KIEV - O presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, saudou nesta segunda-feira, 16, um grupo de soldados ucranianos que chegou à fronteira russa perto de Kharkiv, um momento carregado de simbolismo que mostra a dificuldade enfrentada pela Rússia para sustentar suas posições.
No domingo, um grupo de soldados postou um vídeo diante do marco da fronteira com a Rússia. “Chegamos, presidente”, disse o comandante. No dia seguinte, Zelenski respondeu. “Rapazes do 227.º Batalhão, muito obrigado”, saudou. “Desejo a todos saúde. Cuidem-se.”
O episódio mostra que, três meses após o lançamento da invasão, a Rússia cada vez mais reduz seus objetivos na guerra. Depois de não conseguir tomar Kiev e fracassar na tentativa de derrubar o governo ucraniano, as forças russas se reagruparam, no mês passado, para uma nova fase da ofensiva no leste do país.
Até agora, porém, os russos não garantiram nenhuma vitória estratégica significativa. Pior, as derrotas se acumulam e a pressão aumenta sobre Vladimir Putin. Na semana passada, a Rússia foi forçada a retirar suas forças dos subúrbios de Kharkiv, frustrando uma plataforma para avançar rumo ao sul e cercar as tropas ucranianas em Donbas.
No domingo, autoridades do Reino Unido revelaram que a Rússia parece ter perdido cerca de um terço das tropas que enviou para a Ucrânia. O esforço de guerra russo em Donbas, segundo os britânicos, “perdeu impulso e está atrasado”.
Um exemplo da campanha desastrosa veio na semana passada. O comando russo enviou 550 soldados da 74.ª Brigada de Fuzileiros Motorizados para cruzar o Rio Donets, em Bilohorivka, perto de Luhansk. No mesmo dia, imagens de satélite mostraram o estrago feito pela artilharia ucraniana: pontes flutuantes russas destruídas, tanques e equipamentos em pedaços às margens do rio.
A notícia das perdas em Bilohorivka se espalhou rapidamente, provocando críticas incomuns de alguns influenciadores russos na internet. “Estou há muito tempo em silêncio”, disse Yuri Podoliaka, blogueiro de guerra com 2,1 milhões de seguidores no Telegram. “Mas a gota d’água foram os eventos em Bilohorivka, onde, por estupidez do comando russo, pelo menos um grupo tático foi queimado, possivelmente dois.”
Outro influenciador, Vladlen Tatarski, postou que a ofensiva da Rússia estava empacada por causa dos “generais” e suas táticas. “Até que tenhamos o sobrenome do gênio militar que deixou um batalhão à beira do rio, e ele responda por isso, não teremos nenhuma reforma militar”, escreveu.
“Os russos não alcançaram os objetivos declarados de Putin de dominar Donetsk e Luhansk – e é improvável que o façam”, escreveram Katherine Lawlor e Mason Clark, do Instituto para Estudo da Guerra, de Washington.
Michael Schwirtz, correspondente do New York Times, relatou que, até duas semanas atrás, não havia caças no céu da Ucrânia desde abril. De lá para cá, ele observou vários aviões de combate e helicópteros ucranianos. A incapacidade da Rússia de controlar o ar estaria dificultando, segundo ele, sua capacidade de avançar.
Nas últimas semanas, ambos os lados têm lutado vilarejo a vilarejo, mas sem supremacia de ninguém. “As chances de um rápido sucesso desapareceram”, afirmou Chris Tuck, especialista do King’s College, de Londres. “A capacidade da Rússia para operações ofensivas diminuiu e não devemos ter qualquer grande avanço russo.”
Mariupol
Apesar da sequência de derrotas russas, o comando militar da Ucrânia declarou na segunda-feira o “fim da missão de combate” no complexo siderúrgico Azovstal, em Mariupol, o que agências internacionais apontaram para o que pode ser uma conquista para o Exército da Rússia.
Tropas escondidas no último reduto ucraniano no porto sitiado de Mariupol começaram a deixar o local. Defensores ucranianos têm resistido por semanas no complexo siderúrgico sob intenso ataque russo.
A vice-ministra da Defesa da Ucrânia, Anna Malyar, disse que 53 soldados feridos da siderúrgica foram levados para um hospital na cidade controlada pela Rússia de Novoazovsk, cerca de 32 quilômetros a leste.
Outras 211 pessoas foram levadas para a cidade de Olenivka, em uma área controlada por separatistas apoiados pela Rússia, disse Malyar. Todos os retirados do local estarão sujeitos a uma possível troca de prisioneiros com a Rússia, acrescentou ela.
Tropas ucranianas dizem que resistiram em Azovstal por 82 dias, ganhando tempo para o restante da Ucrânia combater as forças russas e garantir as armas ocidentais necessárias para resistir ao ataque da Rússia.
Mas a retirada provavelmente marcou o fim da batalha mais longa e sangrenta da guerra da Ucrânia e uma derrota significativa para Kiev./REUTERS, NYT e WP
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