WASHINGTON - À medida que os casos de coronavírus aumentam nos Estados Unidos, o termo “segunda onda” e a pergunta sobre se estamos no meio dela ou prestes a entrar nela dominam os noticiários. Em Estados como Arizona, Texas, Oklahoma e Flórida, o número de infecções continua subindo. Apesar disto, os planos de reabertura da economia persistem. O que exatamente define uma “segunda onda” no caso de uma pandemia?
Anthony S. Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA conversou com o Washington Post e explicou como vê a covid-19 e seu desenvolvimento no mundo.
Como podemos prever o fim de uma onda e o início de outra? É possível sinalizar esse início?
Na verdade não conseguimos prever. Você pode ter uma boa percepção dependendo de que maneira respondemos à dinâmica da infecção atual na comunidade. Você sabe, temos duas forças. Tem um vírus que, se deixado por sua própria conta, continuará a contagiar rapidamente a população. E do outro lado você tenta fazer alguma coisa para conter essa progressão do vírus pela sociedade.
Você não tem necessariamente uma ressurgência no caso de uma onda que nem mesmo acalmou. Esta é a razão pela qual eu afirmo, quando as pessoas falam de uma segunda onda no verão, que você não pode falar de uma segunda onda porque ainda estamos na primeira. E queremos acabar com ela. Depois veremos se conseguiremos manter a situação assim.
Há um número específico de casos ou testes, ou alguma outra coisa para dizer definitivamente que a primeira onda chegou ao fim?
O que você quer ver quando testa, de maneira ampla em um monitoramento, é a porcentagem de pessoas que são positivas em nossa sociedade e nos Estados Unidos - tenho de enfatizar isto -você tem de ser cuidadoso quando fala sobre estar satisfeito em fazer isto, aquilo, ou alguma outra coisa nos Estados Unidos. Este é um país enorme. É muito heterogêneo e não pode ser visto de maneira unidimensional porque o que você consegue fazer com segurança em uma parte dele, em um Estado ou uma cidade, pode ser completamente diferente em outro por causa da dinâmica, que é distinta.
Mas o que gostaria de ver, seja numa região, Estado ou cidade, é que a porcentagem de testes positivos para a infecção continue a diminuir e diminuir até chegar a um dígito. Quando chegarmos nesse ponto, então podemos achar que há um bom controle de modo que, no caso de uma nova onda de infecções, você consegue evitar que ocorra um ressurgimento de muitos, muitos casos mais.Já estamos vendo picos e as repercussões desses picos à medida que os Estados começam a reabrir. Que tipos de defesas ainda são importantes? Há medidas que você acha que estão sendo ignoradas ou rapidamente esquecidas? É preciso ter cuidado com declarações generalizadas porque elas não se aplicam a todos os Estados ou cidades. A melhor maneira de evitar a infecção quando você está num local onde a dinâmica do vírus está claramente ativa é evitar a concentração de pessoas e multidões; usar máscara o tempo todo quando sabe que provavelmente vai encontrar pessoas. Você tem de ficar atento às diretrizes apropriadas para o lugar onde está. Se é uma cidade grande. Uma pequena cidade. Um condado. O que pode ser bom em uma área do país, pode não ser em uma outra região.
Além do coronavírus também temos protestos em todo o país e uma eleição daqui a cinco meses. O senhor se preocupa com a retomada dos comícios e grandes protestos? Quando você tem uma concentração de pessoas, o risco aumenta. Não importa a razão pela qual as pessoas estão reunidas. Quando elas se juntam num espaço em que há um vírus ativo circulando na comunidade, elas correm risco. É preciso usar máscara. O melhor mesmo é evitar multidões independente de local. Se por uma razão ou outra você acha que não importa o que eu diga ou o que dizem outras autoridades de saúde, você vai se reunir em grupo de qualquer maneira, pelo menos use uma máscara. E por favor, não importa o lugar em que estiver, seja numa manifestação ou num comício, se ficar empolgado e quiser se expressar, resista à tentação de tirar a máscara. Essas são coisas que você precisa fazer.
Em pandemias passadas vimos exemplos de ondas subsequentes que acabaram sendo mais letais do que a primeira. O senhor acha que assim será no caso do coronavírus? Não, acho que este é um momento, eu diria, em que não temos nenhum dado para fazer uma previsão. Não precisamos necessariamente aceitar a inevitabilidade de que, se os casos diminuírem neste verão haverá uma segunda onda no outono e no inverno. Não há evidências indicando que atravessamos a primeira onda. E estamos falando do momento atual: 120 mil mortes nos Estados Unidos e mais de dois milhões de infectados. Gostaria de ver os número reduzidos a praticamente zero antes de começarmos a falar de uma segunda onda. Vamos nos concentrar neste momento presente.Se o senhor tivesse uma ou duas recomendações - a nível nacional ou mundial - que as pessoas devem ter sempre em mente à medida que a vida começa a retornar a uma nova normalidade, quais seriam? Uma é que esta pandemia vai acabar e estamos dentro da nossa capacidade para pôr fim a ela, tanto do ponto de vista de saúde pública e, espero, num espaço de tempo breve, com os avanços científicos que nos fornecerão intervenções na forma de vacinas e tratamentos. Mas estamos todos juntos. E é importante para a economia e o emprego e a sobrevivência das pessoas que retornemos à normalidade.
A maneira como retornaremos à normalidade é nos juntarmos para tentar e acabar com a pandemia. E você também é responsável pela sua própria saúde. Além disto, como vivemos num enorme país e numa comunidade global, o que fazemos como indivíduo terá impacto no sucesso ou não, do controle da pandemia. Assim, por favor, se atenham a isto: (sabemos que) é duro. É duro para todo mundo. Mas lembrem-se, estamos todos envolvidos nisto. Não somos peças individuais separados. Estamos juntos nessa luta. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
* Adriana Usero, do The Washington Post, contribuiu para este artigo
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