Na reta final da eleição, os candidatos à presidência da Argentina participaram neste domingo, 8, do último debate antes da votação, marcada para o dia 22. Depois de expressar solidariedade a Israel pelo ataque de terroristas do Hamas, os presidenciáveis partiram para o enfrentamento. Sobraram críticas para o atual ministro da economia, Sergio Massa, e para o libertário Javier Milei, que saiu na frente nas PASO, as primárias argentinas e despontou como favorito. Sob a mira dos concorrentes, os dois esgotaram os pedidos de resposta a que tinham direito ainda na primeira metade do debate.
O libertário tem chamado a atenção de eleitores insatisfeitos com a crise ao defender medidas radicais, como a dolarização da economia e o fim do Banco Central com um discurso contra o sistema político, mas não para por aí. O candidato já defendeu a liberação de armas e se disse a favor da venda de órgãos. Essas falas são mais indigestas, especialmente para aqueles que ainda não estão convencidos e Milei aproveitou as réplicas para tentar se explicar.
O recuo veio em resposta à Patrícia Bullrich, a representante da direita macrista, que apareceu em terceiro lugar (27,7%), atrás de Milei (27,9%) e do governista Sergio Massa (30%) em pesquisa divulgada no fim do mês passado. Nesse cenário de quase empate em uma disputa acirrada, a ex-ministra mudou de estratégia recentemente e partiu para o enfrentamento com o libertário, como fez na noite deste domingo.
“Milei, olha a tua proposta de campanha: desregulação e liberação de armas. Se muda a proposta é porque não estava convencido. Digo as mães e aos pais que, se armas forem liberadas, estarão nas mãos [da facção] Los Momos. As armas vão terminar matando as crianças nas escolas. Essa é a verdade”, apontou a ex-ministro de Mauricio Macri.
Ao evocar o direito de resposta, Milei repetiu um recuo adotado pela campanha libertária em meio à polêmica sobre as armas e aproveitou para tentar explicar outra controvérsia, a venda de órgãos. Para isso, acusou a rival de espalhar mentiras disse que ela deveria relaxar.
“Ela não apenas vive agarrada às mentiras que sua equipe de campanha lhe conta, mas também mostra uma impressionante falta de flexibilidade. Propomos que a lei de armas seja respeitada, não como hoje, repleta de restrições que só favorecem os criminosos. Parece que ela está muito tensa, por favor, solte um pouco”, disse Milei.
“Também não propomos a venda de órgãos, dizemos que há 7 mil pessoas à espera de um transplante e potenciais doadores, há uma coisa que não funciona no meio e que gera muita corrupção”, concluiu o libertário que já defendeu uma saída via mercado para a fila de transplantes.
Ainda no tema da segurança pública, o primeiro do debate, Bullrich aproveitou para cutucar Sergio Massa, ao dizer que ele não tem “autoridade moral” para falar sobre o tema já que está no governo. Essa tem sido uma preocupação da Argentina, que em meio à crise, sofreu recentemente uma onda de violência, com saques em supermercados.
Mas foi na pauta econômica, que Massa enfrentou as principais críticas. “Vou lembrar você novamente. Há mais dois milhões de pessoas pobres desde que você chegou. Hoje ninguém pode comprar uma casa ou pagar aluguel. Os únicos que compram casas são os kirchneristas, seus amigos”, acusou Bullrich, que chegou a questionar quando o ministro iria parar de “roubar”.
A crítica foi reforçada pelo governador de Córdoaba Juan Schiaretti, da Façamos pelo Nosso País: “Ele é o ministro que levou a inflação de 65% para 140%; o dólar que estava em US$ 250 agora está em US$ 900 na taxa de câmbio paralela; ele tem tantas taxas de câmbio porque não há reservas no Banco Central, que elas chegam a -10, como em Chinchón”.
O ex-presidente da Câmara dos Deputados, Sergio Massa assumiu o ministério da Economia argentina no ano passado no meio de uma crise no peronismo. Martín Guzmán, que estava no comando da pasta desde o início do governo, foi derrubado pelo fogo amigo da vice-presidente Cristina Kirchner, que o criticava pelo acordo com o FMI, o Fundo Monetário Internacional. Ele então foi substituído por Silvina Batakis, que ficou menos de um mês no cargo e deu lugar para Sergio Massa.
Mais a esquerda, a candidata Myriam Bregman questionou o ministro da economia, Sergio Massa, se ele conseguiria viver com o salário médio que os argentinos recebem hoje (algo em torno de 124 mil pesos argentinos).
E foi justamente de uma resposta a Myriam que veio o principal embate direto entre os dois líderes nas pesquisas. Milei declarou que a candidata não entende de economia por defender a redução da jornada de trabalho como ferramenta para criar empregos. ‘Um sábio disse: “se os socialistas soubessem de economia, não seriam socialistas“. É o seu caso, Myriam’, disparou o libertário.
Massa então usou um direito de réplica para entrar na discussão. “Olha onde chegou. Para de desrespeitar as mulheres. Acho que, mesmo que elas pensem diferente, têm o direito de opinar. Mostra o teu autoritarismo”, rebateu.
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Influência de Lula na campanha
O enfrentamento entre os presidenciáveis ocorre em meio à crescente influência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha no país vizinho. Nesta semana, o Estadão revelou que o governo pediu em julho à ministra do Planejamento Simone Tebet, governadora do Brasil no CAF, que votasse a favor da liberação de empréstimos para a combalida economia argentina.
O governo diz que o intuito da intervenção era ajudar um importante parceiro comercial do Brasil na região. Na condição de ministro e candidato, Massa esteve no Brasil em agosto, quando discutiu outra potencial ajuda à economia argentina com Lula e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
O candidato libertário Javier Milei, que saiu na frente nas primárias, repercutiu a reportagem do Estadão em sua conta na rede social X, antigamente conhecida como Twitter, com críticas a Lula. “A casta vermelha está tremendo”, disse o libertário. Ele também acusou Lula de atuar contra sua candidatura, algo que o Planalto nega.
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