EUA pedem extradição de espião russo que se passava por brasileiro

Pedido foi recebido na terça pelo Itamaraty e deverá ser julgado pelo STF, mas decisão final cabe ao Presidente da República; Rússia também pediu extradição

PUBLICIDADE

Foto do author Carolina Marins
Atualização:

O governo dos Estados Unidos pediu na última terça-feira, 25, a extradição de Sergei Cherkasov, o espião russo preso após tentar entrar na Holanda com identidade brasileira falsa. O pedido deve ser enviado ao Ministério da Justiça e cabe ao Supremo Tribunal Federal julgá-lo, mas decisão final será do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), segundo a lei. A Rússia já havia solicitado a extradição, alegando que Cherkasov é um traficante.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, o pedido “será prontamente encaminhado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), autoridade central para a cooperação jurídica internacional”. Em nota enviada nesta quinta-feira, 27, ao Estadão, o Itamaraty acrescentou que não poderia fornecer dados específicos sobre o caso em razão do direito à privacidade.

Cherkasov foi preso no início de abril de 2022 pela Polícia Federal após a polícia holandesa interceptá-lo no aeroporto, onde desembarcou para atuar no Tribunal Penal Internacional, e enviá-lo de volta ao Brasil. Ele atuou durante anos como espião do serviço de inteligência militar da Rússia, o GRU, nos Estados Unidos, fingindo ser um estudante brasileiro.

O espião russo Sergey Vladimir Cherkasov usava o nome falso de Victor Muller Ferreira Foto: Reprodução/PF

PUBLICIDADE

Pela lei brasileira, todo estrangeiro pode ser extraditado a qualquer momento por ter cometido crimes no Brasil ou fora, desde que o Brasil tenha um tratado recíproco de extradição com o país que solicita, como é o caso dos Estados Unidos. Porém, o pedido pode trazer um impasse diplomático, já que a Rússia também pediu a extradição de seu nacional - não pelo crime de espionagem, como os EUA, mas por acusá-lo de ser um traficante.

Depois de recebido via Itamaraty, o pedido é repassado para a Justiça e entregue ao STF que analisa se o pedido cumpre os requisitos para extradição. No entanto, o Presidente da República tem o poder de negar a extradição mesmo se o STF decidir por aprová-la, um precedente que existe desde 2009, quando o Supremo julgou o caso de extradição de Cesare Battisti. Embora tenham aprovado o envio do italiano, os juízes na época decidiram que o Presidente tinha a decisão final sobre os pedidos. Na ocasião, Lula negou a extradição.

Identidade brasileira

O espião vivia em São Paulo, usava o nome falso de Victor Muller Ferreira e se passava por brasileiro. Ele usou essa identidade para ir estudar na Universidade John Hopkins, nos Estados Unidos, de onde tentou conseguir estágios em agências governamentais e internacionais. Ao conseguir um cargo no Tribunal Internacional em Haia, foi descoberto por autoridades americanas e holandesas e deportado para o Brasil.

Na universidade, o espião poderia se aproximar de qualquer setor do establishment de segurança dos Estados Unidos, do Departamento de Estado à CIA. Segundo um depoimento registrado pelo FBI, o acesso que obteve possibilitou que o espião colhesse informações a respeito das maneiras com que as autoridades do governo Joe Biden responderam à concentração de tropas russas nas proximidades da Ucrânia, pouco antes da invasão.

O russo viveu como estudante brasileiro nos Estados Unidos e na Irlanda. Como mostrou o Estadão, um inquérito aberto na Polícia Federal de São Paulo mapeia “atos de espionagem” de Cherkasov também no Brasil. Também há suspeitas de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

Publicidade

Sua prisão ocorreu no início de uma operação de desmantelamento, atualmente em andamento, de redes de inteligência russas por toda a Europa que foi lançada após a invasão da Rússia à Ucrânia e que, afirmam autoridades, infligiu um dano maior às agências de espionagem do Kremlin do que qualquer outro esforço desde o fim da Guerra Fria.

A Rússia nega que Cherkasov seja espião e solicitou sua extradição do Brasil apresentando uma suposta segunda identidade falsa, alegando que ele não é nem estudante nem agente secreto, é na verdade um traficante de heroína procurado que fugiu da Rússia para evitar ser preso. Pela versão russa, os crimes teriam sido cometidos entre 2011 e 2013. Os registros da imigração brasileira, porém, apontam que a primeira viagem dele ao Brasil ocorreu em 2010. Em 2011, ele entrou no País pela segunda vez.

O espião foi condenado a 15 anos de prisão pela Justiça Federal de São Paulo por causa do uso continuado de documentação falsa. Desde dezembro ele está em um presídio federal de Brasília./Com informações de W.POST e Vinícius Valfré

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.