THE WASHINGTON POST - Nos últimos dias antes da invasão da Ucrânia, o serviço de segurança da Rússia começou a enviar instruções enigmáticas a informantes em Kiev. Faça as malas e saia da capital, disseram aos colaboradores do Kremlin, mas deixe para trás as chaves de suas casas.
As instruções vieram de oficiais superiores de uma unidade do Serviço Federal de Segurança da Rússia (FSB) chamada Departamento de Informações Operacionais. A missão: garantir a decapitação do governo ucraniano e supervisionar a instalação de um regime russo.
As mensagens eram uma medida da confiança naquele plano audacioso. Os agentes do FSB estavam tão certos de que em breve controlariam as alavancas do poder em Kiev, de acordo com autoridades de segurança ucranianas e ocidentais, que passaram os últimos dias antes da guerra organizando casas seguras ou acomodações em apartamentos de informantes e outros locais para o influxo planejado de pessoal.
“Tenha uma viagem de sucesso!”, disse um oficial do FSB a outro que estava sendo enviado para supervisionar a ocupação esperada, de acordo com comunicações interceptadas. Não há indicação de que o destinatário tenha chegado à capital, pois os planos do FSB entraram em colapso em meio à retirada das forças russas nos primeiros meses da guerra.
As comunicações que expõem esses preparativos fazem parte de um acervo maior de materiais sensíveis obtidos por serviços de segurança ucranianos e outros e revisados pelo jornal The Washington Post. Eles oferecem uma visão rara das atividades do FSB - um serviço extenso que carrega enorme responsabilidade pelo plano de guerra russo fracassado e pela arrogância que o impulsionou.
Uma agência cujo domínio inclui a segurança interna na Rússia, bem como a espionagem nos antigos estados soviéticos, o FSB passou décadas espionando a Ucrânia, tentando cooptar suas instituições, pagando funcionários e trabalhando para impedir qualquer desvio percebido para o Ocidente. Nenhum aspecto da missão de inteligência do FSB fora da Rússia era mais importante do que penetrar em todos os níveis da sociedade ucraniana.
No entanto, a agência não conseguiu incapacitar o governo da Ucrânia, fomentar qualquer aparência de uma onda pró-Rússia ou interromper o poder do presidente Volodmir Zelenski. Seus analistas não entenderam com que força a Ucrânia responderia, disseram autoridades ucranianas e ocidentais, ou entenderam, mas não puderam ou não transmitiram avaliações tão sóbrias ao presidente russo, Vladimir Putin.
As humilhações dos militares russos ofuscaram amplamente os fracassos do FSB e de outras agências de inteligência. Mas, de certa forma, essa falha tem sido ainda mais incompreensível e consequente, disseram autoridades, sustentando quase todas as decisões de guerra do Kremlin.
A guerra de Putin
“Os russos estavam muito errados”, disse um alto funcionário dos EUA com acesso regular a informações confidenciais sobre a Rússia e seus serviços de segurança. “Eles montaram todo um esforço de guerra para conquistar objetivos estratégicos que estavam além de seus meios”, disse o oficial.
Os serviços de segurança da Ucrânia têm interesse em desacreditar as agências de espionagem da Rússia, mas os principais detalhes da descoberta foram corroborados por funcionários de governos ocidentais.
Os arquivos mostram que a unidade do FSB responsável pela Ucrânia aumentou de tamanho nos meses que antecederam a guerra e contava com o apoio de uma vasta rede de agentes pagos no aparato de segurança da Ucrânia. Alguns obedeceram e sabotaram as defesas da Ucrânia, disseram autoridades, enquanto outros parecem ter embolsado seus pagamentos do FSB, mas se recusaram a cumprir as ordens do Kremlin quando os combates começaram.
Há registros que aumentam o mistério dos erros de cálculo russos. Pesquisas extensas realizadas para o FSB mostram que grandes segmentos da população da Ucrânia estavam preparados para resistir à invasão russa e que qualquer expectativa de que as forças russas seriam recebidas como libertadores era infundada.
Mesmo assim, disseram as autoridades, o FSB continuou a alimentar o Kremlin com avaliações otimistas de que as massas ucranianas dariam as boas-vindas à chegada dos militares russos e à restauração do governo favorável a Moscou.
“A sensação de que haveria flores espalhadas em seu (dos russos) caminho - isso foi um exercício do FSB”, disse um alto funcionário de segurança ocidental. Ele e outros oficiais na Ucrânia, EUA e Europa falaram sob condição de anonimato para discutir informações confidenciais.
Aderindo a essas suposições erradas, disseram autoridades, o FSB defendeu um plano de guerra baseado na ideia de que um ataque relâmpago a Kiev derrubaria o governo em questão de dias. Zelenski estaria morto, capturado ou exilado, criando um vácuo político para os agentes do FSB preencherem.
Em vez disso, os agentes do FSB que chegaram aos arredores de Kiev tiveram de recuar ao lado das forças russas. Em vez de presidir a formação de um novo governo na capital, o FSB agora enfrenta questões difíceis em Moscou sobre o que sua longa história de operações contra a Ucrânia – e as grandes somas que as financiaram – conseguiu.
O FSB não respondeu aos pedidos de comentários.
Os planos do FSB e os esforços das agências de segurança ucranianas para frustrá-los - com o apoio da CIA, do MI6 britânico e de outros serviços de inteligência ocidentais - fazem parte de uma guerra que ocorreu paralelamente à campanha militar da Rússia.
É um conflito que estava em andamento muito antes da invasão de 24 de fevereiro, e suas linhas de batalha são borradas pelas histórias emaranhadas e sobrepostas de serviços russos e contrapartes ucranianos que começaram como descendentes da KGB da era soviética.
Seis meses de guerra, nenhum dos lados parece ter uma vantagem clara.
As agências de segurança da Ucrânia obtiveram vitórias notáveis. Logo no início, uma organização não-governamental ucraniana, Peacemaker, publicou o que descreveu como uma lista de agentes do FSB ligados ao esforço de guerra, divulgando as identidades e números de passaporte de dezenas de supostos espiões em um movimento destinado a atrapalhar os planos da agência e abalar seu pessoal.
Ao mesmo tempo, o principal serviço de segurança interna da Ucrânia, o SBU, tem lutado para livrar suas fileiras de espiões e sabotadores russos. Vários oficiais superiores foram presos e acusados de traidores por Zelenski, que tomou a medida extraordinária em julho de remover o diretor da SBU, Ivan Bakanov - um amigo de infância - de seu cargo.
Não se acredita que Putin tenha tomado medidas comparáveis contra nenhum de seus chefes de espionagem, apesar da escala de seus erros de julgamento.
“Como eles poderiam ter assumido que os ucranianos não lutariam, que o presidente Zelenski não resistiria tão valentemente? A desconexão deve estar em algum lugar entre (os agentes) do FSB e no alto comando”, disse William B. Taylor Jr., que serviu duas vezes como embaixador dos EUA na Ucrânia.
Folha de pagamento do Kremlin
Entre os que planejavam chegar a Kiev no fim de fevereiro estava Igor Kovalenko, identificado pela Ucrânia como um oficial sênior do FSB que durante anos foi o principal manipulador de alguns dos mais proeminentes políticos e funcionários do governo ucraniano secretamente mantidos na folha de pagamento do Kremlin.
Uma conversa que Kovalenko teve com um subordinado do FSB em 18 de fevereiro sugere que ele estava de olho em um apartamento no arborizado bairro de Obolon, em Kiev, com vista para o Rio Dnieper.
Comunicações interceptadas mostram que Kovalenko pediu o endereço do apartamento e os detalhes de contato de um informante do FSB que o ocupava. As autoridades ucranianas disseram que o residente foi posteriormente detido e interrogado.
O subordinado de Kovalenko enviou de volta o endereço, números de telefone e palavras-chave usadas para se comunicar com o informante, que serviu no governo de Zelenski, disseram autoridades ucranianas.
Os funcionários se recusaram a identificar o informante, mas disseram que ele admitiu ter recebido instruções do FSB dias antes da invasão para arrumar seus pertences, deixar suas chaves e sair da capital para garantir sua segurança pessoal durante a fase inicial da guerra.
Kovalenko não respondeu aos pedidos de comentários.
Kovalenko é um oficial sênior de uma unidade do FSB - a Nona Diretoria do Departamento de Informações Operacionais - cujo objetivo principal tem sido, há anos, assegurar a servidão da Ucrânia a Moscou.
O departamento é supervisionado por um alto funcionário do FSB, Serguei Beseda, que começou sua carreira na KGB no fim dos anos 70, de acordo com autoridades ucranianas, e foi designado para cargos no exterior, incluindo Cuba, antes de retornar a Moscou para chefiar operações na Ucrânia, Geórgia e outras ex-repúblicas soviéticas.
Depois que os protestos eclodiram em Kiev, no fim de 2013, contra o governo pró-Rússia de Viktor Yanukovych, Beseda apareceu na capital ucraniana pedindo ao então presidente que usasse força mortal para reprimir uma revolta que viria a ser conhecida como a Revolução Maidan.
Quando os manifestantes prevaleceram, Yanukovych fugiu para a Rússia com um grupo de conselheiros seniores suspeitos de trabalhar com a filial de Beseda nos anos que se seguiram para trazer um governo pró-Rússia de volta ao poder.
Esse projeto parecia ter ganhado uma nova urgência nos dois anos que antecederam a invasão de fevereiro.
Em 2019, o FSB iniciou uma grande expansão de sua unidade na Ucrânia, um grupo que cresceu de 30 oficiais para 160 no ano passado passado, de acordo com autoridades ucranianas que citaram comunicações interceptadas e outras informações.
A princípio, o aumento foi visto como outro empreendimento destinado a “retornar a influência russa na Ucrânia”, disse um oficial de segurança em Kiev. Mas, em retrospecto, pode ter sido um sinal precoce de que a Rússia estava mudando o foco, de moldar os eventos na Ucrânia para planejar a “apreensão” do país.
À medida que a mobilização militar da Rússia acelerou no ano passado, os serviços de segurança da Ucrânia foram inundados com informações adicionais de serviços de espionagem ocidentais, disseram autoridades.
No início de janeiro, o diretor da CIA, William J. Burns, chegou a Kiev com um dossiê detalhado sobre os planos da Rússia e uma equipe de funcionários americanos que buscavam convencer Zelenski e seu grupo mais próximo de que a guerra era iminente.
No entanto, quando a equipe da CIA partiu, os chefes de espionagem da Ucrânia se reuniram com Zelenski para dar um briefing que foi muito mais ambíguo.
Outras informações que chegaram tarde, no entanto, pareciam lançar dúvidas sobre a ideia de que a Rússia estava preparada para, sem falar no planejamento, combate em grande escala.
Sinais ambíguos
Em meados de fevereiro, o serviço de inteligência estrangeira da Ucrânia, o SZR, enviou agentes à Rússia para realizar operações de vigilância em unidades militares. Uma equipe encontrou uma vila Potemkin com dezenas de tanques estacionados acompanhados por um pequeno destacamento de segurança. Não havia operadores de tanques ou equipes de manutenção nas proximidades.
Em outros lugares, os espiões da Ucrânia se depararam com uma cena de caos disciplinar: filas de veículos russos encalhados acompanhados por tropas que trocaram combustível e outros suprimentos por álcool. “Muitos deles estavam bêbados”, disse uma autoridade ucraniana que revisou relatórios sobre o que os espiões da Ucrânia testemunharam.
As cenas alimentaram dúvidas entre os conselheiros de segurança de Zelenski, alguns dos quais compreensivelmente não estavam inclinados a acreditar que os dias de seu país estivessem contados. Mesmo agora, meses depois, muitos continuam a expressar descrença de que a Rússia tenha avançado tão mal preparada para o combate em grande escala.
No final, muitos oficiais de segurança ucranianos acreditavam que o aumento militar da Rússia era em grande parte um estratagema psicológico, mas que Moscou poderia usar ataques de mísseis e incursões de unidades aéreas e tropas de elite para derrubar um governo que considerava oscilante.
Na época, os índices de aprovação de Zelenski caíram para cerca de 26%, já que a Ucrânia enfrentava uma crise de energia e pressão sobre sua moeda que as autoridades atribuíram à sabotagem russa.
Em entrevista este mês ao jornal The Washington Post, Zelenski disse que, bem antes da invasão, a Rússia estava travando “uma guerra híbrida” contra Kiev. “Houve um golpe de energia, houve um golpe político”, disse. “Eles queriam uma mudança de poder de dentro do país”, disse ele. “Tive a sensação de que (os russos) queriam nos preparar para uma rendição suave”.
A SBU da Ucrânia - como sua contraparte russa - é descendente direta da KGB. Ocupa a antiga sede da KGB em Kiev, está organizada em torno da mesma estrutura burocrática de seu antecessor soviético e emprega um número não revelado de oficiais que treinaram na academia da KGB em Moscou ou em seu sucessor FSB após a dissolução soviética.
As histórias emaranhadas das agências trazem um aspecto de salão de espelhos ao conflito.
Autoridades de segurança ucranianas atuais e anteriores disseram que o medo sobre a lealdade de funcionários de alto escalão é uma fonte de ansiedade constante. Um oficial disse que pegou seu telefone no segundo dia da guerra para começar a ligar para subordinados para retransmitir ordens. Mas ele hesitou ao discar, preocupado que suas ligações ficassem sem resposta ou revelassem que tenentes seniores haviam dado seu apoio aos russos.
Paradoxo
Ele ficou surpreso, disse, quando aqueles que ele chamou não apenas responderam, mas seguiram ordens com uma precisão e determinação que eram raras antes do conflito.
“É um paradoxo do Estado ucraniano”, disse o funcionário. “Acreditava-se, inclusive pelos próprios ucranianos, que havia um alto nível de corrupção, ineficiência e infiltração de agentes russos nas estruturas do governo ucraniano”. Mas depois de 24 de fevereiro, ele disse, “eles não apenas trabalharam, mas também trabalharam com mais eficiência do que nunca”.
Ele e outros atribuíram muito dessa resiliência ao exemplo que Zelenski deu com sua decisão de permanecer na capital. Sua capacidade para fazer isso deveu-se em parte à existência de um enorme complexo de bunkers sob a sede do governo de Kiev, projetado por engenheiros soviéticos e construído para sobreviver a conflitos nucleares.
Um conselheiro sênior descreveu ter sido levado para encontrar Zelenski nas primeiras semanas da guerra e descer em um labirinto desorientador de túneis e postos de comando. “Ainda não posso dizer a você onde fica exatamente (a base de operações de Zelensky)”, disse ele, porque o complexo é um labirinto.
A Ucrânia fez repetidas tentativas de limpar suas fileiras de ativos russos, em um ponto até recrutando um oficial da CIA para servir como consultor interno para erradicar penetrações do FSB, de acordo com ex-funcionários dos EUA. Mas com uma estimativa de 27 mil funcionários - tornando o SBU pelo menos cinco vezes maior que o MI5, seu equivalente britânico - a agência tem lutado para superar o problema.
“Existe traição? O que posso dizer?”, disse Zelenski. “Com todo o meu amor pela Ucrânia, não estamos sem pecado. O número daqueles que não são leais ao seu país caiu ao longo dos anos”, disse ele. “Ainda assim, quando a guerra começou, havia pessoas que trabalhavam para os russos por dinheiro, e algumas que de dentro sempre odiavam a Ucrânia e esperavam o retorno da União Soviética.”
No geral, a Ucrânia deteve mais de 800 pessoas suspeitas de ajudar a Rússia por meio de reconhecimento ou sabotagem, segundo o Ministério do Interior da Ucrânia. As autoridades também agiram contra suspeitos de “agentes de influência” no governo, no Parlamento e na política.
Quase todos os serviços de inteligência com interesse na guerra cometeram erros de julgamento consequentes.
As agências de espionagem dos EUA estavam cientes das intenções de Putin, mas subestimaram a capacidade da Ucrânia de resistir ao ataque – um erro que contribuiu para a hesitação inicial dos EUA em enviar armas pesadas e sofisticadas.
Os serviços da Ucrânia parecem ter lido demais os sinais de que as forças russas estavam mal preparadas para o combate em grande escala, resistindo aos avisos ocidentais de uma invasão que ocorreu a vários quilômetros da capital.
Os colapsos de inteligência da Rússia na Ucrânia parecem mais sistêmicos, seu trabalho prejudicado por fontes não confiáveis, desincentivos para entregar verdades duras ao Kremlin e um viés endêmico que combinava com a atitude desdenhosa de Putin em relação ao país.
O FSB alimentou essa dinâmica, disseram autoridades, com avaliações feitas para agradar o Kremlin e com fontes que tinham suas próprias razões - políticas e financeiras - para encorajar a derrubada do governo de Kiev pelos russos.
Relatórios confidenciais de um think tank com laços estreitos com o FSB, o Instituto de Países da CEI, com sede em Moscou, incitaram Moscou a reafirmar o controle sobre seu vizinho.
Um relatório do início de 2021 obtido pelo Post dizia que fazer isso era a única maneira de “livrar a Rússia da ameaça eterna... representada pelo estado fantoche pronto para executar qualquer ordem das forças inimigas do Ocidente”.
O diretor do instituto, Konstantin Zatulin, insistiu em entrevista por telefone que se opôs ao uso da força militar contra a Ucrânia e culpou as “expectativas infladas” do Kremlin sobre o que a invasão poderia conquistar com os aliados do Kremlin no país.
Um dos aspectos mais intrigantes do erro de cálculo da Rússia é que o FSB havia recebido informações sugerindo que a guerra com a Ucrânia não seria fácil.
Pesquisas recentes realizadas por uma organização com laços estreitos com o FSB mostraram que Putin era profundamente impopular na Ucrânia e que a ideia de que as forças russas seriam bem-vindas era ficção, segundo cópias obtidas pela inteligência ucraniana.
Uma pesquisa de abril de 2021 da empresa Research & Branding descobriu que 84% dos ucranianos considerariam qualquer nova invasão das forças russas como uma “ocupação”, com apenas 2% vendo esse cenário como uma “libertação”.
Uma segunda pesquisa, realizada no fim de janeiro, apenas algumas semanas antes da guerra, questionou os ucranianos sobre os cenários de invasão em detalhes extraordinários, de acordo com um documento de 26 páginas revisado pelo Post. A pergunta mais importante aparece no final da pesquisa: “Você está pronto para defender a Ucrânia no caso de tal necessidade?” No geral, 48% responderam afirmativamente.
Autoridades ucranianas disseram que o número deveria ter sido interpretado como um sinal de determinação, mostrando que milhões de cidadãos estavam prontos para pegar em armas contra a Rússia. O FSB, no entanto, pode ter tirado uma conclusão diferente dos mesmos dados, acreditando que apenas uma minoria de ucranianos estava comprometida em defender seu país.
Não está claro se os resultados dessas pesquisas foram transmitidos com precisão ao Kremlin.
Sem punição
Os primeiros relatos de que Beseda, responsável pela diretoria do FSB na Ucrânia, havia sido rebaixado ou até preso são vistos com ceticismo pelos EUA e outros oficiais de inteligência, que dizem não ter visto nenhuma informação que sugerisse que qualquer um dos chefes de espionagem da Rússia tenha enfrentado tais consequências.
Nem há qualquer indicação de que o chefe do FSB, Alexander Bortnikov, tenha sido responsabilizado pelas falhas de sua agência. Um político russo de alto escalão com vínculos estreitos com o Kremlin e o FSB também disse em entrevista que Beseda continua desempenhando suas funções.
Outros relatórios indicavam que Putin havia deixado de lado o FSB por causa de seus fracassos e dado maior responsabilidade pela Ucrânia à unidade ligada aos militares. Autoridades ucranianas dizem o contrário.
Autoridades ucranianas citaram informações recentes indicando que o FSB - assim como os militares russos - se reagrupou, voltando seu foco para territórios no sul e leste que foram destruídos pela artilharia russa.
“Podemos ver isso acontecendo agora em Mariupol, Melitopol, Kherson” e outras cidades que caíram nas mãos das forças russas, disse um oficial de inteligência ucraniano. Funcionários do FSB entram em cena para implementar uma versão do projeto que a agência tinha originalmente para Kiev.
Kherson, a primeira grande cidade a cair para o Exército russo, agora oferece um vislumbre arrepiante de como a vida poderia ter sido se a Rússia tivesse tomado a capital da Ucrânia.
O prefeito da cidade, Ihor Kolykhaiev, foi preso em junho depois de se recusar repetidamente a cooperar com os ocupantes russos, e seu paradeiro é desconhecido, disse um assessor dele. Kolykhaiev foi substituído por Oleksandr Kobets, um ex-oficial da KGB que também havia trabalhado para a SBU.
Uma assessora do ex-prefeito, Galina Lyashevskaya, disse que pelo menos 300 moradores também desapareceram quando Kolykhaiev foi deposto, em abril. As estimativas mais recentes são pelo menos o dobro disso.
Muitos outros foram presos, disse ela, e cerca de metade da população da cidade, de 300 mil habitantes, fugiu. Em um relatório recente, a Human Rights Watch documentou dezenas de casos de tortura entre os moradores de Kherson.
Autoridades ucranianas disseram que o FSB está envolvido no planejamento de um referendo que forneceria um pretexto para incorporar a cidade e a região em volta dela à Rússia. Mas a Ucrânia começou a organizar forças para uma grande contraofensiva para retomar Kherson.
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