O secretário de Estado dos Estados Unidos, Antony Blinken, afirmou nesta quarta-feira, 31, que a China se recusou em se reunir com autoridades do alto escalão do Pentágono após um encontro entre aeronaves militares sobre o Mar do Sul da China na semana passada. A recusa foi condenada por Blinken, que descreveu o episódio como “desnecessariamente agressivo”.
Um vídeo de 30 segundos divulgado na terça-feira pelos militares dos EUA mostra um caça chinês cruzando a dianteira de um avião de vigilância da Força Aérea dos EUA a vários metros de distância. O vídeo teria sido gravado na sexta, 26, por um membro da tripulação dos EUA. O avião foi escoltado pelo caça por toda área de voo.
Em visita à Suécia, Blinken classificou o incidente de perigoso e disse que “apenas ressalta por que é tão importante que tenhamos linhas de comunicação regulares e abertas, inclusive entre nossos ministros da Defesa”. Ele se referia à suposta recusa do secretário de Defesa da China, Li Shangfu, em se reunir com o homólogo americano, Lloyd Austin, durante a cúpula de segurança de Singapura.
A China afirmou através do Ministério das Relações Exteriores que os EUA estão “bem cientes” do motivo da recusa, mas não informou claramente qual motivo seria esse. Uma das possibilidades são as sanções americanas aplicadas em 2018 contra Li Shangfu por compras de aeronaves e equipamentos de combate do principal exportador de armas da Rússia, a Rosoboronexport.
“O lado dos EUA deve (...) corrigir imediatamente suas práticas erradas, mostrar sinceridade e criar a atmosfera e as condições necessárias para o diálogo e a comunicação entre os dois militares”, disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Mao Ning, a repórteres.
Blinken afirmou que o mais perigoso neste caso é “ter um mal-entendido de uma falha de comunicação”. “Embora tenhamos uma competição real com a China, também queremos garantir que isso não se desvie (...) em conflito”, disse.
O avião americano envolvido no incidente é um RC-135, utilizado para coletar comunicações de rádio e outras informações eletrônicas. As autoridades do Comando dos EUA no Indo-Pacífico informaram que ele estava sobrevoando o espaço aéreo internacional e que continuarão a sobrevoar e operar na área, com permissão do direito internacional.
“Esperamos que todos os países da região do Indo-Pacífico usem o espaço aéreo internacional com segurança e de acordo com o direito internacional”, disse o comunicado dos EUA.
Tensões no Pacífico
A China afirmou que os EUA colocaram em risco a soberania da segurança nacional ao realizar reconhecimento regular próximo a sua área com navios e aviões. “Essas ações provocativas e perigosas são a causa raiz dos problemas de segurança no mar”, disse Mao Ning, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, durante uma coletiva de imprensa.
A interceptação captada no vídeo é o segundo incidente conhecido deste tipo entre China e EUA desde o fim do ano passado. Ela acontece em meio a uma disputa entre as duas superpotências que afeta a região do Indo-Pacífico. As duas competem por alianças e influência na região em meio às tensões crescentes sobre a Taiwan e aumento da presença militar.
Enquanto a China desenvolve novos equipamentos militares, os EUA buscam acordos na área de defesa com países da região para conter a influência chinesa.
Poucos dias do episódio entre as aeronaves, os EUA e a Papuásia-Nova Guiné assinaram um novo acordo que aproximará as duas nações e permitirá treinamentos militares em conjunto. Um acordo paralelo foi assinado no ano passado entre a China e as Ilhas Salomão, levando especulações de que a China pode tentar construir uma base militar no local. Os arquipélagos ficam separados por 2 mil quilômetros.
As tensões entre as duas potências aumentaram no início deste ano após a descoberta por autoridades americanas de um balão de vigilância chinês sobre os Estados Unidos. O balão entrou no espaço aéreo americano sobre o Alasca e voou por dias em todo o país, incluindo perto de locais militares sensíveis, antes de ser abatido por um caça americano na costa da Carolina do Sul.
Autoridades de inteligência dos EUA avaliaram que o balão fazia parte de um vasto programa de vigilância executado pelos militares chineses. Depois que o dirigível apareceu sobre os Estados Unidos, Blinken cancelou uma visita muito esperada a Pequim, e as autoridades chinesas rejeitaram os pedidos para que Lloyd Austin falasse com altos funcionários chineses. Autoridades chinesas disseram que o equipamento era um balão meteorológico que saiu da rota, mas o governo Biden rejeitou a explicação.
Nos meses seguintes, Blinken indicou que esperava remarcar sua visita a Pequim. Ele declarou ao The Washington Post no início de maio que “há um sinal claro de demanda de todo o mundo de que gerenciamos essa relação com responsabilidade”. “Se houver áreas em que possamos realmente cooperar, porque é do interesse do nosso povo, do povo chinês e do povo de todo o mundo, tanto melhor”, disse então, “mas no mínimo precisamos ter um piso sob essa relação. Precisamos ter algumas grades de proteção.” /COM WASHINGTON POST
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