Como os países lidam com as ações afirmativas nas admissões universitárias ao redor mundo

Ao redor do mundo, iniciativas de ações afirmativas são adaptadas às realidades locais

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Por Sarah Dadouch

A decisão da Suprema Corte americana na quinta-feira, 29, de restringir as considerações raciais nas admissões universitárias pode colocar os Estados Unidos em uma trajetória diferente da de outros países que adotam iniciativas de ações afirmativas.

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Dezenas de países têm sistemas de ações afirmativas para admissão no ensino superior — alguns anteriores e outros influenciados pelo modelo dos EUA — formando uma constelação de políticas que refletem tendências políticas divergentes e histórias de desigualdade. A prática tem aumentado nas últimas décadas, inclusive no hemisfério Ocidental.

Em todo o mundo, essas políticas se concentram em raça, etnia, gênero, origem geográfica, classe, casta e outras considerações, sendo que muitas delas são altamente adaptadas ao contexto local.

Estudantes caminham pelo Harvard Yard, em 27 de abril de 2022, no campus da Universidade de Harvard em Cambridge, Massachusetts.  Foto: Charles Krupa / AP

Com o futuro das ações afirmativas sendo atualmente debatido nos Estados Unidos, veja alguns exemplos de como elas têm tomado forma em outros lugares do mundo.

Brasil

Há duas décadas, as universidades brasileiras adotaram cotas raciais para admissões, buscando aumentar a participação de estudantes negros, pardos e indígenas, com base, em parte, em um modelo americano. Uma ação judicial contestando a prática chegou ao Supremo Tribunal Federal, que em 2012 confirmou a constitucionalidade das políticas de ação afirmativa que levam em conta a raça.

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Nos anos seguintes à decisão, o País presenciou a intensificação do debate público sobre o uso de critérios de admissão étnicos ou raciais. A identidade racial no Brasil, que em 1888 se tornou o último país das Américas a abolir a escravidão, é complicada por 500 anos de mistura inter-racial: A maioria dos brasileiros tem origens raciais diversas e muitos rejeitam uma identidade negra ou branca bem definida, vendo em vez disso sua raça como algo entre essas duas.

Um estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE) demonstrou que a raça continua sendo um fator importante para a desigualdade no Brasil. A pesquisa de 2021 mostrou que os ganhos dos brasileiros brancos eram, em média, mais de 75% superiores aos dos brasileiros negros. Da mesma forma, os trabalhadores brancos ganhavam quase 71% a mais do que os trabalhadores pardos.

Após a decisão judicial, o país aprovou leis que determinam que as vagas nas universidades sejam reservadas para negros, pardos e indígenas, egressos de escolas públicas e estudantes de baixa renda nas universidades federais — reservando até 50% das vagas.

O presidente anterior de extrema direita do Brasil, Jair Bolsonaro, criticou a lei, chamando-a de “totalmente errada” e “uma forma de dividir a sociedade”. Mas ela sobreviveu ao seu governo.

No início deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que apoia a política, assinou um decreto que reservou pelo menos 30% dos cargos nomeados do Brasil no governo federal para pessoas negras ou mestiças. Em abril, a ministra da igualdade racial do país, Anielle Franco, prometeu que a lei permaneceria em vigor.

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Outros países do continente, incluindo Colômbia e Equador, começaram a adotar ações afirmativas em admissões nas últimas décadas.

Índia

No sistema indiano de “reserva” de ação afirmativa em admissões, que é anterior às políticas desse tipo nos Estados Unidos, as vagas nas universidades são reservadas para membros de castas historicamente desfavorecidas.

A abordagem tem como alvo os mais desfavorecidos pelas hierarquias de castas seculares que há muito tempo governam quase todos os aspectos da vida religiosa e social hindu.

A constituição da Índia, adotada em 1950, buscou oferecer oportunidades iguais reservando espaços para grupos desfavorecidos em instituições educacionais e governamentais.

Os críticos do sistema argumentam que as reservas deveriam estar vinculadas a critérios econômicos. Os defensores do programa respondem que essa medida ignoraria o estigma e outras opressões baseadas em castas que ultrapassam as linhas econômicas.

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França

A França, assim como o Reino Unido, não permite a “discriminação positiva”. As políticas destinadas a promover a igualdade racial devem se concentrar em critérios inter-relacionados, como origem geográfica, histórico socioeconômico ou frequência em determinadas escolas de ensino médio.

As políticas da França incluem a introdução de treinamento vocacional em larga escala e serviços que apoiam e beneficiam os desempregados de longa duração, bem como os bairros desfavorecidos. Os fundos destinados a nivelar o campo educacional são alocados para escolas em setores geográficos designados.

A Sciences Po, uma das universidades de maior prestígio da França, adotou sua própria abordagem com o programa de Convenções de Educação Prioritária, ou CEP, que oferece aos alunos de escolas de ensino médio pré-designadas um procedimento alternativo de ingresso.

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