EUA suspendem execução de serial killer após 8 tentativas falhas de achar veia para a injeção letal

Equipe tentou estabilizar linha intravenosa oito vezes, em diferentes locais nos braços, mãos, pernas e pés de Thomas Eugene Creech, condenado por cinco assassinatos e suspeito de vários outros

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Por Rebecca Boone
Atualização:

O Estado de Idaho, nos Estados Unidos, suspendeu a execução de um serial killer na quarta-feira, 28, depois que os membros da equipe responsável falharam várias vezes ao tentar encontrar uma veia para estabelecer uma linha intravenosa e aplicar a injeção letal.

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Thomas Eugene Creech, de 73 anos, está preso há meio século, condenado por cinco assassinatos em três Estados e suspeito de vários outros. Ele já cumpria pena de prisão perpétua quando espancou um colega de cela, David Dale Jensen, de 22 anos, até a morte em 1981 — o crime que o condenou à pena de morte.

Creech, um dos prisioneiros que está há mais tempo no corredor da morte dos Estados Unidos, foi levado para a câmara de execução na Instituição de Segurança Máxima de Idaho às 10h da manhã (horário local). Três profissionais da equipe responsável pela execução tentaram estabelecer uma intravenosa oito vezes, disse Josh Tewalt, o Diretor do Departamento de Correção, em entrevista coletiva.

Em alguns casos, eles não conseguiram acessar à veia, e em outros conseguiram, mas havia preocupações sobre a qualidade da veia. Eles tentaram diferentes locais em seus braços, suas mãos, pernas e pés. Em dado momento, um membro da equipe saiu para buscar mais suprimentos. O diretor anunciou que suspenderia a execução às 10h58.

O departamento penitenciário disse que a pena de morte para Creech iria expirar e que eles estavam analisando os próximos passos. Embora outros procedimentos médicos possam ser autorizados para a execução, o Estado está ciente da proibição da 8ª Emenda a punições cruéis e incomuns, disse Tewalt.

Os advogados de Creech imediatamente apresentaram um novo pedido de suspensão no Tribunal Distrital dos EUA, dizendo que a “a tentativa mal sucedida de execução” prova a “incapacidade do departamento de tomar conta de uma execução humana e constitucional”. O tribunal concedeu a suspensão depois que Idaho confirmou que não iria tentar executá-lo mais uma vez antes de a pena de morte expirar; o Estado terá que obter outro mandado se quiser realizar a execução.

”Isso é o que acontece quando indivíduos desconhecidos com um treinamento desconhecido são designados para cuidar de uma execução”, disse a Defensoria de Idaho em um comunicado. “Esse é precisamente o tipo de acidente que nós alertamos os Estado e os tribunais que poderia acontecer ao tentar executar os tribunais que poderia acontecer ao tentar executar um dos presos mais antigos no corredor da morte do país.”

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Imagem divulgada pelo sistema prisional de Idaho mostra Thomas Creech em 2009. Aos 73 anos, é um dos prisioneiros que está há mais tempo no corredor da morte dos EUA. Foto: Departamento de Correção de Idaho via AP

Toucas balaclava, testemunhas e anestésico

Seis autoridades de Idaho, incluindo o procurador-geral Raul Labrador, e quatro representantes da imprensa, incluindo um repórter da Associated Press, estiveram presentes para testemunhar a tentativa — que seria a primeira execução em Idaho em 12 anos.

A equipe de execução era composta inteiramente de voluntários, de acordo com o departamento prisional. Aqueles responsáveis em estabilizar a intravenosa e administrar a injeção letal tinham treinamento médico, mas suas identidades foram mantidas em sigilo. Eles usavam toucas balaclava brancas e toucas azul-marinho para esconder o seu rosto.

A cada tentativa de localizar uma veia, a equipe limpava a pele do prisioneiro com álcool, injetava uma solução anestesiante, limpavam a pele de novo e tentavam colocar o cateter. Cada investida levava vários minutos, com membros da equipe apalpando a pele e tentando posicionar as agulhas.

Creech frequentemente olhava para seus familiares e seus representantes, que estava sentados em uma sala separada de testemunhas. Seus braços estavam amarrados na mesa, mas ele frequentemente movia seus dedos em direção aos braços. Ele pareceu sussurrar “eu te amo” para alguém na sala, em dados momentos.

A câmara de execução na Instituição de Segurança Máxima de Idaho, em 2011. Equipe médica de voluntários falhou repetidamente em encontrar uma veia onde pudesse estabelecer uma linha intravenosa para aplicar a injeção letal Foto: AP Photo/Jessie L. Bonner, Arquivo

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Depois que a execução foi suspensa, o diretor se aproximou de Creech e sussurrou para ele por vários minutos, apertando seu braço. Poucas horas depois, o procurador-geral Raul Labrador divulgou um comunicado dizendo que “a justiça foi adiada novamente”. “Nosso dever é buscar justiça para as muitas vítimas e suas famílias que vivenciaram a brutalidade e a falta de sentido de suas ações”, escreveu o procurador-geral.

A equipe de Creech apresentou uma enxurrada de apelações esperando impedir sua execução. Eles incluíram alegações de que a sua audiência de clemência era injusta, que era inconstitucional matá-lo porque ele foi sentenciado por um juiz em vez de um júri — e que o Estado não tinha fornecido informações suficientes sobre como obteve a droga letal, o pentobarbital, ou como deveria ser administrada.

Mas o tribunal não encontrou bases para sua indulgência. A última chance de Creech — uma petição para a Suprema Corte dos Estados Unidos — foi negada poucas horas antes da execução programada na quarta-feira. Na noite de terça-feira, 27, Creech passou um tempo com sua esposa e comeu uma última refeição, incluindo frango frito, batatas amassadas, molho e sorvete. Um grupo de cerca de 15 manifestantes permaneceu fora da prisão na quarta-feira e, em dado momento, cantaram Amazing Grace, um hino cristão.

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Manifestantes protestaram contra a pena de morte na quarta-feira, fora da prisão em Idaho onde Creech está preso. Foto: Sarah A. Miller/Idaho Statesman via AP

“Charmoso, mas psicopata”

Natural de Ohio, Creech passou a maior parte da vida atrás das grades em Idaho. Ele foi absolvido de um assassinato em Tucson, Arizona, em 1973 — as autoridades, no entanto, acreditam que ele o cometeu, já que usou os cartões de crédito das vítimas para viajar para Oregon.

Mais tarde, ele foi condenado em 1974 por um assassinato no Oregon e outro na Califórnia, para onde ele viajou depois de ganhar um passe de fim de semana em um hospital psiquiátrico. No mesmo ano, meses depois, ele foi preso em Idaho depois de matar John Wayne Bradford e Edward homas Arnold, dois pintores que levaram Creech e a sua namorada após eles pedirem carona na estrada.

Ele estava cumprindo uma pena perpétua por estes assassinatos em 1981 quando ele espancou um prisioneiro até a morte. Jensen estava cumprindo pena por roubo de carro. Seus familiares descreveram-no durante a audiência de clemência de Creech, no mês passado, como uma alma gentil que gostava de caçar e de estar ao ar livre. A filha de Jensen tinha 4 anos quando ele morreu. Ela falou perante o tribunal sobre como foi doloroso crescer sem pai.

Apoiadores de Creech dizem que ele é um homem que mudou profundamente. Há alguns anos, ele casou com a mãe de um agente penitenciário, e antigos funcionários da equipe da prisão disseram que ele era conhecido por escrever poemas e expressar gratidão pelo trabalho deles. Durante sua audiência de clemência, a promotora adjunta do condado de Ada, Jill Longhorst, não contestou que Creech pode ser charmoso. Mas ela disse que ele ainda é um psicopata — sem remorso e empatia.

A pena de morte nos EUA

No ano passado, legisladores de Idaho aprovaram uma lei que autorizara a execução por tiroteio quando uma injeção letal não estiver disponível. Oficiais penitenciários ainda não elaboraram uma política operacional padrão para o uso de pelotões de fuzilamento, nem construíram uma instalação onde a execução de um pelotão de fuzilamento pudesse ocorrer. Ambas teriam de acontecer antes que o Estado pudesse tentar usar a nova lei, o que provavelmente desencadearia vários desafios legais.

Outros Estados também já tiveram problemas com injeções letais. A governadora do Alabama, Kay Ivey, pausou as execuções por vários meses para conduzir uma revisão interna depois que oficiais cancelaram a injeção letal de Kenneth Eugene Smith em novembro de 2022 — a terceira vez desde 2018 que o Alabama não conseguiu conduzir execuções devido a problemas com acessos intravenosos.

Smith, em janeiro, tornou-se a primeira pessoa dos Estados Unidos a ser condenada à morte usando gás nitrogênio. Ele tremeu e convulsionou por vários minutos na maca da câmara mortuária durante a execução. Idaho não permite execução por hipóxia de nitrogênio.

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Em 2014, oficiais de Oklahoma tentaram suspender uma injeção letal quando o prisioneiro, Clayton Lockett, começou a se contorcer após ser declarado inconsciente. Ele morreu após 43 minutos; uma revisão descobriu que seu acesso intravenoso se soltou./Associated Press.

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