No momento em que os republicanos se preparam para escolher quem os representará na eleição de 2024, Donald Trump parece imbatível. Ainda que o país discuta se o ex-presidente poderia, de fato, voltar a ocupar cargos públicos, ele consolida a liderança no partido e teria, em média, 65% dos votos republicanos.
O agregador de pesquisas da Economist mostra que Donald Trump ampliou sua vantagem no último ano ao passo em que o seu principal rival, o governador da Flórida, Ron DeSantis, desidratou. Em janeiro passado, o placar era 47 a 33% na média das pesquisas. De lá para cá, Trump subiu quase 20 pontos percentuais enquanto DeSantis despencou para 13%. Nesse período, um terceiro nome surgiu: Nikki Haley, a primeira mulher a governar o Estado da Carolina do Sul. Ela aparece com 11% dos votos republicanos na média dos dados agregados.
Ao longo de 2023, enquanto ampliava a distância sobre os rivais internos no partido, Donald Trump foi alvo de 91 acusações criminais, concentradas em quatro processos, que passaram a ser parte da campanha. O ex-presidente afirma que seria vítima de uma “perseguição judicial” ou uma “caça às bruxas”, como costuma dizer.
Pelo menos até aqui, a estratégia tem surtido efeito de mobilizar a sua base eleitoral. Isso depois de um momento de incomum fragilidade, quando se lançou candidato, em novembro de 2022, na ressaca de uma eleição de meio de mandato que frustrou os republicanos. O partido esperava uma “onda vermelha”, mas isso não aconteceu. Conquistou apenas uma estreita maioria na Câmara e viu os democratas ampliarem a vantagem no Senado, com o melhor resultado para o partido do governo em duas décadas. Candidatos apoiados por Trump tiveram resultado aquém do esperado e a sua liderança foi alvo de questionamentos.
Agora, no entanto, lidera com folga as pesquisas para as primárias do partido. E ainda aparece empatado com o presidente Joe Biden. Quando confrontados com a eventual repetição da eleição passada, 35% dizem que votariam no democrata, outros 35%, no republicano, mostrou a pesquisa Reuters/Ipsos divulgada na quarta-feira,10. Os outros 30% não sabem, apoiam outros candidatos ou não pretendem comparecer às urnas em 5 de novembro (13%). O voto não é obrigatório nos EUA.
Há quem argumente que a resistência do republicano pode ser explicada por uma percepção de que a retórica inflamada foi contrabalanceada por “políticas moderadas”, apesar do caos que marcou o seu primeiro governo.
“O sucesso de Trump não é sinal de que os Estados Unidos estão dispostos a aceitar as ideias da extrema direita”, escreveu Matthew Schmitz em análise publicada no New York Times. “Trump desfruta de apoio duradouro porque é percebido por muitos eleitores — com frequência por boa razão — como um moderado pragmático, apesar de imprevisível”, concluiu.
Nos Estados considerados decisivos, Trump aparece à frente de Biden em quase todos (cinco de seis), mostrou o New York Times, em novembro. Esse dado é importante porque o modelo de eleição americana possibilita que um candidato seja eleito mesmo sem ter a maioria dos votos, desde que vença nos “lugares certos”, como fez o próprio Donald Trump, em 2016.
As pesquisas foram levadas em consideração pela Economist ao apontar o líder republicano como “maior perigo para o mundo em 2024″. O texto alertava para o impacto que uma vitória de Trump teria dentro e fora dos Estados Unidos.
“Em razão dos republicanos trumpistas estarem planejando o segundo mandato de seu líder há meses, Trump 2 seria mais organizado do que Trump 1″, argumenta a revista. “Fanáticos verdadeiros ocupariam as posições mais importantes. Trump se sentiria livre para perseguir vinganças, protecionismos econômicos e acordos teatralmente extravagantes”, acrescenta.
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Histórico de Trump
O magnata fez fortuna no ramo do mercado imobiliário - com métodos que hoje são motivo de uma acusação por fraude - e se tornou uma figura popular na televisão americana com o reality show “O Aprendiz”.
Com o slogan “Make America Great Again” (Faça a América Grande de Novo) e um discurso estridente, derrotou a democrata Hillary Clinton e chegou à Casa Branca como um outsider, sem qualquer experiência prévia na política. Já eleito, teve o mandato marcado por controvérsias, como a construção do muro para frear a imigração na fronteira com o México. A medida radical foi motivo de um pé de guerra no Congresso, que paralisou o governo por mais de um mês até que o impasse sobre o financiamento fosse resolvido.
Na política externa, se engajou em uma guerra comercial com a China; assinou o acordo com Taleban que previa a retirada de tropas americanas do Afeganistão; transferiu a embaixada em Israel de Tel-Aviv para Jerusalém; assinou os acordos de Acordos de Abraão que normalizaram relações israelenses com países árabes; e se tornou o primeiro presidente americano a encontrar um líder da Coreia do Norte, Kim Jong Un.
Também foi o primeiro presidente na história americana a sofrer dois impeachments. O primeiro, em 2019, por causa de seu telefonema em que pedia ao presidente ucraniano Volodimir Zelenski para desenterrar supostos casos de corrupção envolvendo Hunter, o filho de Joe Biden sob ameaça de perda da ajuda militar dos EUA. O segundo, no apagar das luzes do governo, em 2021, depois que os seus apoiadores avançaram sobre o Capitólio, em 6 de janeiro, e tentaram impedir que a vitória de Biden fosse confirmada, encorajados por alegações falsas de fraude eleitoral. Em ambos os casos, Trump foi absolvido pelo Senado.
Depois que ele deixou a Casa Branca, o ataque sem precedentes foi investigado também por uma comissão especial no Congresso. Os legisladores concluíram que o motim foi uma tentativa de golpe liderada pelo ex-presidente. Três anos depois, os EUA já prenderam mais de 1.200 pessoas pelo motim como parte de uma investigação que é considerada a maior da história do Departamento de Justiça americano.
As acusações contra Trump
Donald Trump foi formalmente acusado em quatro casos: a suposta compra de silêncio da atriz pornô Stormy Daniels; os documentos secretos; e dois envolvendo a tentativa de reverter a derrota para Joe Biden em 2020, sendo um na esfera federal e outro no Estado da Georgia.
Há três julgamentos marcados para este ano. O primeiro deles, o da ação federal envolvendo as eleições de 2020, está previsto para começar em 4 de março, na véspera da chamada Super Terça, quando o republicanos fazem primárias simultâneas. Essas datas, no entanto, ainda podem ser alteradas em razão dos recursos que têm sido apresentados pela defesa e que podem alterar o ritmo dos julgamentos.
6 de janeiro, ação federal
Status: julgamento marcado para 4 de março
Nesse caso, são quatro acusações: conspiração para violar direitos, conspiração para fraudar o governo, conspiração para obstrução de processo oficial e obstrução de um processo oficial.
“Sob o pretexto de alegações de fraude infundadas, o réu pressionou as autoridades em certos estados a ignorar o voto popular”, afirmam os procuradores. As condenações dos dois primeiros poderiam levar a uma sentença de até cinco anos de prisão cada. Já as acusações de obstrução podem acarretar em até 20 anos de prisão.
6 de janeiro, ação na Georgia.
Status: denúncia apresentada
Trump responde por 13 acusações que vão de extorsão a conspiração para falsificar declarações. Os promotores detalharam várias frentes da tentativa de reverter a derrota para Biden, que garantiu por uma pequena margem os 16 delegados do Colégio Eleitoral na Georgia, reduto republicano.
Diante da derrota, o ex-presidente Donald Trump pediu a autoridade eleitoral da Georgia Brad Raffensperger que “encontrasse” votos para ele. O telefonema gravado foi um dos pontos de partida para investigação que durou mais de dois anos. Os promotores também recolheram evidências sobre o esquema envolvendo eleitores falsos, uma lista alternativa de votos do Colégio Eleitoral que daria vitória para Trump.
Documentos secretos.
Status: julgamento marcado para 20 de maio
O ex-presidente responde a 40 acusações relacionadas à posse de documentos oficiais e à obstrução dos esforços para recuperá-los. As pastas com centenas de arquivos confidenciais do governo americano foram encontradas na mansão do magnata em Mar-a-Lago, na Flórida, depois que ele já havia deixado a presidência americana.
A acusação argumenta que as informações sensíveis envolvendo, por exemplo, a capacidade de defesa dos Estados Unidos e que houve risco à segurança nacional.
Caso Stormy Daniels.
Status julgamento marcado para 25 de março
A ação comtempla 34 acusações relacionadas à falsificação de registros financeiros. O inquérito se concentrou em um pagamento de US$ 130 mil ( cerca de R$ 662 mil) feito duas semanas antes da eleição presidencial de 2016, vencida por Trump, a uma atriz pornô conhecida como Stormy Daniels.
O dinheiro era destinado, supostamente, a impedir Stormy, cujo verdadeiro nome é Stephanie Clifford, de revelar um relacionamento que ela diz ter tido com Trump alguns anos antes.
Além desses, Trump foi alvo ainda de ações civis. Foi esse o caso, por exemplo, do processo por fraude envolvendo a sua empresa, a Trump Organization, símbolo do império que o fez conhecido nos Estados Unidos.
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