THE NEW YORK TIMES - Exaustos em vez de exuberantes, os dois candidatos à sucessão do primeiro-ministro Boris Johnson cumpriram seus últimos compromissos públicos de campanha na quarta-feira trocando os golpes finais em uma disputa que com frequência pareceu dialogar pouco com a tempestade econômica que se forma sobre o Reino Unido.
Pior colocado na corrida, Rishi Sunak afirmou que suas propostas para a economia baixarão a galopante inflação britânica mais rapidamente que as de sua oponente, Liz Truss. Ele sugeriu que a promessa de Truss de cortar impostos sem cortes paralelos nos gastos colocará em risco a reputação do país em mercados globais de crédito.
Truss, atualmente secretária de Exterior, afirmou que, quando Sunak foi chanceler do Tesouro, ele errou em pressionar por aumentos de impostos. Ela descartou a possibilidade de mais uma elevação na receita fiscal sobre a renda das empresas depois de Sunak impor uma taxa sobre empresas de petróleo e gás natural do Mar do Norte, em maio, que totalizará 5 bilhões de libras (US$ 5,8 bilhões).
O vencedor da disputa será anunciado nesta segunda-feira, escolhido não pelo voto de milhões de eleitores britânicos, mas por cerca de 160 mil membros do Partido Conservador que pagam mensalidade para integrar a legenda. Já que os conservadores detêm maioria no Parlamento, seu novo líder se tonará premiê.
Nenhum dos candidatos anunciou algum pacote abrangente para auxiliar as famílias atingidas duramente pelos ascendentes preços dos alimentos e combustíveis. Sunak propôs cortar o imposto sobre valor acrescido nas contas de energia, enquanto Truss prometeu ajudas direcionadas para os consumidores.
Com a ênfase de cortes em impostos de Truss, a campanha pareceu crescentemente apartada da realidade da economia britânica em colapso. As contas domésticas de energia se elevaram em 80%; o Goldman Sachs alertou que a inflação poderá chegar a 22% no início do próximo ano; e o Banco da Inglaterra projeta uma longa recessão.
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A última aparição conjunta dos rivais, na Wembley Arena, em Londres, marcou o fim de uma disputa que pareceu arrastada e estranhamente estática iniciada em 20 de julho, quando os parlamentares conservadores estreitaram a corrida que envolvia 11 concorrentes para os 2 finalistas.
Truss manteve a liderança sobre Sunak nas pesquisas durante 12 comícios similares aos da quarta-feira. Apesar dos esforços de Sunak de virar a disputa, Truss se manteve firmemente na primeira colocação pregando a mensagem de impostos mais baixos e governo menor para uma receptiva e fiel audiência de tories.
Sunak tem se apresentado como o candidato das duras verdades, alertando membros do partido que o governo não poderá arcar com cortes de impostos antes de domar a inflação de dois dígitos que atinge o país.
Mesmo que seu conhecimento sobre os fatos e sua fala mansa tenham arrancado mais aplausos do que Truss na quarta-feira, Sunak é prejudicado pela crença entre os membros de seu partido de que ele traiu Johnson. O pedido de demissão do governo de Sunak, em julho, desencadeou a queda do primeiro-ministro, que, apesar de uma série de escândalos, permanece persistentemente popular entre as bases do partido.
Em vez de discutir obstáculos econômicos, Truss e Sunak travaram uma batalha surpreendentemente amarga um contra o outro. Depois de um de seus primeiros debates cara a cara, em julho, assessores de Truss acusaram Sunak de “mansplaining” e de interrompê-la enquanto ela falava. Sunak afirmou que as políticas de Truss “levarão milhões de pessoas à miséria”.
Mais recentemente, Sunak sinalizou que não integrará o gabinete de Truss se ela virar primeira-ministra. O rancor dividiu profundamente o Partido Conservador, e alguns membros ansiaram a volta de Johnson — que nunca descartou explicitamente um futuro retorno.
O novo líder viajará à Escócia na terça-feira para uma audiência com a rainha Elizabeth II no Castelo de Balmoral, onde a monarca passa o verão (Hemisfério Norte) e onde ela também se despedirá de Johnson.
A cerimônia de transferência de poder ocorre normalmente no Palácio de Buckingham, em Londres, mas foi realocada para o Balmoral para o conforto da rainha de 96 anos, cuja saúde é frágil. Autoridades palacianas afirmaram que preferiram não perturbar os assuntos de governo caso a rainha planejasse um retorno a Londres para a ocasião e subitamente tivesse de cancelar o evento.
O vencedor herdará uma das mais desafiadoras listas de problemas diante de um premiê britânico em gerações. Além da situação econômica, o Reino Unido será pressionado para manter o apoio à Ucrânia e as sanções contra a Rússia. E os britânicos também poderão entrar em um período de turbulência em suas relações com a União Europeia.
O governo de Johnson enfureceu Bruxelas ao introduzir um projeto de lei que pretende reverter os arranjos comerciais que governam a Irlanda do Norte. Ambos os candidatos prometeram fazer a legislação avançar no Parlamento, apesar de alertas de que ela poderia desencadear uma guerra comercial com a União Europeia.
Truss defendeu suas credenciais enquanto ministra do Exterior declarando que o Reino Unido deveria fornecer armamentos mais pesados para o Exército ucraniano e impor mais sanções sobre o presidente da Rússia, Vladimir Putin. Mas evitou comentários incendiários a respeito de líderes estrangeiros.
Depois de afirmar que “o júri ainda está decidindo” se o presidente francês, Emmanuel Macron, é amigo ou algoz, Truss desviou da mesma pergunta a respeito do ex-presidente Donald Trump. “Não vou comentar sobre possíveis postulantes presidenciais”, afirmou ela. “Temos de trabalhar com qualquer ocupante da Casa Branca.” / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO
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