Favorito para ser futuro chanceler da Alemanha tenta retomar ‘era de ouro’ do país

Perseguido pelos manifestantes, mas aparentemente a salvo de estragos nas pesquisas, Friedrich Merz está deixando para trás o fracasso em uma jogada de imigração

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Por Jim Tankersley (The New York Times) e Tatiana Firsova (The New York Times)

Ele estava saindo da autobahn, sorrindo para uma multidão na hora do rush, e a mente de Friedrich Merz tinha se voltado para os velocímetros.

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“Agora, ao comprar um carro novo, há um novo sistema automático”, comentou o homem encaminhado para ser o próximo chanceler da Alemanha na tarde de sexta feira. “Se ultrapassamos o limite de velocidade nem que seja em dois quilômetros por hora, a coisa começa a apitar.”

Esses bipes são o produto de uma regulamentação da União Europeia. Para Merz, eles foram um exemplo oportuno e organizado das intrusões do governo que ele culpa por prejudicar a economia alemã e frustrar seus cidadãos.

Eles também foram uma transição útil para as questões em que Merz espera repousar, como uma bela cadeira de capitão de couro, na reta final antes das eleições parlamentares da Alemanha em 23 de fevereiro.

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Outdoor de campanha eleitoral de Friedrich Merz, líder do partido conservador alemão União Democrata Cristã (CDU) e candidato a chanceler, em Frankfurt. Foto: Kirill Kudryavtsev/AFP

Merz e seu partido, os democratas cristãos (conservadores), suportaram duas semanas nervosas depois que ele fez uma aposta política e quebrou um tabu de décadas ao votar com rivais da extrema direita em uma tentativa fracassada de endurecer as leis de imigração.

Seguiu-se a indignação. Candidatos rivais perceberam uma abertura. Mas as pesquisas realizadas desde então indicam que Merz emergiu relativamente ileso. Mesmo que agora seja visto como uma figura mais polarizadora, o ex-empresário e conservador de longa data parece mais uma vez estar navegando em direção à chancelaria.

Merz está reorientando seu discurso de campanha para a regulamentação da UE, a burocracia federal, a ética de trabalho, os custos de energia e outros ingredientes do que os líderes empresariais chamam de componentes de uma crise competitiva alemã. Ele está dizendo aos eleitores que um mundo cada vez mais volátil precisa ter no comando um chanceler mais forte e estável do que o atual líder da Alemanha, Olaf Scholz, dos social-democratas (centro-esquerda).

O preço do desvio desastroso de Merz para a política de imigração e os benefícios de trazer a campanha de volta a um território mais amigável e familiar ficaram evidentes durante a parada que ele fez na semana passada na pequena cidade de Stromberg, no oeste do país, onde o único restaurante aberto para almoço no centro da cidade era uma sorveteria.

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Olaf Scholz, chanceler alemão do Partido Social Democrata (SPD), à esquerda, e Friedrich Merz, à direita, líder da União Democrata Cristã (CDU), em um debate em Berlim. Foto: Fabrizio Bensch/AP

Cerca de 1 em cada 6 trabalhadores está empregado na indústria no Estado densamente arborizado e produtor de vinho, Renânia-Palatinado. A economia do estado encolheu quase 5% em 2023, mostram estatísticas do governo. Um funcionário do partido disse que o local foi escolhido em parte por causa da proximidade da rodovia, fácil para a chegada dos participantes e de Merz de carro. Muitos dos participantes disseram ter vindo de fora da cidade.

Eles foram recebidos, como é cada vez mais o caso de Merz atualmente, por manifestantes. Desde que Merz quebrou o tabu de trabalhar com a Alternativa para a Alemanha, ou AfD, partes da qual são classificadas pela inteligência alemã como extremistas, eleitores indignados passaram a segui-lo de parada de campanha em parada. Alguns acusam Merz de trabalhar com nazistas. Outros o acusam de ser um deles.

“Ele não é adequado como chanceler”, disse Walter Witzke, um dos cerca de 150 manifestantes que se reuniram em temperaturas quase congelantes do lado de fora do ginásio em Stromberg onde Merz discursou. “Ele cometeu o maior dos erros ao ter votado com a AfD agora.”

Witzke carregava uma placa que dizia “cinco minutos até 1933”, uma referência ao início da era nazista na Alemanha. Sua esposa, Heike Witzke, que se juntou a ele no protesto, disse que temia pela democracia do país — e estava triste com a reação contra imigrantes. “Você nunca deve perder a esperança, mas no momento está muito, muito ruim”, disse ela.

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A Sra. Witzke disse que a maioria de seus amigos veio do exterior, e que ela faz biscoitos para celebrar feriados com vizinhos muçulmanos. “Funciona, não temos problemas nenhum”, disse ela.

Dentro do ginásio, onde uma banda de jazz de 11 integrantes aquecia a multidão com sucessos de música de salão, os apoiadores de Merz estavam muito mais preocupados com os imigrantes que recebem assistência social.

“Essa migração da pobreza está simplesmente nos sobrecarregando agora”, disse Elke Müller, executiva de uma empresa de cosméticos.

Ela disse que era fã de Merz e que era aceitável que ele pressionasse pelas medidas mais duras de imigração nas quais a AfD votou. “Acho que ele tem experiência econômica”, disse ela. “Ele pode se impor. E podemos confiar nele. E ele é confiável. E acho que ele é o homem certo para o momento que temos agora.”

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As pesquisas sugerem que uma pluralidade de eleitores concorda. Elas mostram Merz e seu partido pairando em torno de 30% de apoio no eleitorado alemão, um número relativamente baixo para um aspirante a chanceler, mas bem à frente de seu rival mais próximo.

Algumas pesquisas sugeriram que a jogada da imigração teve algum custo para Merz entre os eleitores. Outras encontraram um ligeiro ganho. Nenhuma sugere que isso tenha alterado fundamentalmente a disputa. De acordo com a mais recente pesquisa do Politbarometer, 30% dos alemães dizem que votarão no partido de Merz, 1 ponto percentual a mais do que no final de janeiro. A AfD está em segundo lugar, com os sociais-democratas e os verdes ficando para trás.

Merz abordou a controvérsia a respeito da imigração e do seu voto perto do fim de seu discurso, que durou mais de uma hora. Ele defendeu sua decisão, mas prometeu nunca formar um governo com a AfD — uma distinção que apoiadores como a Sra. Müller disseram ser importante.

Manifestantes em protesto contra a extrema direita, em Berlim, Alemanha. A Alemanha, com sua história de governo nazista e Holocausto, há muito se considerava imune a uma extrema direita convencional, mas a Alternativa para a Alemanha (AfD) está agora em segundo lugar nas pesquisas com um recorde de 20%. Foto: John Macdougall/AFP

Merz chamou a imigração de uma das questões críticas que o país enfrenta, mas ele se inclinou mais para seu discurso econômico, prometendo reduzir impostos e regulamentações para empresas e construir novos reatores nucleares para reduzir os custos de energia.

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A candidata local que apresentou Merz se desculpou porque as regulamentações de segurança contra incêndio limitaram o número de participantes. Ela reconheceu a presença dos manifestantes, chamando-os de um sinal de democracia.

Merz disse ao seu público que a eleição deste mês seria uma “eleição direcional” para a Alemanha e o mundo.

“Talvez devêssemos dar uma olhada rápida além das fronteiras nacionais e reservar um breve momento para considerar a situação ao nosso redor”, disse ele em certo ponto. Ele então listou os desafios globais, incluindo “a guerra na Ucrânia, uma China cada vez mais agressiva, grandes problemas na coesão da União Europeia” e o novo governo do presidente Trump.

Em meio a esses desafios, ele perguntou: “Onde se situa a Alemanha, na verdade?”

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Enquanto Merz terminava, a última luz do dia desapareceu sobre a autobahn. Aplausos cresceram no ginásio. Do lado de fora, alguns moradores passeavam com seus cachorros, olhando com expressões confusas para o brilho do comício. Policiais se reuniam em duplas e trios.

Todos os manifestantes tinham ido embora./TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

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