LA PAZ - O ex-presidente Evo Morales, líder da oposição na Bolívia, divulgou um vídeo nas redes sociais relatando uma tentativa de prisão e um ataque a tiros, neste domingo, 27. O carro do político foi atingido por disparos em meio às crescentes tensões políticas no país entre seus apoiadores e o governo do seu ex-aliado, o presidente Luis Arce.
Nas imagens, Morales é filmado ao lado do motorista. No telefone, o ex-presidente afirma: “Estão atirando em nós, estão nos detendo, rapidamente, mobilizem-se”.
No vídeo, é possível ver marcar de tiros no carro, além do motorista ferido com sangue na cabeça e no peito. Segundo a rádio Kawsachun Coca, foram disparados 14 tiros contra o carro de Morales.
“O carro em que cheguei tem 14 tiros. Me surpreenderam. Felizmente, hoje, salvamos nossas vidas (...). Os que atiraram estavam encapuzados (...). Isto foi planejado, era para matar Evo”, disse em entrevista à rádio Kawsachun Coca.
Horas mais tarde, por meio da rede social X, Morales afirmou que denunciou o episódio à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e acusou agentes do governo de Luis Arce, seu ex-aliado, pelo atentado.
“Denuncio de maneira urgente” ante a CIDH “que agentes de elite do Estado Boliviano atentaram contra minha vida no dia de hoje (domingo)”, informou Morales em seu perfil no X.
Os governos de Colômbia, Venezuela, Honduras e Cuba expressaram solidariedade ao ex-presidente boliviano.
“Toda minha solidaridade a Evo, o fascismo ascende en toda a América Latina. Já não apenas pela eliminação jurídica, mas pela eliminação física”, afirmou o presidente colombiano Gustavo Petro, sem fazer referência, contudo, à acusação de Morales ao Estado boliviano.
Agricultores seguidores do ex-presidente seguem bloqueando estradas da Bolívia para evitar a provável prisão de Morales, investigado pelo suposto abuso de uma menor durante seu mandato em 2015. Agora um opositor do governo de seu ex-ministro Luis Arce, o ex-presidente chama o caso de “mais uma mentira” que foi investigada e arquivada pelo sistema judiciário em 2020.
O atual presidente, Luis Arce, tenta conter os bloqueios, mas o incidente ameaça intensificar os conflitos, agravando a já tensa situação econômica que os bolivianos enfrentam.
Neste domingo, também pelas redes sociais, Arce respondeu que instruiu “uma imediata e minuciosa investigação para esclarecer o ocorrido”.
“Qualquer prática violenta na política deve ser condenada e esclarecida”, afirmou o presidente, que foi ministro da Economia durante os 14 anos em que Morales esteve no governo e hoje é seu adversário político.
As interdições nas estradas intensificaram a escassez de combustível, provocando longas filas de veículos nos postos de gasolina das cidades. Além disso, os preços dos produtos básicos dispararam nos mercados.
Os bloqueios começaram em 14 de outubro, organizados por camponeses que exigem o “fim da perseguição judicial” contra Morales, investigado pelos crimes de “estupro e tráfico de pessoas”.
Morales, o primeiro indígena a governar a Bolívia, não compareceu a uma intimação do Ministério Público do departamento de Tarija para prestar depoimento, o que pode levar as autoridades a decretar sua prisão.
Leia também
Entenda o conflito
No sábado, 26, o ex-presidente afirmou que os bloqueios promovidos por seus simpatizantes em diversas vias do país vão continuar. Já são quase duas semanas de mobilizações, com enfrentamentos entre policiais e camponeses que deixaram mais de dez feridos.
“O povo são e honesto não se vende, nem se rende. A luta (bloqueios e protestos) vai continuar, o povo não se rende”, disse Morales à rádio.
“Lucho (o presidente Luis Arce) deve respeitar o povo e resolver os problemas econômicos que o povo boliviano tanto está sofrendo neste momento”, indicou o ex-presidente, que governou a Bolívia entre 2006 e 2019.
Os enfrentamentos entre policiais e camponeses pró-Morales durante a tentativa de desbloqueio de vias deixaram 14 agentes feridos e 44 civis detidos. Os choques mais violentos ocorreram em Parotani, um setor no meio da rota que liga Cochabamba a La Paz, a sede de governo.
O presidente Arce destacou o trabalho da polícia para liberar “pelo menos 12 pontos” de bloqueio e garantiu, em referência a Morales, que “não permitirá que o interesse de uma pessoa se sobreponha ao bem-estar coletivo”.
“Nosso governo continuará executando ações para defender a segurança de todos os bolivianos, restabelecer o direito constitucional ao trânsito livre”, afirmou Arce na rede social X. O governo mobilizou mais de 1.700 policiais e 113 veículos para desbloquear as vias.
Segundo um relatório da Administradora Boliviana de Rodovias (ABC, na sigla em espanhol), há 16 pontos de bloqueio no país, a maioria concentrados no departamento de Cochabamba, reduto de Morales./ AFP e AP
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.