ESPECIAL PARA O ESTADÃO, DE BUENOS AIRES - Muitos portenhos que foram votar nas primárias partidárias da Argentina neste domingo tiveram que esperar em longas filas para concluírem a votação. Em Buenos Aires, além da tradicional votação com cédulas de papel com listas fechadas de candidatos a presidente e vice, senadores, deputados e parlamentares do Mercosul, os eleitores votaram eletronicamente para cargos municipais.
A experiência inédita na cidade, do voto com urna eletrônica, mostrou deficiências já no começo do dia, com máquinas que não funcionavam, apagavam sozinhas ou não imprimiam comprovantes eleitorais. Devido a “numerosos incidentes” com as urnas eletrônicas, que produziram “grandes filas de votantes”, a juíza federal María Servini estendeu o horário de votação de algumas escolas da capital das 18h para 19h30.
Segundo ela, que tem competência eleitoral na capital argentina, o episódio evidencia uma “imperícia nunca antes vista na organização e execução de um processo eleitoral”. “É preocupante o grau de improviso tanto da empresa contratada para a provisão e instalação das máquinas de votação, como do próprio Instituto de Gestão eleitoral”, escreveu ela para a Câmara Nacional Eleitoral.
A própria candidata Patricia Bullrich, que disputa a candidatura da aliança Juntos por el Cambio (Juntos pela Mudança, em português) contra o atual prefeito da capital, Horacio Rodríguez Larreta, disse que sua urna eletrônica falhou em diversas ocasiões e classificou a votação na cidade como “um desastre”.
“Tentei votar sete vezes e acontecia uma coisa muito estranha, porque eu votava em uma lista e terminava aparecendo outra diferente, na qual eu não queria votar, e a máquina também não imprimia”, revelou, contando que trocar sua urna. “Acho que os sistemas eleitorais tem que ter um nível de amadurecimento, tem que ser provados e trabalhados durante um tempo para ver se efetivamente funciona. Minha experiência pessoal foi ruim”, afirmou.
No bairro de Constitución, eleitores denunciaram ter esperado quase duas horas na fila, do lado de fora da escola e em pleno inverno, por problemas com as urnas eletrônicas. Na Faculdade de Direito da capital, onde houve um intenso fluxo de eleitores e filas durante o dia, algumas máquinas não funcionaram durante a manhã, mas técnicos foram chamados e resolveram o problema, explicou ao Estadão uma funcionária que orientava os eleitores que chegavam para votar.
Durante a tarde, os eleitores já não reclamam de problemas nas máquinas ou de falta de cédulas com listas de candidatos, um problema comum em eleições anteriores. “Na minha sala tinha muita gente, mas não tive nenhum problema com a urna eletrônica”, contou o advogado Federico Aliñari, 45 anos, que preferiu não revelar em quem votou.
“Na mesa em que estive só tinha uma pessoa. Mas em algumas mesas tinha muita fila. Achei o sistema de votação eletrônico tranquilo. Eu votei na Patricia Bullrich, acho que ela é a candidata mais forte e decidida, e precisamos dessa fortaleza para lidar com os problemas de segurança da Argentina”, mencionou na saída da faculdade o aposentado Fernando Andrade, de 61 anos. Apesar da percepção geral de desânimo em relação aos candidatos, ele acredita que o argentino ainda vota com esperança. “Nada será resolvido em 4 anos, mas pior do que estamos, não podemos ficar”, concluiu.
“Nossa mesa estava vazia, foi muito rápido”, contou o eletricista Miguel Molina, de 24 anos. “Vim votar pensando que quero algo melhor para a Argentina. Moro em uma comunidade, na Villa 31, e tenho esperança em uma mudança. Votei no Milei e conheço muita gente que vai votar nele”, diz, sobre o candidato ultraliberal, que defende a dolarização da economia e a extinção do Banco Central.
Os irmãos estudantes de eletrônica Facundo e Emiliano Gutiérrez, de 19 e 21 anos, por sua vez, votaram no atual ministro da Economia Sergio Massa para presidente, por acreditarem que a situação do país, que lida com 115% de inflação anual, não pode piorar. “Acho que ele consegue controlar essa crise para chegarmos a uma estabilidade. Eu não votaria na oposição, porque eles não ligam para os pobres”, afirma o mais velho da dupla.
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Já o estudante de cosmetologia Mauro Nina foi votar, mas diz ter rasgado a cédula antes de colocar no envelope que é inserido na urna. “Já não sei em quem confiar, não gosto de nenhum”, diz ele, que aos 23 anos afirma não se interessar por política, e preferiu anular seu voto, à diferença dos seus amigos, que votarão no direitista Milei.
Em Córdoba, o casal Raúl Viqueira, de 68 anos, e Maria Adela Errazquin, de 66, contam que esperaram muito durante a manhã para poder votar porque os mesários demoraram para chegar, mas que depois o processo foi tranquilo. Eles optaram por Larreta, e dizem que se ele não ganhar de Bullrich, competidora da coligação, acabarão votando nela. “Não votaríamos nem no governo, nem no Milei. Seria nossa única opção”, explicam.
Até as 18h20 da noite, o comparecimento às urnas chegava a 66%, o índice mais baixo desde o início das primárias presidenciais em 2011. A menor participação até agora tinha sido 74,91%, em 2015.
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