EUA aumentam pressão sobre China para combater tráfico de uma das drogas mais viciantes do mundo

Tensões geopolíticas causam impasse em cooperação contra as drogas

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Por David Pierson, Edward Wong e Olivia Wang

THE NEW YORK TIMES - Há apenas quatro anos, um esforço conjunto americano e chinês para impedir que o fluxo de fentanil produzido na China chegasse aos Estados Unidos parecia prestes a decolar. Pequim havia anunciado a nova lei que proíbe o opioide sintético, levando o governo de Donald Trump a elogiar o líder chinês, Xi Jinping, por “um gesto humanitário maravilhoso”.

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Logo, agentes da lei da China e Estados Unidos uniram forças para investigar e processar os traficantes de fentanil na China.

Mas hoje, a cooperação entre os dois países contra o fentanil vive um impasse. Esforços mútuos para reprimir a droga, responsável por dezenas de milhares de overdoses nos Estados Unidos a cada ano foram, foram frustrados por tensões geopolíticas mais amplas sobre comércio, direitos humanos, Rússia e Taiwan. A falha na cooperação contra o fentanil é emblemática de como a relação bilateral se deteriorou de muitas formas.

Viciado em heroína e fentanil vive debaixo de viaduto em Lawrence, no Estado de Massachusetts Foto: Katherine Taylor/The New York Times

O secretário de Estado americano, Antony J. Blinken, liderou na sexta-feira a primeira reunião virtual de uma coalizão global de nações para acabar com a ameaça de drogas sintéticas perigosas. Em parte, a ideia é conseguir que outros países pressionem a China a fazer mais para conter o fluxo de produtos químicos usados para produzir fentanil.

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A China foi convidada a participar e se juntar à coalizão inicial de cerca de 80 países que concordaram em se envolver no esforço, mas não deu nenhuma indicação de que pretende participar, segundo Todd D. Robinson, secretário adjunto de Estado para assuntos internacionais, entorpecentes e aplicação da lei. Já o governo do México, outro país crítico na cadeia de abastecimento de fentanil e outros opioides mortais, se comprometeu a participar.

Secretária do Tesouro americano, Janet Yellen, encontra primeiro-ministro chinês, Li Qiang, em viagem a Pequim. Foto: AP Photo/Mark Schiefelbein, Pool

A questão também deve ser levantada em reuniões entre a secretária do Tesouro, Janet Yellen, e autoridades chinesas, em Pequim. Este ano, o Departamento do Tesouro impôs sanções a empresas chinesas e mexicanas suspeitas de produzir pílulas de fentanil, parte de um esforço mais amplo do governo dos EUA para conter a fonte da crise mortal.

A visita de Yellen segue a viagem de Antony Blinken a Pequim no mês passado. Na ocasião, ele pediu à China que retome a cooperação com os Estados Unidos no controle de narcóticos. Pequim interrompeu a comunicação com Washington sobre o assunto depois que a então presidente da Câmara, Nancy Pelosi, visitou Taiwan em agosto do ano passado.

Durante a visita Blinken, disse a repórteres que os dois países concordaram em “explorar a criação de um grupo de trabalho ou esforço conjunto” para combater o tráfico de fentanil. Mas qualquer perspectiva de cooperação desapareceu poucos dias depois, quando promotores federais dos EUA acusaram quatro empresas chinesas de traficar produtos químicos usados por cartéis de drogas mexicanos para fabricar grandes quantidades de fentanil vendidas nos Estados Unidos.

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Desde então, a China atacou os Estados Unidos na questão das drogas, acusando o governo americano de transferir a culpa por próprios problemas sociais para Pequim e negar os próprios fracassos na luta contra a epidemia de fentanil.

“Os Estados Unidos devem enfrentar seus próprios problemas e não devem se esquivar”, disse o porta-voz do Partido Comunista Chinês em comentário recente ao jornal Diário do Povo. “Atacar e difamar a China não vai resolver o problema crônico do abuso de drogas nos Estados Unidos, só vai atrasar o controle de drogas nos Estados Unidos e transformar em uma crise social maior.”

A China tem uma experiência própria no assunto. O país foi vítima do comércio de ópio da Grã-Bretanha durante o século XIX.

“Devido à memória dolorosa da Guerra do Ópio, a China é o país do mundo que mais odeia as drogas”, disse um editorial no mês passado no Global Times, um tabloide partidário.

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O fentanil praticamente não tem mercado doméstico na China. Por isso, analistas avaliam que Pequim tem menos incentivo para regulamentar os compostos químicos, que também têm uma série de usos legais na indústria médica.

Em vez disso, Pequim provavelmente vê a crise do fentanil como uma oportunidade para dominar Washington, no momento em que se frustra com as ações dos EUA vistas como uma contenção da China. Isso inclui restringir o acesso chinês à tecnologia avançada de semicondutores e fortalecer os laços de segurança entre os Estados Unidos e os vizinhos da China, como Japão, Coreia do Sul e Filipinas. Analistas dizem que Pequim vai querer algo de valor em troca da ajuda ao governo Biden na questão do fentanil.

Alguns analistas chineses culpam a política doméstica dos EUA pela crescente pressão do governo Biden sobre a China em relação ao fentanil.

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“As políticas antidrogas nos EUA têm sido fracas e o ano da eleição presidencial está chegando”, disse Wu Xinbo, reitor de estudos internacionais da Universidade Fudan em Xangai. “Isso dá ao Partido Republicano a oportunidade de atacar os democratas e o governo Biden. É por isso que estamos vendo os EUA exagerando nessa questão.”

A China proibiu todas as variantes do fentanil em 2019, cumprindo uma promessa de Xi Jinping ao então presidente Donald Trump. Como resultado, as exportações diretas de produtos químicos relacionados ao fentanil para os Estados Unidos despencaram.

Mas especialistas dizem que a fiscalização chinesa ficou progressivamente mais fraca quando ficou claro para Pequim que o governo Trump não suspenderia as tarifas comerciais impostas à China um ano antes. Isso levou a um aumento no envio dos compostos químicos para o México, onde os cartéis de drogas fabricam e despacham grande parte do fentanil que acaba nos Estados Unidos.

Apreensão de fentanil na fronteira dos EUA com o México: popularização da droga tem aumentado mortes por overdose nos EUA Foto: U.S. Customs and Border Protection/Handout via REUTERS

Analistas dizem que a disputa sobre o fentanil destaca diferenças fundamentais em como Washington e Pequim tratam a rivalidade entre os dois países. O governo Biden acredita que pode competir com a China em questões estratégicas como segurança e tecnologia e, ao mesmo tempo, cooperar em questões de interesse mútuo, como mudança climática e controle de drogas.

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“A China disse: ‘Não, não estamos interessados nessa proposta. Se você quer cooperar nessa questão, precisa cooperar no relacionamento estratégico’”, disse Vanda Felbab-Brown, especialista em política global de drogas e membro da Brookings Institution. Ela encorajou Washington a coordenar outros países para pressionar a China e considerar ferramentas mais punitivas, como sanções, para obter a cooperação chinesa no comércio de drogas.

Wu, o analista chinês, disse que a abordagem de Washington soa arrogante para a China porque o governo Biden tenta ditar os termos do compromisso.

“Os EUA pensam que, quando querem cooperar com a China, a China deve cooperar”, disse Wu. “Quando quer reprimir a China em nome da concorrência, pode reprimir a China sem nenhuma preocupação.”

Na questão do fentanil, Pequim se vê com poder para extrair concessões de Washington em outras questões, dizem analistas.

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“Os chineses há muito veem a cooperação com os EUA não como um bem em si, mas como uma fonte de impulsionamento, e hoje a necessidade da China por por esse impulso é substancial e crescente”, disse Evan Medeiros, professor da Universidade de Georgetown que foi diretor sênior da Ásia em o Conselho de Segurança Nacional no governo Obama.

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