Quando ocorreram algumas das piores inundações repentinas em décadas no leste da Espanha, Diego Hernandez estava passando pela cidade de Valência a caminho do funeral de sua mãe.
Enquanto ele e sua mulher dirigiam na noite de terça-feira, 29, uma fina corrente de água lamacenta começou a aparecer sob seus pneus. Em pouco tempo, a água tinha quase um metro de altura e se aproximava do topo de seus assentos. Em segundos, outro carro se acumulou em cima do deles.
O casal fugiu do veículo, inicialmente se agarrando a uma árvore, enquanto latas de lixo, rodas de carro, sofás e cadeiras passavam em meio às águas furiosas da enchente.
“Foi como um apocalipse”, disse ele.
Eles não estavam sozinhos. Milhares de pessoas se viram presas de uma forma ou de outra - em carros, caminhões e casas - quando fortes chuvas atingiram o sul da Espanha no início desta semana.
Pelo menos 155 pessoas morreram e outras ainda estão desaparecidas, mas ainda não se sabe quantas. As equipes de resgate temiam encontrar mais corpos, disse Margarita Robles, ministra da Defesa da Espanha, enquanto cavavam mais fundo na lama.
A chuva continuou a cair durante a noite e na manhã desta quinta-feira, 31, no leste e no sul da Espanha, enquanto as cidades e vilas do leste do país examinavam os danos.
Milhares de casas sem luz ou telefone
Em Castelló, a agência meteorológica do país alertou que rios e riachos poderiam transbordar. Os distritos de Valência e Catalunha permaneceram em alerta, com previsão de mais chuvas durante o dia, informou a agência meteorológica.
Milhares de residências ainda estavam sem eletricidade ou conexão telefônica, informaram as autoridades. Mais de uma dúzia de municípios relataram não ter água potável, informaram os serviços de emergência em Valência.
Esperava-se que o primeiro-ministro Pedro Sánchez visitasse as áreas mais afetadas, depois que o governo declarou três dias de luto nacional. Seu oponente, Alberto Núñez Feijóo, também visitará as áreas.
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Milhares de caminhões e carros abandonados nas ruas
Na cidade de Valência e em seus arredores, a água inundou shopping centers, abrigos para cães e até mesmo uma casa de repouso, matando alguns de seus residentes. Outras vítimas morreram em locais onde não choveu, arrastadas pelas águas turbulentas.
Na quarta-feira, 30, enquanto os médicos legistas trabalhavam para identificar os corpos, alguns dos vilarejos mais atingidos continuavam isolados, com as estradas e pontes que os ligavam ao resto do país quebradas ou inundadas pelas enchentes.
Milhares de caminhões e carros foram abandonados nas ruas e rodovias, enterrados em espessas camadas de lama, enquanto as passagens subterrâneas se enchiam de água. Seus proprietários ficaram presos em abrigos improvisados, incapazes de voltar para casa.
‘Os carros eram como barcos’
Toni Zamorano, 59 anos, sentou-se no chão do lado de fora de uma quadra de basquete em Valência que havia sido transformada em dormitório. Ele estava voltando para casa quando seu carro encheu de água na noite de terça-feira. Ele abriu a porta e pulou na água. Em poucos minutos, ele viu que seu carro estava completamente coberto de água e flutuando.
“Comecei a nadar, nadar, nadar”, disse ele. Ele estava sozinho em um trecho de rodovia inundada, com a água até o peito, enquanto sofás, computadores e carros passavam flutuando.
“Os carros eram como barcos”, disse ele. “Sinceramente, achei que tudo tinha acabado”.
Zamorano mora no vilarejo de Sedavi, a poucos quilômetros ao sul de Valência. Ele ainda não conseguiu chegar em casa.
“Não sei o que vou encontrar”, disse ele. “Minha cidade inteira deve estar devastada e não sei como está minha casa.”
Casal separado pela enxurrada
Hernandez, 56 anos, não compareceu ao funeral de sua mãe. Sua esposa acabou conseguindo se agarrar a um poste de luz, mas ele não, e foi arrastado. Ele tentou se agarrar a pneus e postes flutuantes até conseguir entrar em um ônibus que estava preso no córrego. A parte superior do ônibus ainda estava seca, e ele tirou suas roupas molhadas e se enrolou nas cortinas.
Por volta das 4h da manhã de quarta-feira, os socorristas vieram buscá-lo. Durante horas, ele não tinha ideia do que havia acontecido com sua esposa.
Ele não tinha seu celular e nenhum dos funcionários da emergência com quem ele falou tinha qualquer informação. Hernandez e sua esposa se conheciam desde que eram crianças e se casaram há quase 30 anos.
Finalmente, na quarta-feira de manhã, ele ligou para o irmão e recebeu a notícia que estava esperando: ela estava viva. Ela também o culpou por não ter se agarrado ao poste de luz como ela fez e ter se afastado na correnteza, disse seu irmão.
Se ela estava reclamando dele, “é sinal de que ela está bem”, disse Hernandez com uma risada, enquanto fumava do lado de fora de uma quadra de esportes, vestindo um suéter do time de basquete local que os socorristas lhe haviam dado.
Lá dentro, as oito quadras foram transformadas em um dormitório, com dezenas de colchões dispostos geometricamente abaixo das tabelas de basquete, ainda com o placar do último jogo disputado no local, 24.
Nuria Molio, 51 anos, seu irmão e seu pai estavam sentados juntos em um dos colchões. Eles tinham acabado de sair de um exame oncológico de seu pai de 84 anos quando a água jorrou em seu carro.
Os socorristas tiveram que retirá-los com uma corda para que não fossem arrastados. Eles passaram a noite embaixo de uma ponte na rodovia com outras dezenas de pessoas com suas roupas úmidas.
“Eu estava com medo de que a água levasse todos nós”, disse Nuria Molio.
c.2024 The New York Times Company
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