BELO HORIZONTE - Os brasileiros deportados dos EUA com correntes e algemas durante o voo chegou a Belo Horizonte às 21h05 deste sábado, 25. No aeroporto, eles relataram aos jornalistas maus-tratos de agentes americanos durante o voo entre os EUA e Manaus (AM), onde a aeronave fez um pouso inesperado por problemas técnicos. Entre os relatos estão denúncias de agressão física, calor e más condições do avião. Procurada à noite, a Embaixada dos EUA não respondeu.
“Eles maltrataram a gente. Eles bateram na gente algemado e não tínhamos cometido crime. Deixaram a gente algemado a viagem inteira. Tinha mulher e crianças. Estava muito calor”, disse ao Estadão Vitor Gustavo da Silva, 21, ex-morador de Atlanta, no Estado da Geórgia. Ele afirmou que morou por 20 anos nos EUA.
“Algumas pessoas foram agredidos. Foram chutes. Um agente deu um mata-leão em um dos meninos até ele desmaiar”, disse Luis Fernando Caetano Costa, outro deportado.
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“Ficamos três horas parados no Panamá porque o avião estava com problema. Eles davam partida, mas o motor desligava. Perto de Manaus, todo mundo percebeu que o avião estava com problema. Todo mundo ficou muito nervoso”, relatou Denilson José de Oliveira, de 26 anos, que estava preso no Texas.
O governo brasileiro detectou que os deportados estavam algemados e acorrentados porque a aeronave que vinha dos EUA parou em Manaus (AM) na noite de sexta, 24. Além de determinar a remoção das algemas, decidiu enviar uma aeronave da FAB, um KC-30 do Segundo Esquadrão do Segundo Grupo de Transporte, para transportar as pessoas deportadas dos Estados Unidos no trajeto entre Manaus e Belo Horizonte. Também determinou que as algemas e correntes fossem removidas. Das 158 pessoas que chegaram a Manaus, 88 são brasileiras.
Oliveira contou que foi preciso uma ação dos deportados para que funcionários do Aeroporto Eduardo Gomes, em Manaus, percebessem que os brasileiros estavam acorrentados e algemados. “Com muito custo conseguimos chamar a atenção de alguém. Abrimos a porta da saída de emergência. E pedimos ajuda, pedimos a Polícia Federal. Um rapaz que estava na pista viu. A gente falava: ‘Somos brasileiros, estamos acorrentados’. A gente achou que, se saísse na asa, conseguiria pular no chão, mas era muito alto. Alguém que estava na pista nos avisou então que tinha chamado os bombeiros e a Polícia Federal”, narrou ele, que deve voltar para Rondônia em viagem de ônibus.
Deportada da Flórida com o marido e os dois filhos, Sandra Lima resumiu: “O voo foi um inferno porque claramente ele estava com problema. Estava muito calor e ficamos três horas presos no avião”. Ela disse que saiu do Brasil na pandemia, porque o trabalho estava muito difícil. “Acreditei que pudesse ter o green card. Eles falam que, se você paga os impostos, que se você tem uma empresa, isso é possível”, afirmou. “Eu não me considero um risco para os EUA para ter que sair de lá.”
No X, o Itamaraty afirmou que vai pedir explicações ao governo americano sobre as condições dos deportados.
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À espera de familiares
Raissa Domingos, comerciante de Belo Horizonte, estava esperando o irmão, que foi detido pelas autoridades americanas enquanto cruzava a pé a fronteira do México com os Estados Unidos no dia 18 de dezembro. “Estou muito apreensiva para recebê-lo de volta”, disse. O irmão dela chegou a telefonar de Manaus, numa ligação autorizada pela Polícia Federal, e avisou que estava “tudo bem”, porém estavam acorrentados e algemados.
Além de familiares, o vereador Pedro Rousseff (PT) também aguardava os deportados. “Uma viagem dos EUA ao Brasil com algemas não é correta. Vamos identificar quais deles terão suporte da família e quais estão completamente sozinhos para auxilia-los”, disse.
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Apesar de padrão entre deportados dos EUA, as algemas e correntes desagradaram ao governo brasileiro. “O Ministério da Justiça e Segurança Pública enfatiza que a dignidade da pessoa humana é um princípio basilar da Constituição Federal e um dos pilares do Estado Democrático de Direito, configurando valores inegociáveis”, afirma nota divulgada na manhã deste sábado.
“Por orientação do (ministro Ricardo) Lewandowski, a Polícia Federal recepcionou os brasileiros e determinou às autoridades e representantes do governo norte-americano a imediata retirada das algemas. O ministro destacou ao presidente o flagrante desrespeito aos direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros”, diz o comunicado do pelo Ministério da Justiça.
Chegada a Manaus
A Agência Cenarium, de Manaus, registrou o momento em que os algemados e acorrentados deixavam a aeronave na capital amazonense. Nele, é possível ver alguns tripulantes caminhando com dificuldade na pista de pouso do aeroporto devido aos pés com correntes.
A deportação em massa de imigrantes ilegais foi uma das principais promessas de campanha de Donald Trump. O novo presidente dos Estados Unidos tomou posse na segunda-feira, 20. Embora seja o primeiro desde que Donald Trump assumiu impondo políticas mais rígidas contra imigração, o voo desta semana é de deportados do governo de Joe Biden - as políticas mais rígidas contra imigrantes são parte de um processo que vinha correndo antes da posse do republicano.
Fontes do Itamaraty destacaram que o País tem recebido voos como esse desde 2017, quando firmou um entendimento com os Estados Unidos sobre as deportações. O objetivo era reduzir o tempo que os brasileiros ficam detidos nos EUA por problemas com a imigração.