Desde que anunciou suas intenções de voltar ao poder, o ex-presidente dos EUA Donald Trump mostrou que não precisa estar na presidência para influenciar a política americana. O episódio mais recente envolve a investigação federal sobre um possível suborno da ex-atriz pornô Stormy Daniels para ocultar um caso entre os dois em 2016, quando ele disputou a presidência. No fim de semana, Trump foi a público dizer que seria preso nesta terça-feira, 21. Ele ainda conclamou seus partidários a protestar e tomar a nação de volta.
Embora um indiciamento seja mais provável que uma prisão, a declaração do ex-presidente fez com que líderes republicanos corressem para defendê-lo e atacar o promotor Alvin L. Bragg, o democrata responsável pela investigação (nos Estados Unidos líderes do Ministério Público a nível distrital são eleitos por voto popular).
O presidente da Câmara, Kevin McCarthy, terceira maior autoridade do país, escreveu no Twitter que a investigação de Bragg era um “abuso de poder” e que ele orientaria os comitês do Congresso a investigar se algum dinheiro federal estava envolvido - uma ameaça velada em um momento importante antes de Bragg deixar seus planos claros.
Outros republicanos também criticaram as acusações, entre eles possíveis rivais de Trump nas primárias, como Vivek Ramaswamy e o ex-vice-presidente Mike Pence.
O senador JD Vance, de Ohio, que apoiou Trump na campanha de 2024, disse que uma acusação politicamente motivada torna o argumento a favor de Trump mais forte. E tanto ele quanto a deputada Elise Stefanik, uma firme apoiadora de Trump em Nova York, acusaram Bragg e seus colegas democratas de tentar transformar os Estados Unidos em um “país do terceiro mundo”.
Trump é considerado um dos políticos mais populares dos Estados Unidos, se não o mais popular. Desde que deixou o poder, mantém uma base de apoio considerável entre os americanos mais conservadores e mantém um razoável controle sobre a máquina do Partido Republicano, mesmo diante de vários problemas com a lei.
A invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, e a operação do FBI em Mar-a-Lago, na Flórida, no ano passado, não impactaram significativamente a popularidade do republicano, que segue com índices de aprovação em torno dos 40%.
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Trump pode se beneficiar politicamente do indiciamento se os republicanos se unirem em sua defesa. Mas isso é um efeito de curto prazo. Muitos republicanos que rejeitam sua indicação à presidência podem avaliar, com o passar do tempo, que o ex-presidente traz problemas demais consigo e é melhor optar por outro candidato.
Segundo analistas, Trump tem também problemas pela frente. Uma coisa é reunir sua base, mesmo correndo o risco de cimentar a oposição a seu nome na eleição geral, quando você é favorito na disputa pela Casa Branca. Mas esse cenário é muito diferente, do atual, com Trump com uma popularidade em torno de 35%.
Esse patamar de popularidade mostra que o ex-presidente não apenas corre o risco de não vencer as primárias, como também sugere que ele é uma aposta arriscada para os republicanos. Com isso, o indiciamento pode trazer mais desvantagens do que vantagens para Trump. Uma fatia crucial de republicanos pode decidir que está pronta para seguir em frente e se afastar de seu líder.
Uma acusação traria o espectro de um julgamento e até mesmo a possibilidade de condenação e prisão para dentro da pré-campanha eleitoral. Isso traz a possibilidade de que Trump possa se comportar de maneiras imprevisíveis com consequências políticas incertas e arriscadas, como reunir manifestantes e levar episódios de violência para a disputa. Este cenário pode fazer com que o governador Ron DeSantis, da Flórida, o principal rival de Trump no partido, o ataque de maneiras que não conseguiu fazer até agora.
Outro ponto frágil de Trump perante o comando republicano e aliados internacionais dos EUA é sua posição sobre a guerra na Ucrânia. Quando a Rússia invadiu a Ucrânia em 2022, Trump inicialmente descreveu isso como uma tentativa “inteligente” de obter controle sobre as terras de outro país. Ele não repetiu esse elogio, mas se manifestou contra o tratamento da Ucrânia como uma prioridade nacional.
Sua posição ressoa com grande parte da base de votação republicana. Mas Trump, como ex-presidente e líder nas pesquisas primárias republicanas, ajudou a definir o tom do partido. E isso preocupou autoridades internacionais, que previram que a vitória de Trump na indicação presidencial de 2024 poderia fraturar a coalizão bipartidária em Washington por trás da ajuda à Ucrânia.
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