O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, recebeu o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, para uma reunião bilateral em Brasília na segunda-feira, 29, sinalizando uma reaproximação do governo brasileiro com o presidente venezuelano.
Mas o tom do discurso de Lula repercutiu mal ao defender o regime chavista que está no poder há duas décadas, responsável pela perseguição de opositores, dissidentes e jornalistas, e por uma das piores crises econômicas da história do país.
Em sua conta no Twitter, Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais da FGV-SP e colunista do Estadão, escreveu: “A retórica incrivelmente bajuladora de Lula em relação ao venezuelano Nicolás Maduro – cuja repressão sistemática e abusos de direitos humanos estão bem documentados – é muito mais prejudicial à reputação internacional do governo brasileiro do que qualquer outra coisa que Lula tenha dito ou feito até agora”, afirmou em sua conta no Twitter.
Stuenkel também escreveu que “ao abraçar explicitamente a linha oficial do governo Maduro, Lula se posicionou como um dos principais aliados da Venezuela – e a maioria dos outros aliados da Venezuela são regimes autocráticos. Isso basicamente exclui o Brasil de qualquer papel potencial de mediação na Venezuela”.
Já o jornalista venezuelano e colunista do Estadão Moisés Naím, perguntou: “Lula acredita honestamente que o colapso da Venezuela e o sofrimento de milhões de pessoas se deve ao que ele chama de ‘narrativa construída?’. Quem conta uma história tendenciosa sobre as causas da nossa tragédia é ele e Lula sabe disso”, afirmou
Um acerto em meio aos erros
De acordo com analistas ouvidos pelo Estadão, o presidente brasileiro acerta ao se encontrar com Maduro, após uma estratégia de isolamento, mas errou ao defender a posição do presidente venezuelano.
Para o professor de relações internacionais da FGV-SP, Guilherme Casarões, o principal erro do presidente brasileiro foi tirar a responsabilidade de Maduro da atual situação da Venezuela, atribuindo todos os problemas as sanções impostas pelos Estados Unidos.
“É claro que ao receber um chefe de estado estrangeiro, o Lula não vai fazer críticas diretas a aquele governo, Mas o presidente poderia ter externado as preocupações brasileiras sobre a crise venezuelana, principalmente sobre como trabalhar junto com a Venezuela para lidar com a questão humanitária dos refugiados venezuelanos que estão espalhados pela América do Sul, ele escolheu reduzir o que está acontecendo na Venezuela a uma mera narrativa norte-americana”, apontou Casarões.
O professor da FGV-SP lembrou que o governo brasileiro também poderia ter feito uma defesa das eleições democráticas na Venezuela, que estão marcadas para o ano que vem.
Para o presidente do instituto de pesquisa venezuelano Datanálisis, Luis Vicente León, Lula quer reverter o erro cometido pelo governo Bolsonaro de tratar a crise venezuelana com o isolamento de Maduro, sem criar espaços de negociação.
“Além da avaliação que se pode fazer do nível de democracia na Venezuela, é óbvio que retirar embaixadores, romper relações e apoiar a criação de um mito de governo fictício sem controle territorial foi totalmente contraproducente e afastou os países da América Latina da possibilidade de influenciar a busca para soluções entre as partes em conflito”, avalia Leon. “A tentativa de Lula é obviamente o contrário. Ele está tentando reincorporar a Venezuela à região”, completa o presidente do Datanálisis.
Intermediário
De acordo com Guilherme Casarões, o legado diplomático que poderia ser deixado por Lula após o seu terceiro mandato seria uma intermediação entre o governo Maduro e a oposição na Venezuela.
“O Brasil poderia contribuir justamente para a pacificação da Venezuela. Lula está bem posicionado para pacificar o país, já que o presidente brasileiro tem um transito grande com Maduro e pode construir pontes com a oposição venezuelana para promover um dialogo mais amplo”, avalia o professor da FGV-SP.
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“Até porque isso impacta diretamente a capacidade brasileira de reconstruir os mecanismos de integração Regional que foram abandonados ao longo dos últimos anos, como o Mercosul que está em um estado de paralisia já há algum tempo ou a Unasul da qual o Brasil saiu e agora voltou então eu não vejo caminhos para para reconstrução da integração regional que não passem necessariamente por uma normalização da situação política econômica e social da Venezuela”, acrescenta Casarões.
O professor aponta que o Brasil não pode perder a sua posição de possível interlocutor na Venezuela, porque prejudicaria os interesses brasileiros mais amplos na política externa.
Repercussão no Twitter
Para Dawisson Belém Lopes, professor de política internacional e comparada da UFMG, a reunião de presidentes da América do Sul foi costurada por Lula para que o Brasil tente ganhar o espaço que foi perdido para a China.
“A questão não é receber ou não Maduro. Um líder regional como o Brasil tem de receber. A questão é qual a visão do Brasil, qual a orientação – qual a orientação discursiva do Brasil, que seja – para reafirmar a importância do respeito à democracia e os direitos humanos na região”, apontou o jornalista especializado em política internacional, João Paulo Charleaux no Twitter.
De acordo com o jornalista Yan Boechat, também especializado na cobertura de política internacional, o presidente Lula errou ao responsabilizar as sanções como culpadas dos problemas da Venezuela.
“Estive muitas vezes na Venezuela nessa última década. Ao contrário do que Lula disse hoje em Brasília, a tragédia venezuelana não é uma ‘narrativa’ americana. A tragédia venezuelana é, em grande parte, obra dos chavistas no poder há mais de 20 anos”, afirmou Boechat em seu Twitter.
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