Em discurso na ONU, Zelenski critica interesse do Brasil em proposta de paz para a Ucrânia

Zelenski afirmou que a Rússia está tentando ressuscitar um passado colonial e países como o Brasil deveriam reconhecer isso

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Foto do author Daniel Gateno
Atualização:

O presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, discursou nesta quarta-feira, 25, na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York. O ucraniano citou nominalmente o Brasil e questionou o interesse brasileiro na resolução da guerra na Ucrânia.

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Ele fazia referência a um plano para encerrar o conflito no Leste Europeu divulgado por Brasília e Pequim em maio, após um encontro de Wang Yi, chanceler chinês, e Celso Amorim, assessor do presidente Lula (PT) para assuntos internacionais. O Brasil patrocina a fórmula de paz juntamente com a China para solucionar o fim do conflito, mas o plano já foi rejeitado por Kiev.

“Quando alguns propõem alternativas, acordos frágeis ou, ainda, ‘conjuntos de princípios’, eles não apenas ignoram os interesses e o sofrimento dos ucranianos [...], como dão a Putin espaço de atuação política para continuar a guerra”, afirmou Zelenski na tribuna do plenário da ONU em Nova York.

“Talvez alguém queira incluir um Nobel em sua biografia por um acordo de cessar-fogo em vez de uma paz efetiva. Mas os únicos prêmios que Putin lhe dará em troca é mais sofrimento”.

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Zelenski acusou Brasil e China de viabilizarem indiretamente os avanços de Vladimir Putin em seu discurso na Assembleia-Geral da ONU. Também afirmou que a Rússia está tentando ressuscitar um passado colonial e países como Brasil e China deveriam reconhecer isso ao invés de “tentar aumentar a sua própria influência global às custas da Ucrânia”. O presidente ucraniano destacou que qualquer proposta de paz que considere que Kiev precise ceder cerca de 20% de território para acabar com a guerra é inaceitável.

O presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, discursa na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York, Estados Unidos  Foto: Spencer Platt/AFP

“Este tipo de proposta ignora o sofrimento da Ucrânia, ignora a realidade e dá a Vladimir Putin o espaço político para continuar com a guerra”, apontou Zelenski.

Pouco depois, ele citou a proposta sino-brasileira de forma direta, aparentemente aludindo a uma reunião convocada por Pequim e Brasília com 19 países em desenvolvimento para discutir sua fórmula de paz após o fim da Assembleia-Geral, na sexta, 27.

“Quando a dupla China e Brasil tenta convencer outros a apoiá-los, na Europa, na África, propondo uma alternativa a uma paz plena e justa, surge a pergunta: qual é o verdadeiro interesse deles? Todos precisam entender que não obterão mais poder às custas da Ucrânia”, prosseguiu o ucraniano.

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A proposta a que Zelenski se refere é um documento de seis tópicos que recomenda a “interrupção imediata dos enfrentamentos” e alerta para os perigos do uso de armas nucleares, entre outros. Mas não menciona a integridade territorial da Ucrânia — algo que, na visão de Kiev, é um pré-requisito de acordo de paz.

Zelenski já havia criticado esse mesmo plano em diversas ocasiões anteriores. A mais recente tinha sido nesta terça, 24, quando, em pronunciamento ao Conselho de Segurança da ONU, ele deu a entender que a proposta não seguia os pressupostos de manutenção da paz que estão na fundação do organismo multilateral.

“Não há uma Carta da ONU diferente para o Brics ou para o G7. Não existe uma Carta da ONU russo-iraniana, ou sino-brasileira. Só existe uma Carta da ONU, que une a todos — que deve unir a todos”, afirmou.

O presidente ucraniano disse que a ONU não é o espaço adequado para discutir a paz na Ucrânia por conta da estrutura do Conselho de Segurança e o poder de veto da Rússia. Zelenski ressaltou que está usando o seu tempo em Nova York para conversar com diversos líderes mundiais que estão interessados em conversar sobre um acordo de paz que seja possível para a Ucrânia.

O líder ucraniano disse que Kiev quer paz mais do que qualquer outro país, mas a integridade territorial do país do Leste Europeu precisa permanecer intacta. Ele afirmou que a Rússia é um país “20 vezes maior que a Ucrânia” e mesmo assim quer mais terra.

O presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, discursou na Assembleia-Geral da ONU, nesta quarta-feira, 25  Foto: Spencer Platt/AFP

Entenda a proposta de Brasil e China

A proposta citada por Zelenski na entrevista surgiu em maio, quando o Brasil e a China apresentaram uma série de medidas com o objetivo de “desescalar o conflito”.

O texto propõe a negociação direta entre a Ucrânia e a Rússia a partir de três princípios: não expansão do campo de batalha; não escalada dos combates; e a não inflamação da situação.

O Itamaraty e a chancelaria china ainda pedem pelo fim do bombardeamento da infraestrutura civil e determinação de uma zona segura entorno de usinas nucleares nos dois lados da fronteira.

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Na semana passada, em conversa por telefone com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente russo, Vladimir Putin, levantou mais uma vez a possibilidade de intermediação de Brasil e China, assim como havia feito semanas antes em um discurso no Fórum Econômico Oriental, em Vladivostok, na Rússia. Na ocasião, Putin afirmou que os dois países, assim como a Índia, poderiam ser mediadores.

Chamado de “Seis Pontos para a Paz”, o documento traz as seguintes propostas.

1. As duas partes apelam a todos os atores relevantes a observarem três princípios para a desescalada da situação, a saber: não expansão do campo de batalha, não escalada dos combates e não inflamação da situação por qualquer parte.

2. As duas partes acreditam que o diálogo e a negociação são a única solução viável para a crise na Ucrânia. Todos os atores relevantes devem criar condições para a retomada do diálogo direto e promover a desescalada da situação até que se alcance um cessar-fogo abrangente. O Brasil e China apoiam uma conferência internacional de paz realizada em um momento apropriado, que seja reconhecida tanto pela Rússia quanto pela Ucrânia, com participação igualitária de todas as partes relevantes, além de uma discussão justa de todos os planos de paz.

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3. São necessários esforços para aumentar a assistência humanitária em áreas relevantes e prevenir uma crise humanitária de maior escala. Ataques a civis ou instalações civis devem ser evitados, e a população civil, incluindo mulheres, crianças e prisioneiros de guerra, deve ser protegida. As duas partes apoiam a troca de prisioneiros de guerra entre os países envolvidos no conflito.

4. O uso de armas de destruição em massa, em particular armas nucleares, químicas e biológicas, deve ser rejeitado. Todos os esforços possíveis devem ser feitos para prevenir a proliferação nuclear e evitar uma crise nuclear.

5. Ataques contra usinas nucleares ou outras instalações nucleares pacíficas devem ser rejeitados. Todas as partes devem cumprir o direito internacional, incluindo a Convenção de Segurança Nuclear, e prevenir com determinação acidentes nucleares causados pelo homem.

6. A divisão do mundo em grupos políticos ou econômicos isolados deveria ser evitada. As duas partes pedem novos esforços para reforçar a cooperação internacional em energia, moeda, finanças, comércio, segurança alimentar e segurança de infraestrutura crítica, incluindo oleodutos e gasodutos, cabos óticos submarinos, instalações elétricas e de energia, bem como redes de fibra ótica, a fim de proteger a estabilidade das cadeias industriais e de suprimentos globais.

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Criticas de Zelenski ao plano

Zelenski já havia criticado esse mesmo plano em diversas ocasiões anteriores. A mais recente tinha sido nesta terça (24), quando, em pronunciamento ao Conselho de Segurança da ONU, ele deu a entender que a proposta não seguia os pressupostos de manutenção da paz que estão na fundação do organismo multilateral.

“Não há uma Carta da ONU diferente para o Brics ou para o G7. Não existe uma Carta da ONU russo-iraniana, ou sino-brasileira. Só existe uma Carta da ONU, que une a todos —que deve unir a todos”, afirmou.

“Não acredito que este seja um plano concreto, pois não vejo ações ou etapas específicas, mas apenas uma certa generalização de procedimentos”, disse o presidente ucraniano à imprensa na noite sexta-feira, 21. “Uma generalização sempre esconde alguma coisa”, acrescentou. Anteriormente, Zelenski já tinha criticado a abordagem do presidente Lula em relação ao conflito.

Zelenski defendeu a fórmula de seu país para a paz em todos os discursos que deu à ONU desde o início da guerra, em 2022.

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Em entrevista ao site Metrópoles, no começo do mês, Zelenski voltou a criticar a postura do governo Lula e afirmou que o Brasil é “pró-Rússia”. A Ucrânia enxerga a neutralidade do governo brasileiro como cumplicidade com as ações da Rússia, que invadiu o território ucraniano em 24 de fevereiro de 2022.

Segurança nuclear e energética

Em seu discurso na Assembleia-Geral da ONU, Zelenski também ressaltou a necessidade de segurança nuclear, energética e alimentar na Ucrânia em meio aos ataques da Rússia contra a infraestrutura de Kiev.

Ele disse que está preocupado com a possibilidade de um “desastre nuclear” na Europa por conta da ocupação russa na usina nuclear de Zaporizhzhia, a maior do continente europeu. Segundo Zelenski, os primeiros ataques à planta em março de 2022 estão entre os “piores dias desde que a guerra começou”.

O presidente da Ucrania, Volodmir Zelenski, discursa na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York  Foto: Julia Demaree Nikhinson/AP

O presidente ucraniano acusou a Rússia de atacar a infraestrutura energética de Kiev para prejudicar os cidadãos ucranianos durante o inverno. “Putin quer deixar os ucranianos no frio e no escuro durante o inverno para forçar uma rendição”.

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Segundo Zelenski, um desastre nuclear pode acontecer a qualquer momento. Ele pediu que a comunidade internacional pressione Moscou a parar os ataques. “Um desastre nuclear não respeita fronteiras”.

Rússia e Irã

O líder ucraniano citou Irã e Coreia do Norte nominalmente em seu discurso, acusando os dois países de serem cúmplices da Rússia por fornecerem armas a Moscou.

Zelenski encerrou o seu discurso pedindo mais união entre os países da ONU. “Todos os países vizinhos na Europa e na Ásia acreditam que a guerra também pode chegar neles”.

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