Recep Tayyip Erdogan chegou ao poder em 2003. Desde então, um terço dos turcos, jovens recém-saídos da adolescência, nunca conheceram outro presidente. As eleições deste domingo, 14, porém, representam a maior ameaça das últimas décadas ao novo sultão da Turquia.
Se as pesquisas estiverem certas, seu maior rival, Kemal Kilicdaroglu, deve chegar à frente da disputa, mas com uma vantagem muito pequena. O ambiente altamente polarizado fazem os dois candidatos flertarem com marca dos 50% dos votos, o que decidiria a eleição no primeiro turno – o segundo, dependendo da votação dos candidatos nanicos, será realizado no dia 28. Os resultados devem ser conhecidos a partir das 15h.
Erdogan é um personagem controvertido. Herdou o segundo país mais populoso da Europa castigado por uma inflação crônica e taxas de juros estratosféricas. Ele tinha 49 anos e misturava um populismo nacionalista com um tempero religioso. O futuro da Turquia parecia brilhante.
A sede de poder do novo sultão
“A democracia é como um bonde. Você segue até o seu destino, então você desce”, dizia Erdogan, então prefeito de Istambul, nos anos 90. Mas, como presidente, ele trancou as portas, acelerou e nunca mais saiu. Foram 20 anos atacando as instituições, especialmente o Judiciário, e perseguindo opositores.
Em 20 anos, deu tempo de domar a inflação, vislumbrar um lapso de prosperidade e sonhar com a Europa. Mas foram tantos anos no poder que Erdogan foi perdendo capital político: recentemente, o custo de vida voltou a disparar, a insatisfação popular aumentou e a Turquia acordou do sonho europeu com o barulho de bombas no quintal: um conflito civil ao sul, na Síria, e uma guerra de verdade do outro lado do Mar Negro, na Ucrânia.
O sultanato de Erdogan viveu momentos de tensão. Em 2013, um movimento popular se espalhou pela Turquia – parte de uma onda global de insatisfação que varreu o mundo islâmico e chegou até o Brasil. O governo se manteve firme, resistindo aos protestos na Praça Taksim, em Istambul, reprimidos com violência pela polícia.
Em 2016, Erdogan sobreviveu a uma quartelada de setores do Exército, que foi controlada por forças leais a Erdogan. O motim serviu de pretexto para o governo distribuir o selo de “terrorista” para qualquer opositor político – mais de 15 mil pessoas foram presas, segundo o governo, por ligação com Fethullah Gülen, clérigo que vive exilado nos EUA e faz o papel de bicho-papão sempre que Erdogan precisa de um bode expiatório.
Apesar da truculência, Erdogan ainda é popular dentro de sua coalizão, composta pelos que mais se beneficiaram da fartura dos seus primeiros anos: uma classe média do interior do país, eleitores conservadores ou religiosos, principalmente de zonas rurais, que se sentiam desprezados pelas elites urbanas e seculares.
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Oposição unificada
Hoje, ameaça vem de um burocrata com pouco carisma, mas que conseguiu montar um arco de alianças que pode destronar o presidente mais longevo da Turquia desde a queda do Império Otomano. Aos 74 anos, o economista Kilicdaroglu é um funcionário público aposentado que escalou as pesquisas com a promessa de romper com a era Erdogan.
De fala mansa e figura esguia, ganhou dos analistas o apelido de “Gandhi da Turquia”. Com habilidade, Kilicdaroglu deu uma repaginada no moribundo Partido Republicano do Povo (CHP), transformado em uma moderna máquina de negociação social-democrata.
Hoje, os turcos decidem se Kilicdaroglu foi ou não convincente. Superar a era de Erdogan não é fácil. A Turquia está dividida. Muitos duvidam que o sultão aceite a derrota. Outros temem que Erdogan não seja capaz de perceber que a hora de descer do bonde chegou./ NYT E W.POST
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