Explicações contraditórias de Trump seguem uma cartilha familiar; leia a análise

Ex-presidente e aliados ofereceram com frequência versões conflitantes para defender a retenção de documentos por parte do ex-presidente

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Por Zolan Kanno-Youngs e Maggie Haberman
Atualização:

THE NEW YORK TIMES — Primeiramente, ele disse estar “trabalhando e cooperando com” os agentes do governo que, segundo alega, entraram em sua casa indevidamente. Então, quando o governo revelou que o FBI, durante a operação de busca, recuperou 11 conjuntos de documentos marcados como confidenciais, ele sugeriu que os agentes plantaram evidências.

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Finalmente, seus assessores alegaram que ele possuía uma “ordem vigente” para a suspensão da confidencialidade dos documentos retirados do Salão Oval e encontrados em sua residência — e que parte do material estava protegida por confidencialidade advogado-cliente e privilégio executivo.

Essas são as explicações permanentemente contraditórias que o ex-presidente Donald Trump e seus assessores têm dado em relação ao que os agentes do FBI encontraram na semana passada durante a operação de busca que realizaram em sua residência de Mar-a-Lago, em Palm Beach, Flórida.

Donald Trump deixa a Trump Tower, em Nova York, dois dias depois que agentes do FBI revistaram sua casa em Mar-a-Lago Palm Beach Foto: David 'Dee' Delgado/Reuters - 10/08/2022

Trump e seus aliados qualificam a operação de busca como um ataque partidário ao mesmo tempo que amplificam argumentos conflitantes a respeito da manipulação de documentos sensíveis e não respondem a uma questão no centro da investigação federal: Por que Trump estava mantendo esses documentos, alguns ainda marcados como confidenciais, em um resort sem segurança adequada na Flórida enquanto as autoridades buscavam recuperá-los havia um ano?

As versões em defesa, com frequência contraditórias, narradas por Trump e sua equipe desde a operação de busca do FBI seguem uma cartilha familiar ao ex-presidente. Ele a utiliza há décadas, mais visivelmente quando enfrentou uma investigação a respeito da suspeita de sua campanha eleitoral de 2016 ter conspirado juntamente com os russos e em seu primeiro julgamento de impeachment.

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Em ambas as situações, ele alegou ser vítima e combinou alguns fatos com uma tempestade de declarações enganosas ou falsas. Os advogados de Trump negaram que ele tenha condicionado o fornecimento de ajudas militares vitais à Ucrânia ao seu desejo de investigações contra Joe Biden e seu filho, Hunter Biden.

Quando informações que contradizem essas versões em defesa de Trump emergiram em um livro ainda não publicado de John Bolton, ex-conselheiro de segurança nacional do ex-presidente, advogados do ex-presidente mudaram de narrativa, insistindo aos investigadores que o ex-presidente não condicionou a ajuda, mas que, se tivesse feito isso, não se trataria de um delito punível com impeachment.

Ataque de amnésia

Entre as várias investigações de que Trump é alvo atualmente — incluindo uma investigação estadual na Geórgia e duas investigações em tribunais de júri, todas relacionadas aos esforços do ex-presidente de permanecer no poder após o término de seu mandato — a investigação federal sobre a suspeita de ele ter manipulado documentos sensíveis retirados da Casa Branca emerge como uma das potencialmente mais prejudiciais.

O mandado de busca revelado publicamente na sexta-feira informou que os agentes federais tinham recuperado documentos ultrassecretos durante seu cumprimento, na residência de Trump na Flórida, na semana passada, como parte de uma investigação sobre possíveis violações da Lei de Espionagem e outras legislações.

Entre os 11 conjuntos de documentos apreendidos, havia alguns marcados como “confidencial/USS/ISC” — termo que serve como abreviação para “informação ultrassecreta, sensível e compartimentada”, de acordo com um inventário do material apreendido durante a operação de busca. Esse tipo documento deve ser analisado apenas dentro de instalações seguras. O inventário de documentos incluiu outros materiais, alguns descritos como confidenciais.

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A revelação estarrecedora deixou clara a gravidade da investigação do Departamento de Justiça meses após a agência federal Arquivos Nacionais e Administração de Documentos afirmar que havia descoberto a existência de informações sigilosas em documentos que Trump retirou da Casa Branca ao deixar a presidência.

Trump e seus assessores têm dado explicações conflitantes em relação ao que os agentes do FBI encontraram em sua mansão  Foto: Marco Bello/Reuters - 15/08/2022

“O que ele não tem direito é ter posse desses documentos; os documentos não são dele”, afirmou Jason Baron, que foi diretor de litígios dos Arquivos Nacionais por mais de uma década. “Nenhum registro presidencial deveria estar em Mar-a-Lago, seja confidencial, aberto, sujeito a privilégio executivo ou sujeito a confidencialidade advogado-cliente”.

Documentos cobertos por privilégio executivo devem ser mantidos em instalações do governo.

Um porta-voz de Trump não respondeu uma mensagem solicitando comentário.

Trump usou a manipulação indevida de material sigiloso praticada por Hillary Clinton, conforme registrado na investigação de 2015 e 2016 do Departamento de Justiça sobre os e-mails da ex-candidata a presidente, como munição política em sua campanha para a presidência. Trump está considerando uma nova campanha nacional em 2024, e dúvidas a respeito da suspeita de ele ter manipulado indevidamente segredos dos EUA poderiam ser problemáticas para ele, mesmo na ausência de uma investigação.

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Depois de autoridades dos Arquivos Nacionais tentarem por vários meses recuperar material de Trump, ele devolveu 15 caixas de documentos em janeiro. No mês seguinte, os Arquivos Nacionais confirmaram a descoberta das informações sigilosas e remeteram o assunto para o Departamento de Justiça.

Trabalhadores removem caixas de mudança do Escritório Executivo Eisenhower, onde trabalhava Ivanka Trump na Casa Branca Foto: Jim Lo Scalzo/EFE

Ao longo dos meses que se seguiram, as autoridades vieram a saber que Trump ainda tinha em posse mais documentos, guardados em Mar-a-Lago, que alguns de seus conselheiros insistiram para ele devolver.

Trump descreveu a devolução das 15 caixas de documentos como “um processo comum e rotineiro”. Mas os governos americanos são obrigados a entregar seus registros aos Arquivos Nacionais há mais de 40 anos como parte da Lei de Registros Presidenciais — criada em resposta à tentativa do ex-presidente Richard Nixon de retirar da Casa Branca documentos e registros de seu governo depois de renunciar em desgraça.

Kash Patel, ex-autoridade do governo Trump, justificou subsequentemente a manipulação dos documentos afirmando que o ex-presidente tinha suspendido seu sigilo antes de deixar a função — alegação ecoada nesta semana por Trump.

Em um comentário transmitido pela Fox News na noite da sexta-feira, o escritor de extrema direita John Solomon, um dos representantes de Trump para interagir com os Arquivos Nacionais, leu uma declaração emitida pelo escritório do ex-presidente garantindo que Trump conta com uma “ordem vigente” durante sua presidência dando conta de que “documentos removidos do Salão Oval e levados para a (sua) residência teriam a confidencialidade suspensa no momento em que ele os removesse”.

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Essa alegação não resolveria a investigação. Duas das leis citadas no mandado de busca executado na semana passada criminalizam remoção e ocultação de registros do governo independentemente de os documentos terem ou não qualquer coisa a ver com segurança nacional. E leis contra a remoção de documentos com informações restritas de segurança nacional não dependem da classificação técnica de confidencialidade do material.

Bolton, que foi o terceiro conselheiro de segurança nacional de Trump e ocupou o cargo por 17 meses, afirmou nunca ter ouvido falar da ordem vigente que o escritório de Trump alega vigorar. Isso é, afirmou ele, “quase certamente uma mentira”.

“Jamais fui informado a respeito de nenhuma ordem, procedimento ou política desse tipo quando entrei no governo”, afirmou Bolton, acrescentando que posteriormente também não ouviu falar nada a respeito disso. “Se algo como isso existisse, teria de ser marcado publicamente, para que as pessoas soubessem que isso existe.”

Além disso, apontou ele, instalações seguras para análise de material sensível foram construídas em clubes de Trump na Flórida e em New Jersey, onde ele com frequência passava fins de semana quando era presidente, querendo dizer que os documentos não teriam de ter a confidencialidade suspensa. E se os documentos não fossem confidenciais, afirmou Bolton, eles seriam considerados sujeitos a requerimentos de registros públicos.

Ele continuou: “Quando alguém começa a fabricar mentiras assim, isso evidencia um nível de desespero real”.

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A alegação de que os documentos mantidos na Flórida tiveram a confidencialidade suspensa também contradiz uma afirmação feita por um dos advogados de Trump em junho. Em uma declaração por escrito, a equipe do advogado afirmou que todo material marcado como confidencial guardado em Mar-a-Lago havia sido devolvido ao governo.

Esta semana, Trump acusou novamente o Departamento de Justiça de agir como ferramenta de seus oponentes políticos, uma tática familiar de um ex-presidente que tentou repetidamente politizar o departamento durante os quatro anos que ocupou o poder. Descrevendo o FBI como uma corporação corrupta, Trump sugeriu que seus agentes haviam plantado material incriminatório em Mar-a-Lago durante a operação de busca e exigiu que lhe sejam devolvidos documentos que, segundo o ex-presidente, estão protegidos por privilégio executivo.

Tais acusações de motivação política fizeram com que o secretário de Justiça, Merrick Garland, defendesse os agentes do FBI durante breves declarações que ele fez esta semana. As acusações não provadas de Trump também emergiram no momento em que o FBI e o Departamento de Segurança Interna emitiram um boletim de inteligência, na semana passada, alertando para um aumento no número de ameaças contra agências federais de policiamento após a operação de busca em Mar-a-Lago, incluindo chamamentos generalizados por “guerra civil” ou “rebelião armada”. / TRADUÇÃO DE GUILHERME RUSSO

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