra, em que Pequim foi o maior aliado econômico de Moscou, o temor é de que a cooperação possa escalar a um nível ainda mais elevado, com o fornecimento direto de armamento bélico.

Os temores foram vocalizados principalmente por autoridades em Washington, após uma visita do chanceler chinês, Wang Yi, a Moscou, na semana passada. Desde então, o vice-chefe do Tesouro, Wally Adeyemo, o secretário de Estado, Antony Blinken e o diretor da CIA, William J. Burns, comentaram sobre o possível reforço militar chinês à Rússia.

“Nos estamos preocupados com essa possibilidade desde o primeiro dia [de guerra]. Na China, não há distinção entre as empresas privadas e o Estado, e nós já vimos eles proverem apoio não letal para a Rússia usar na Ucrânia. Agora, nossa preocupação é que eles estejam considerando fornecer apoio letal, e já deixamos muito claro que isso causaria um grande problema para a nossa relação”, disse Blinken em uma entrevista recente a CBS News, sem detalhar o motivo da suspeita e que tipo de equipamento seria enviado.

O presidente russo, Vladimir Putin, recebeu o chanceler chinês, Wang Yi, na semana passada no Kremlin. Foto: Anton Novoderezhkin/ Sputnik/ Kremlin via AP - 22/02/2023

Um aparente adendo à mensagem do diplomata foi feito por Burns no domingo, 26, quando afirmou que Pequim avalia enviar ao menos 100 drones e diversas armas nas próximas semanas. “Acreditamos que a liderança chinesa está considerando o fornecimento de equipamento letal”, disse Burns ao mesmo programa em que Blinken esteve uma semana antes.

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A inteligência americana considera que um fornecimento direto de armas de Pequim para Moscou atrapalharia o isolamento imposto pelas sanções ocidentais, que praticamente excluiu a Rússia do mercado internacional de alta tecnologia bélica. É sabido que o Kremlin negociou a compra de drones kamikaze com o Irã, um dos poucos países a desafiarem as sanções, e que a produção interna de armamentos supre a maior parte das necessidades do Exército russo. No entanto, mesmo a forte indústria bélica do país precisa de peças e tecnologia sofisticada produzida no exterior, algo que a participação chinesa poderia suprir ― e que, segundo evidências, aparentemente já vem suprindo de maneira camuflada.

De acordo com um levantamento da C4ADS, uma organização sem fins lucrativos de Washington, apresentado pelo The Wall Street Journal, Pequim já vem furando o bloqueio à Rússia desde o ano passado. Empresas estatais chinesas já teria enviado à empresas sancionadas russas alguns equipamentos de uso dúbio ― que podem ser empregados para fins comerciais ou militares ― como equipamentos de navegação e peças de caças. Outros artigos de tecnologia, como semicondutores, microchips e mesmo celulares e notebooks estariam sendo enviados ao país por meio de triangulações com outras nações, como Emirados Árabes e Turquia.

Ponte econômica: um fim para as sanções?

Além de fortalecer militarmente as tropas russas com tecnologia mais moderna, uma colaboração irrestrita da China com a Rússia poderia ter um impacto relevante no campo econômico para Moscou, que tenta contornar as sanções ocidentais.

Embora a alta internacional do preço do gás natural e do barril de petróleo tenham dado algum grau de sustentação à economia russa, o que fez o Fundo Monetário Internacional mudar a previsão de crescimento para a economia do país de uma contração de 2,3% para um crescimento de 0,3% neste ano, um aumento no volume de vendas para a Pequim ― que já é seu maior comprador ― poderia ajudar Putin a desafogar a economia do país e bancar os custos da operação militar.

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Tanques de petróleo em Konstantinovo, Rússia. Foto: Maxim Shemetov/ Reuters - 08/06/2022

Mesmo em um cenário menos aberto, durante o primeiro ano de guerra, o comércio entre China e Rússia cresceu expressivamente, tanto em importações quanto em exportações. A partir de uma decisão de eventual apoio aberto, as chances de que o volume cresça ainda mais é alta.

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Os chineses também poderiam oferecer um caminho para uma substituição de importações de produtos ocidentais que sumiram das prateleiras ― apesar de dados recentes mostrarem que um aumento incomum do comércio internacional em países vizinhos e aliados da Rússia, como Armênia, Belarus, Casaquistão e Quirguistão, em produtos como máquinas de lavar, chips de computador e celulares, poderia sinalizar que as sanções ocidentais vem sendo quebradas, em uma espécie de “última tábua de salvação”.

Em entrevista recente ao Estadão, o historiador Leon Aron, diretor de Estudos Russos do American Enterprise Institute, afirmou que discorda da visão que as sanções não estejam funcionando, e defendeu que, mesmo no caso de uma participação maior da China, setores da indústria russa estão sendo massacrados pelo novo cenário.

“As sanções funcionam, mas funcionam mais devagar do que pensamos. Em janeiro, a receita da Rússia com gás e petróleo foi metade do que era em janeiro do ano passado. E as despesas orçamentárias aumentaram. A China pode fornecer substitutos para, por exemplo, microchips, mas existem vários setores que já estão sendo muito afetados. [As sanções] podem não estar afetando o dia a dia, como por exemplo, o fornecimento de eletricidade ou comida, mas está ficando muito apertado”, disse.

Escalada de tensões

Pouco antes do início da guerra, Xi Jinping e Vladimir Putin se reuniram a portas fechadas em Pequim, em 4 de fevereiro do ano passado, e anunciaram uma parceria estratégica e diplomática “sem limites”. Apesar do pronunciamento conjunto, crítico a intervenção da Otan em direção ao Ocidente, a parceria ficou muito mais marcada pelo discurso vacilante da China, tentando equilibrar seus interesses perante o Ocidente.

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No entanto, se a cooperação evoluísse para o campo militar nas próximas semanas, como a inteligência americana afirma, a guerra na Ucrânia provavelmente se expandiria, não necessariamente um aumento das zonas de conflito, mas da dimensão geopolítica.

Vladimir Putin e Xi Jinping anunciaram parceria 'sem limites' durante reunião em fevereiro do ano passado. Foto: Aleksey Druzhinin/Sputnik/ Kremlin via Reuters

Aos olhos da Otan, um avanço da China na chancela à invasão da Ucrânia pela Rússia seria lido como um interesse em outras questões no cenário global, como a situação envolvendo Taiwan, mencionada recentemente por Burns.

“Acho que precisamos levar muito a sério as ambições de Xi em relação ao controle final de Taiwan. Isso, no entanto, em nossa opinião, não significa que um conflito militar seja inevitável”, disse Burns. “Hoje, nosso julgamento é que o presidente Xi e sua liderança militar têm dúvidas sobre a capacidade deles de realizar essa invasão”./ RENATO VASCONCELOS, COM NYT, AP, AFP, WPOST

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