THE NEW YORK TIMES - Até agora, os Estados Unidos e seus aliados europeus mantiveram uma frente unida contra a invasão da Ucrânia pela Rússia. Mas após dois meses e meio de guerra, alguns sinais de atrito estão começando a surgir.
Eles se concentram na determinação americana, que cresceu com os sucessos militares ucranianos, de garantir que o conflito enfraqueça a Rússia “a ponto de não poder fazer o tipo de coisa que fez ao invadir a Ucrânia”, como o secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, colocou no mês passado.
As potências europeias, por outro lado, não querem uma longa guerra de atrito que corre o risco de escalada. Também não se interessam pelo o que acreditam que poderia ser uma perigosa humilhação da Rússia. Elas estão mais focadas em garantir um cessar-fogo na Ucrânia e uma retirada de tropas russas, pelo menos até as linhas que existiam antes do início da guerra. E acreditam que é fundamental manter um diálogo diplomático com o presidente russo, Vladimir Putin.
“Juntos, nunca devemos ceder à tentação da humilhação, nem ao espírito de vingança, porque eles já devastaram, no passado, os caminhos da paz”, disse o presidente francês, Emmanuel Macron, esta semana em um discurso em Estrasburgo. “Não estamos em guerra com a Rússia. Estamos trabalhando na Europa pela preservação da soberania e integridade territorial da Ucrânia e pelo retorno da paz em nosso continente”, acrescentou.
Um funcionário diplomático próximo a Macron, que falou sob condição de anonimato, descreveu a evolução da posição americana como consistindo essencialmente em armar a Ucrânia ao máximo e manter sanções à Rússia indefinidamente. Para os franceses, essa linha teria sido fonte de alguma frustração, disse.
A França, afirmou, quer pressionar fortemente pelas negociações porque não há outra maneira de garantir a segurança ucraniana e a segurança estratégica no continente europeu.
O funcionário disse que, no final, um relacionamento com Putin era inevitável.
Mario Draghi, o primeiro-ministro italiano, expressou uma linha de pensamento semelhante após uma reunião na terça-feira com o presidente americano, Joe Biden, em Washington.
“Devemos apoiar a Ucrânia”, disse Draghi. “Mas também devemos começar a falar sobre paz. Todas as partes devem fazer um esforço para se sentar ao redor de uma mesa, mesmo os Estados Unidos”, acrescentou.
O impulso das potências europeias - pelo menos aquelas que não estão na vizinhança imediata da Rússia, como a Polônia e os Estados Bálticos - é que a defesa da Ucrânia não deve se transformar na busca de uma vitória esmagadora sobre a Rússia de Putin.
Os Estados Unidos, no entanto, parecem ver pouca chance de diplomacia no momento. Avril D. Haines, diretora de inteligência nacional dos EUA, disse à Comissão de Serviços Armados do Senado nesta semana que Putin estava “se preparando para um conflito prolongado na Ucrânia durante o qual ele ainda pretende alcançar objetivos além do Donbas”.
Haines disse que as agências de inteligência americanas não acreditam que Moscou possa exercer controle sobre a região de Donbas, no leste da Ucrânia, e a zona de amortecimento que a Rússia quer estabelecer - através da costa do Mar Negro da Ucrânia até a região da Transnístria, na Moldávia - nas próximas semanas. Mas ela disse que o líder russo estava buscando um objetivo de longo prazo.
“Putin provavelmente também julga que a Rússia tem maior capacidade e disposição para enfrentar desafios do que seus adversários”, disse Haines. “E ele provavelmente está contando que EUA e UE enfraqueçam à medida que a escassez de alimentos, a inflação e os preços da energia piorarem.”
Sua avaliação não mencionou possíveis cessar-fogos, retirada de tropas russas, diplomacia ou potencial neutralidade ucraniana e as garantias de segurança que o governo de Kiev precisaria das potências ocidentais para isso.
São assuntos que interessam intensamente a França, Alemanha, Itália e outros estados europeus mais próximos da guerra do que os Estados Unidos.
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