O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, inaugurou a maior prisão do país, com capacidade para 40 mil pessoas, após registrar a maior taxa de encarceramento do mundo no ano passado. O novo centro de detenção sozinho dobra a capacidade do já congestionado sistema prisional salvadorenho e é anunciado pelo governo como a maior de toda a América.
“Ontem inauguramos o Centro de Confinamento do Terrorismo... Uma gigantesca obra realizada em apenas 7 meses e que é uma peça fundamental para ganhar por completo a guerra com as gangues”, escreveu Bukele em suas redes sociais na quarta-feira, 1°, junto com um vídeo das instalações.
O complexo foi construído em uma região rural e isolada do município de Tecoluca, a 74 km da capital San Salvador. Um muro com dois quilômetros de extensão cerca a construção, que terá dez pavilhões com celas de concreto armado. De acordo com o governo, 600 soldados e 250 policiais vão vigiar o prédio.
El Salvador é um país de 6,5 milhões de pessoas no qual o número de presos está crescendo rapidamente porque o governo está em uma campanha para reprimir a violência de gangues
Para Entender
Cerca de 2% de toda a população de El Salvador está presa. É o país com a maior taxa de encarcerados do mundo.
Sistema sobrecarregado
A construção mais do que dobra o número de vagas prisionais no país, que hoje conta com 20 centros de detenção, com capacidade total de 30 mil pessoas — embora mais de 97 mil salvadorenhos estejam privados de liberdade, segundo o jornal La Prensa Gráfica. A cifra corresponde a 2,2% da população maior de 18 anos.
Os números fizeram a pequena nação centro-americana de 6,5 milhões de habitantes chegar, em março do ano passado, ao topo do ranking de países com maior taxa de encarceramento do mundo. Os dados são da World Prison Brief, organização sediada na Universidade Birkbeck, em Londres.
Até a inauguração desse novo presídio, na terça-feira, 1º, a maior cadeia do país era a de La Esperanza, que abriga 33 mil pessoas (apesar da capacidade ser de 10 mil).
Até 2021, havia 20 centros de detenção no país com capacidade para 30 mil pessoas —no entanto, naquele ano havia quase 36 mil presos.
O diretor do sistema de prisões de El Salvador, Osiris Luna, disse que a nova prisão foi construída em uma área de 166 hectares, e que será patrulhada por 250 policiais.
Estado de exceção
Em março de 2022, o presidente do país, Nayib Bukele, conseguiu no Congresso a aprovação de um estado de exceção no país. Dessa forma, alguns direitos constitucionais foram suspensos —a polícia passou a fazer prisões sem mandados, e o governo passou a poder acessar a comunicação das pessoas sem autorização da Justiça.
Depois disso, o número de presos explodiu: mais de 62 mil pessoas foram presas, a maioria delas suspeita de pertencer a gangues.
A medida foi uma resposta ao fim de semana mais letal de El Salvador desde 2001, quando 87 foram mortas em 72 horas.
Antes, o país, que era um dos mais violentos do mundo, registrava dias sem mortes. Há evidências de que a onda de violência explodiu devido ao fim de um pacto do atual governo com criminosos. Em maio, o jornal El Faro revelou áudios que mostravam negociações entre um membro do governo e a MS-13, uma das três principais pandillas do país. Após o estado de exceção, as taxas de homicídio voltaram a cair.
Diversos órgãos de direitos humanos, além de moradores, no entanto, denunciam a prisão de inocentes e suspeitas de maus-tratos nos centros penitenciários. Na sexta-feira, 27, a Human Rights Watch afirmou que uma base de dados obtida pela ONG sustenta a existência de superlotação severa das prisões, violações em massa do devido processo legal e detenções de adolescentes. Segundo a organização, os dados são do Ministério da Segurança Pública e listam pessoas processadas sob o estado de exceção.
A Human Rights Watch afirma ainda que, no final de agosto, 1.082 menores de idade foram presos —918 do sexo masculino, e 164, do feminino—, incluindo 21 adolescentes de 12 e 13 anos. O banco de dados também contabiliza ao menos 32 pessoas mortas sob custódia do Estado.
A inauguração acontece um ano antes do pleito de 2024, em que Bukele vai concorrer outra vez, contrariando a Constituição salvadorenha, que veta a reeleição direta./ AFP e AP
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