THE NEW YORK TIMES - Em 5 de dezembro de 1975, uma tia e um tio de Lindy Sue Biechler foram ao apartamento dela em Manor Township, no Estado americano da Pensilvânia, com o intuito de trocar receitas com a sobrinha de 19 anos, que havia chegado em casa havia duas horas, depois de passar no supermercado. Na porta da frente, eles viram sangue.
Dentro, se assustaram com manchas de sangue próximo da entrada do imóvel e no carpete, afirmaram as autoridades. Entre a sala de estar e a sala de jantar, Biechler estava no chão, de barriga para cima, e sangrando por múltiplos ferimentos em seu corpo — uma faca de cozinha estava cravada no lado esquerdo do pescoço dela. Alguém havia esfaqueado Biechler, uma vendedora de uma floricultura recém-casada. Ela foi morta com 19 facadas, afirmaram as autoridades naquele dia.
A identidade do assassino ficou desconhecida por 46 anos. Mas, na segunda-feira, a Promotoria do Condado de Lancaster e o Departamento de Polícia de Manor Township afirmaram que haviam prendido, no dia anterior, David Sinopoli, de 68 anos. Ele foi preso no Condado de Lancaster, no Estado da Pensilvânia, onde foi acusado pelo assassinato — encerrando assim um caso que assombrou sua comunidade por mais de quatro décadas e frustrou policiais locais que investigaram dúzias de pistas ao logo dos anos sem nenhum sucesso.
“Foi uma busca incessante de Justiça para Lindy Sue Biechler”, afirmou a promotora distrital do Condado de Lancaster, Heather Adams, em uma entrevista coletiva. Não ficou claro imediatamente se Sinopoli constituiu advogado. Telefonemas realizados para um número listado sob o nome dele não foram atendidos.
Em fevereiro, as autoridades seguiram Sinopoli — que vivia no mesmo edifício de quatro apartamentos de Biechler e fora recentemente identificado como suspeito — até o Aeroporto Internacional da Filadélfia. No local, conseguiram seu DNA em um copo de café que ele havia usado e descartado numa lata de lixo antes de embarcar em um voo, afirmou Adams. Os investigadores então compararam o DNA do suspeito com amostras coletadas na calcinha de Biechler.
“Este caso foi resolvido por meio do uso de DNA, especificamente de genealogia de DNA”, afirmou Adams. “E, falando bem honestamente, não sei se algum dia resolveríamos este caso não fosse isso.”
As autoridades não informaram a motivação do assassinato. Evidências na cena do crime indicaram que a morte não decorreu de um roubo; decorreu, possivelmente, de um crime sexual. Adams afirmou que Biechler foi encontrada com a calça que vestia abaixada e parte de sua calcinha exposta, onde foi encontrado esperma de Sinopoli.
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Esse caso se junta a uma coleção de outros crimes ocorridos nos anos recentes que foram resolvidos por meio de testes de DNA, uma poderosa ferramenta usada em tribunais de todo o país, que levou a absolvições após condenações injustas e ajudou investigadores a encontrar assassinos que haviam cometido os crimes décadas atrás.
O caso de Biechler era a investigação de assassinato mais antiga em andamento no Condado de Lancaster, afirmou Adams, sublinhando anos de esforços inúteis e pistas falsas que confundiram os investigadores em torno do mistério sobre a morte da jovem. Dezenas de suspeitos foram dispensados após testes de sangue, exames de DNA e outros tipos de provas.
“Lindy Sue Biechler esteve nas mentes de muita gente ao longo desses anos”, afirmou Adams. “Certamente as forças policiais jamais se esquecerão dela.”
Nenhuma das pistas que os investigadores receberam mencionava Sinopoli, que, segundo Adams, continuou vivendo no Condado de Lancaster após o assassinato. O site PennLive.com noticiou que Sinopoli trabalhou como operador de prensa por mais de 40 anos.
No dia em que Biechler foi morta, ela tinha ido da floricultura em que trabalhava até o o local de trabalho do marido para pegar o cheque do salário dele, que ela depositaria no banco posteriormente naquela tarde. Depois, ela foi ao mercado comprar alimentos.
A tia e o tio de Biechler chegaram ao apartamento às 20h46, o que indicou que ela foi morta em algum momento das duas horas que ficou sozinha em casa, afirmou a polícia.
Perfil do DNA
Em 1997, os investigadores submeteram a calcinha usada por Biechler quando foi morta a um laboratório de DNA, que confirmou a presença de esperma e carregou o perfil do DNA encontrado ao Codis, um banco de dados nacional mantido pelo FBI (polícia federal). Mas os investigadores jamais obtiveram uma identificação por meio do Codis.
Dan Krane, professor de biologia da Universidade Wright State, em Dayton, Ohio, que pesquisou ferramentas para avaliar provas de DNA em investigações criminais, afirmou que, em 1997, “o Codis ainda era muito jovem”, com o DNA de apenas cerca de 2 milhões de pessoas no banco de dados, em comparação com aproximadamente 14 milhões hoje”.
A maior parte do DNA registrado no banco de dados vem de criminosos presos ou suspeitos detidos que tiveram seu material genético coletado, afirmou o professor Krane.
Em dezembro de 2020, a genealogista genética Cece Moore, que trabalha nos Parabon NanoLabs, uma empresa de Virgínia cujos serviços incluem novas análises forenses com base em DNA, recebeu uma amostra colhida na cena do assassinato pelas autoridades.
Os testes de DNA mostraram que a pessoa era descendente recente de imigrantes italianos. Moore descobriu que havia cerca de 2,3 mil moradores com ascendência italiana vivendo na área no momento da morte de Biechler.
A partir desse dado, ela estreitou a gama de possíveis suspeitos a pessoas cujos ancestrais tinham vivido em Gasperina, na Itália.
Então, usando arquivos de jornais, bancos de dados públicos, redes sociais, registros judiciais e outros recursos, Moore determinou que Sinopoli era um possível suspeito, em parte, porque ele tinha vivido no mesmo prédio que Biechler. Moore afirmou na entrevista coletiva que, posteriormente, ela submeteu uma “pista altamente específica” às autoridades.
Os investigadores levantaram informações sobre Sinopoli e eventualmente o seguiram até o aeroporto. Lá, recolheram o copo de café que ele havia jogado fora.
O professor Krane afirmou que esse tipo de procedimento tem se tornado comum em investigações nos últimos 20 anos.
“Fui informado a respeito de várias situações em que a pessoa foi interrogada por horas e horas, mas assim que aceitou uma bebida e colocou os lábios no recipiente, o interrogatório acabou — e os policiais permitiram que o suspeito fosse embora”, afirmou ele.
Na segunda-feira, as autoridades afirmaram que o marido de Biechler foi informado sobre a prisão de Sinopoli. “É muito significativo para a gente”, afirmou Adams, “ser capaz de dar algum senso de compensação pelas vítimas”. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO
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