Êxodo de 250 mil pessoas para os EUA amplia risco de colapso populacional em Cuba

Combinação entre sanções no governo Donald Trump, o bloqueio econômico e a alta global dos preços provocada pela pandemia tira os mais jovens da ilha

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Cerca de 250 mil pessoas fugiram de Cuba em direção aos Estados Unidos neste ano, segundo dados do governo americano. O êxodo, provocado por uma combinação entre o impacto do colapso da reaproximação entre Havana e Washington no governo Donald Trump, o bloqueio econômico e a alta global dos preços trazida pela pandemia e a guerra na Ucrânia, pode levar, segundo analistas, a uma redução populacional e da força de trabalho na ilha.

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A mulher do motorista de táxi Joan Cruz Méndez é uma destes cubanos. Em março, Cruz, 41 anos, comprou uma passagem de avião para sua esposa voar para o Panamá e usou suas economias para pagar US$ 6.000 a um contrabandista para levá-la aos Estados Unidos, onde ela pediu asilo político. Ela está trabalhando em uma loja de autopeças em Houston.

Ainda em Cuba, de onde tentou sair três vezes, o taxista dá a dimensão da crise que afeta dos cubanos. “Acho que grande parte da população perdeu a esperança, que é a última coisa que você pode perder”, disse. Em uma dessas tentativas, ele navegou por 50 km no estreito que separa Cuba da Flórida, mas teve de voltar.

Quando o mar está calmo, Cruz e seus vizinhos esperam que o contingente local da Guarda Costeira cubana termine seu turno, antes de carregar as embarcações improvisadas em seus ombros pela cidade e sobre rochas escarpadas antes de baixá-las suavemente na água e tentar mais uma vez.

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Imigrantes cubanos aguardam assistência legal após terem sido deportados dos EUA Foto: Daniel Becerril/Reuters

Fuga de cérebros

Mesmo para uma nação conhecida pelo êxodo em massa, a onda migratória atual é que as que a antecederam. Cerca de 3 mil pessoas partiram do porto de Camarioca em 1965 e 125 mil partiram de Mariel em 1980. Em 1994, protestos de rua levaram a um êxodo de cerca de 35.000 pessoas, que deram à costa da Flórida em boias e embarcações precárias.

A onda atual não tem fim à vista e ameaça a estabilidade de um país onde a expectativa de vida é de 78 anos e tem cada vez mais idosos na sua população.

“Esta é a maior fuga de cérebros quantitativa e qualitativa que este país já teve desde a revolução”, disse a antropóloga Katrin Hansing, da Universidade da Cidade de Nova York. “São os melhores, os mais brilhantes e os que têm mais energia.”

A partida de muitos cubanos mais jovens e em idade de trabalhar augura um futuro demográfico sombrio para o país. Atualmente, o governo comunista mal consegue pagar as magras pensões de que a população mais velha do país depende.

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“A saída de cubanos de sua terra natal é nada menos que “devastadora”, disse Elaine Acosta González, pesquisadora associada da Florida International University. “Cuba está se despovoando.”

Imigrantes cubanos são expulsos dos Estados Unidos e deportados para o México Foto: Jose Luis Gonzalez/Reuters

Sanções e pandemia

A fuga da ilha ficou mais fácil no ano passado, quando a Nicarágua deixou de exigir visto para a entrada de cubanos no país. Milhares de cubanos venderam suas casas e pertences e voaram para Manágua. Ali, recorreram a coiotes para percorrer os 2,7 mil quilômetros que separam o país da fronteira dos EUA com o México.

As condições de vida em Cuba sob o regime comunista há muito são precárias, mas tanto a pandemia como as sanções impostas pelo governo Trump foram devastadoras para o turismo, a principal fonte de recursos de Cuba. Nos últimos três anos, as reservas financeiras de Cuba diminuíram. As importações – principalmente alimentos e combustível – caíram pela metade. A comida ficou mais cara e escassa, assim como os remédios. Até o fornecimento de energia elétrica foi afetado.

Os apagões são constantes e a situação é tão terrível que a companhia elétrica do governo se gabou neste mês de que o serviço elétrico funcionou ininterruptamente naquele dia por 13 horas e 13 minutos.

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A chegada de milhares de cubanos à fronteira sul americana tornou-se um problema para o governo de Joe Biden. Analistas dizem, no entanto, que Washington enfrenta um problema que ajudou a criar.

Para atrair os eleitores cubano-americanos no sul da Flórida, o governo Trump descartou a política de reaproximação do presidente Barack Obama, que incluía restaurar as relações diplomáticas e aumentar as viagens à ilha. Essa política foi substituída por uma campanha de “pressão máxima” que aumentou as sanções e limitou severamente quanto dinheiro os cubanos poderiam receber de suas famílias nos Estados Unidos, uma importante fonte de receita, Com isso, para milhares de cubanos a solução foi emigrar.

“Não é difícil de entender: se você devastar um país a 90 milhas de sua fronteira com sanções, as pessoas virão à sua fronteira em busca de oportunidades econômicas”, disse Ben Rhodes, que atuou como vice-conselheiro de segurança nacional no governo de Obama e foi a pessoa de referência nas conversações com Cuba.

Embora o presidente Biden tenha começado a recuar em algumas das políticas de Trump, ele demorou a agir por medo de irritar a comunidade cubana na Flórida e incorrer na ira do senador Robert Menendez, um democrata e poderoso cubano-americano que preside o Senado Relações Exteriores Comitê, disse William M. LeoGrande, professor da American University, que escreveu extensivamente sobre as relações EUA-Cuba.

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