Como ameaça de Trump ao Brics em caso de ‘nova moeda’ pode afetar o Brasil e o mundo?

Presidente eleito sugeriu que os países do bloco teriam que dar ‘adeus’ ao mercado americano, caso seguissem com adiante com planos para contornar o dólar; analistas veem declaração como política

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Foto do author Jéssica Petrovna

O grupo dos Brics está sob ameaça de pesadas tarifas dos Estados Unidos, caso decida seguir adiante para criar uma nova moeda, contornando o dólar. A advertência veio do presidente eleito Donald Trump enquanto o Brasil se prepara para assumir a presidência do bloco, em 1º de janeiro.

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A moeda, que seria usada para trocas comerciais dentro do Brics, é uma ideia antiga, na busca por reduzir a dependência do dólar, mas que nunca avançou de fato. Sequer aparece nas declarações das últimas cúpulas, mais focadas no incentivo ao uso das moedas locais como alternativa à americana.

“Independentemente de Trump, não há projeto concreto para criação de uma moeda do Brics”, lembra Oliver Stuenkel analista político e professor de Relações Internacionais da FGV-SP. “Existem muitos obstáculos. Não é uma proposta que está em vias de ser implementada.”

Presidente eleito dos EUA, Donald Trump, ameaça Brics com tarifas.  Foto: Allison Robbert/Associated Press

Por isso, analistas ouvidos pelo Estadão veem a ameaça como retórica política de Donald Trump.

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“Havia sinais prévios de que Trump faria ameaças a países envolvidos em iniciativas que pudessem reduzir a centralidade do dólar no sistema financeiro internacional”, aponta Stuenkel. O que não está claro, afirma, é o que isso significa em termos concretos.

“É uma forma de Trump dar um sinal de alerta para o Brics. Agora, o Brics não está discutindo (a criação de uma nova moeda). O que tem sido discutido é a possibilidade de comércio em moeda local”, concorda o ex-embaixador do Brasil em Washington, Rubens Barbosa.

O efeito, pelo menos no primeiro momento, é de pressão sobre o Brics, o que poderia levar o Brasil a ser mais cauteloso na discussão sobre alternativas ao dólar enquanto presidente do bloco.

“O Brasil vai precisar passar uma imagem de moderação, até mesmo por causa das diferenças ideológicas entre os presidentes Lula e Trump”, observa Vinícius Rodrigues Vieira, professor de Relações Internacionais da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP) e da Fundação Getulio Vargas (FGV).

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A liderança brasileira terá como lema o fortalecimento da cooperação do Sul Global, mas os temas para a Cúpula ainda estão sendo definidos. Procurado pelo Estadão, o Itamaraty não comentou a ameaça de Trump.

Ameaça russa

A Rússia, por sua vez, advertiu que o presidente eleito dos Estados Unidos pode dar um tiro pelo culatra. “Cada vez mais países estão aderindo ao uso de moedas nacionais em suas atividades comerciais e econômicas externas”, respondeu o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, ao ser questionado sobre a ameaça ao Brics. “Se os EUA usarem a força, como dizem a força econômica, para obrigar os países a usar o dólar, isso fortalecerá ainda mais a tendência de mudança para as moedas nacionais.”

A moeda americana, contudo, mantém sua hegemonia apesar dos esforços por diversificação, intensificados com a guerra na Ucrânia. O dólar representa 58% das reservas globais, bem a frente do segunda colocado, o euro, que aparece com 20%, segundo monitor do Atlantic Council.

O relatório destaca que o Brics tem promovido o uso das moedas nacionais ao mesmo tempo em que a China expande o sistema alternativo de pagamentos para os seus barceiros comerciais, mas conclui que o papel do dólar como moeda dominante está garantido no curto e médio prazo.

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Exigimos compromisso desses países de que não criarão uma nova moeda Brics, nem apoiarão nenhuma outra moeda para substituir o poderoso dólar americano ou enfrentarão tarifas de 100% e devem esperar dizer adeus à venda para a maravilhosa economia dos EUA. Eles podem encontrar outro otário!

Donald Trump, presidente eleito dos EUA, em ameaça de tarifas ao Brics

Impactos da política tarifária na economia americana

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O verdadeiro impacto da política tarifária de Donald Trump recairia sobre os consumidores americanos. São os compradores — pessoas ou empresas — que pagam as taxas aplicadas aos produtos importados, não os países de origem.

Para entender o efeito que a política tarifária do republicano teria sobre a renda dos americanos, o The Institute on Taxation and Economic Policy (ITEP), think tank com sede em Washington, fez uma projeção com base na proposta de 60% para os produtos chineses e 20% para todas as outras importações, anunciada antes das mais recentes ameaças. E descobriu que o aumento de impostos seria equivalente a 5,7% da renda dos americanos mais pobres no ano em 2026. No caso dos mais ricos, esse número cai para 1,4%.

Na mesma linha, o banco ING alerta que as tarifas podem custar US$ 2,4 mil para cada americano por ano, se colocadas em prática. A análise considera as propostas mais gerais e alerta ainda para o efeito cascata que isso poderia ter para uma economia ancorada no consumo.

Políticas tarifárias tem caráter protecionista porque encarecem o produtos vindos de outros países, o que incentiva a escolha das marcas nacionais. Essas, por sua vez, podem ser impactadas pelo aumento dos custos dos insumos importados, mas passam a ter margens maiores para subir os preços.

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Ou seja, o benefício para a indústria nacional viria às custas dos americanos, o que reduz o consumo e, consequentemente, o desempenho da economia. É o que alerta a organização não partidária Taz Foundation, em análise sobre impactos das propostas do presidente eleito. No longo prazo, o aumento das tarifas atenuam as pressões competitivas e reduzem a produtividade do mercado doméstico protegido.

“Todos os estudos consistentemente descobrem que as tarifas propostas por Trump teriam um impacto negativo na economia dos Estados Unidos”, afirma a análise, que destaca ainda o risco de tarifas retaliatórias dos outros países. Nesse caso, o prejuízo sobraria para as exportações americanas.

Como notou a The Economist, o impacto econômico das tarifas trariam custo político para o republicano, eleito com promessas de reduzir o custo de vida e melhorar a vida de trabalhadores irritados com os preços de produtos básicos. Os custos econômicos e políticos à vista contribuem para a tese do uso de ameaças como ferramentas de negociação.

Mas isso não quer dizer que as tarifas sejam apenas retórica. “Trump acredita no protecionismo clássico, de imposição de tarifas. Mesmo quando parecia que não seria factível, ele bancou a aposta política, como no caso da guerra comercial com a China durante o primeiro mandato”, lembra Vieira.

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Ameaças de Donald Trumo

Além do Brics, o presidente eleito ameaçou taxar em 25% as importações de México e Canadá e mais 10% a China. As tarifas sobre os produtos importados desses países — primeiro, segundo e terceiro maior parceiro comercial dos EUA, respectivamente — foram anunciadas pelo presidente eleito como resposta à imigração e à entrada de drogas no país.

Uma autoridade da transição de governo disse à rede americana CNN, sem ser identificada, que as ameaças são sinais de alerta para forçar outros países a negociar com os EUA em questões como imigração e comércio: “Sabemos que funciona”.

Depois do anúncio, ele recebeu o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, na mansão de Mar-a-Lago e falou com a presidente do México, Claudia Sheinbaum, por telefone. As conversas foram descritas como “produtivas”, apesar das versões conflitantes sobre o que teria sido acordado com o lado mexicano.

“Se você observar a ameaça de tarifas contra o México e o Canadá, verá que imediatamente houve ação”, disse o republicano Ted Cruz, senador pelo Texas que se converteu de rival a aliado de Trump, à CBS News. Ele então foi perguntado se apenas levava a sério as ameaças de tarifas como instrumento diplomático e respondeu que era uma questão de “alavancagem”.

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“Trump disse que imporia essas tarifas, a menos que eles protegessem a fronteira. Foi explicitamente uma questão de alavancagem”, explicou, lembrando que a estratégia funcionou antes.

Na primeira passagem pela Casa Branca, o republicano usou a ameaça de tarifas para conseguir um acordo de controle de imigração com o México. Agora, a ameaça se estende ao Canadá no momento em que Trump pretende renegociar o acordo de livre comércio que o substituiu o Nafta e precisa ser renovado pelos três países até meados de 2026 para continuar em vigor.

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