MILWAUKEE - Os chefes de campanha de Donald Trump planejaram uma abertura da Convenção Nacional Republicana que começa nesta segunda-feira, 15, com uma mensagem amena e otimista, focando em temas que ajudariam seu candidato a expandir seu apelo entre eleitores moderados e negros. Então veio um atentado que sacudiu a base da política americana.
Republicanos dizem que o ataque a tiros contra o ex-presidente durante um comício no sábado na Pensilvânia pouco afetará a agenda da convenção que durará quatro dias e coroará Trump como seu candidato. No entanto, a raiva e a ansiedade já estão percorrendo o partido, mesmo enquanto muitos dos principais republicanos pedem calma e a redução das tensões. O próprio Trump já disse ter rasgado seu discurso já pronto e irá recalibrar o novo para um tom mais unificador.
Trump chegou a Milwaukee, no Winsconsin, onde corre a convenção, já no domingo a noite, um dia depois do ataque, dizendo que se recusava a deixar que um “atirador e potencial assassino” mudasse os seus planos.
A foto do momento do atentado feita pela Associated Press, que o próprio Trump chamou de icônica, já virou um ponto focal de narrativa. Após os tiros, Trump se levantou com o grupo cerrado gritando “lutem”, com a bandeira americana tremulando ao fundo.
Em entrevistas, delegados e outros participantes descreveram repetidamente um senso de missão elevado sobre o encontro após o atentando. “O presidente precisa saber que a América está com ele. Não vamos recuar. Vamos lutar como ele nos disse ontem à noite”, disse Alexandra Schweitzer, presidente da Republican Women of Waukesha County.
Trump foi recebido no domingo com música alta e festa por republicanos que participarão da convenção. Eles disseram que não se tratava de uma convenção ou de uma campanha qualquer. Era sobre “o bem contra o mal”, como disse um participante. Um ataque ao seu porta-bandeira que eles acreditavam que sairia pela culatra e o tornaria politicamente mais forte.
“O povo americano está furioso pra caramba, e eles não vão mais aguentar isso, e isso só os deixa ainda mais furiosos”, disse Ken Abramowitz, 73, de Palm Beach, Flórida.
Nova mensagem
Até o momento não houve mudanças na programação da convenção, informaram autoridades do partido Republicano à Associated Press. Mas Trump já informou, durante sua primeira entrevista após o ataque, que está mudando a mensagem do seu discurso planejado para quinta-feira, 18, quando deve aceitar a candidatura pelo partido.
“Quero tentar unir nosso país, mas não sei se isso é possível”, ele disse ao The New York Post no domingo em uma entrevista em seu avião particular enquanto viajava para Milwaukee para a convenção. “As pessoas estão muito divididas.”
“Eu tinha preparado um discurso extremamente duro, muito bom, todo sobre a administração corrupta e horrível”, ele disse. “Mas eu joguei fora.”
Ele fez comentários semelhantes ao The Washington Examiner , que relatou que Trump estava usando uma atadura de gaze sobre a orelha. “Eu acho que seria muito ruim se eu me levantasse e começasse a falar loucamente sobre o quão horrível todo mundo é, e quão corrupto e desonesto, mesmo que seja verdade”, ele disse.
Programação mantida
Em uma entrevista no domingo, o presidente do Partido Republicano, Michael Whatley, disse que a programação da convenção não seria alterada. A agenda vai contar com mais de 100 palestrantes com um foco voltado para questões cotidianas e os planos de Trump para elevar o nível de vida dos americanos trabalhadores, disse.
“Temos que ser capazes de traçar uma visão para onde queremos levar este país”, disse ele.
Whatley disse que a mensagem central teria pouco a ver com as dificuldades políticas do presidente Joe Biden, as queixas de Trump sobre a eleição de 2020 ou as promessas do ex-presidente de aplicar retaliação contra inimigos políticos.
“Vamos ter a convenção que planejamos nos últimos 18 meses”, disse ele. “Sentimos uma combinação de alívio e gratidão por o presidente estar aqui e aceitar a nomeação.”
Ainda assim, pessoas próximas de Trump que conversaram com o The Washington Post disseram acreditar que a convenção se concentrarão mais na “coragem e na resiliência” de Trump de ter sobrevivido ao ataque.
Mudanças na plataforma republicana
Além de votar para formalmente dar a Trump a nomeação, delegados eleitos de todo o país irão atualizar a plataforma de políticas do Partido Republicano pela primeira vez desde 2016. A proposta de uma plataforma reduzida — apenas 16 páginas com detalhes limitados sobre questões-chave, incluindo o aborto — reflete o desejo da campanha de Trump de evitar fornecer aos democratas mais material sobre uma questão-chave de campanha.
A plataforma aprovada por um comitê na semana passada não inclui um apelo explícito por uma proibição nacional do aborto, dois anos depois de a Suprema Corte dos EUA ter revogado a jurisdição de Roe versus Wade e encerrado o direito federal garantido ao aborto.
Muitos defensores antiaborto se opuseram à reescrita da plataforma pela campanha de Trump. Mas após o atentado, pelo menos um grande conservador religioso disse que não pressionaria para reverter a decisão do comitê.
“Mais divisões não seriam saudáveis”, disse Tony Perkins, presidente do Conselho de Pesquisa da Família.
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Talvez o mais importante, Trump usará a convenção para revelar sua escolha para vice-presidente, que poderia ser anunciada já na segunda-feira. Alguns republicanos acreditam que a escolha ganhará mais importância do que teria de outra forma, dado as novas ameaças à vida de Trump.
Seus três principais concorrentes são o governador da Dakota do Norte, Doug Burgum, o senador de Ohio, JD Vance, e o senador da Flórida, Marco Rubio, todos esperados para discursar esta semana.
Apesar de uma temporada de primárias contenciosa, qualquer tensão restante parece ter sido deixada de lado. Ex-rivais de Trump, o governador da Flórida, Ron DeSantis, e Nikki Haley, ex-embaixadora nas Nações Unidas, esperam-se discursar na convenção em nome do ex-presidente.
O veterano pesquisador republicano Frank Luntz disse que o atentado garantiu que o GOP está unido e motivado por trás de Trump, uma dinâmica que ele disse que estará em exibição durante toda a semana em Wisconsin.
“Todo apoiador do Trump agora será um eleitor do Trump”, disse Luntz. “O eleitor médio do Trump está tão irritado com o que acabou de acontecer. Eles já estavam irritados antes disso, e agora estão furiosos.”
Preocupações com segurança
Depois do episódio, o governador democrata de Wisconsin, Tony Evers, pediu mudanças no protocolo de segurança da convenção, com expansão do período de proibição de armas. As autoridades policiais, porém, disseram não ver necessidade de reforço de segurança.
As autoridades disseram que desenvolveram um plano robusto ao longo dos 18 meses de preparação da convenção que não precisa ser atualizado após o ataque a Trump. “Não houve mudanças em nossos planos atuais de segurança operacional para este evento”, disse Audrey Gibson-Cicchino, coordenadora do Serviço Secreto para a convenção ao The Wasginton Post.
Michael E. Hensle, o agente especial do FBI responsável por Milwaukee, disse que os policiais avaliaram atividades online e não encontraram “nenhuma ameaça articulada” ao Comitê Nacional Republicano ou a indivíduos.
Os planos de segurança para grandes eventos são projetados para serem dinâmicos e adaptáveis frente a ameaças, e o plano para a convenção republicana foi “revisado e fortalecido após o atentado de sábado”, disse a diretora do Serviço Secreto Kimberly A. Cheatle em uma declaração. Mudanças na equipe de segurança de Trump também foram feitas desde sábado, acrescentou.
O centro de Milwaukee já está fortemente protegido para a convenção. Suas ruas estão alinhadas com cercas, barreiras de concreto, postos de controle de segurança e policiais com coletes à prova de balas.
No domingo, as autoridades policiais tentaram tranquilizar o público, dizendo que estão confiantes no plano que elaboraram e que o adaptariam se as circunstâncias mudassem.
Entre as agências externas que auxiliam na segurança da convenção estava a Polícia do Capitólio dos EUA, com uma dúzia de policiais andando pelas ruas uniformizados no domingo, incluindo alguns usando coletes K-9 e de esquadrão antibombas. A Polícia do Capitólio estabeleceu há meses uma “postura de segurança expandida” para proteger os membros do Congresso devido ao número de ameaças que receberam, disse um porta-voz da agência nesta segunda.
A convenção, que ocorre menos de quatro meses antes do Dia da Eleição, acontecerá na fortemente democrata Milwaukee, a maior cidade de um estado decisivo que Trump perdeu por menos de 1 ponto percentual quatro anos atrás.
Mesmo antes da tentativa de assassinato, grandes protestos eram esperados, embora o movimento fosse severamente restrito como parte das precauções de segurança aprimoradas estabelecidas pelo Serviço Secreto. Ainda assim, o risco de confronto violento existe.
Os oficiais de segurança anunciaram previamente que pessoas fora do perímetro do Serviço Secreto seriam autorizadas a portar armas abertamente ou de modo oculto conforme permitido pela lei estadual. As leis de Wisconsin proíbem apenas metralhadoras, espingardas de cano curto e silenciadores./AP, NYT e W.POST
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