Um dos maiores doadores corporativos do partido populista Reform UK vendeu quase US$ 2 milhões em transmissores, equipamentos de cabine, antenas e outras tecnologias sensíveis para um grande fornecedor da agência estatal de armas de Moscou, que está na lista de proibição, mostram os documentos.
De 2023 a 2024, a empresa, parte da fabricante aeroespacial britânica H.R. Smith Group, enviou o equipamento para uma empresa indiana que é a maior parceira comercial da agência de armas russa, Rosoboronexport.
O H.R. Smith Group doou £ 100 mil (pouco menos de US$ 130 mil) para o Reform UK no ano passado, dois dias após Nigel Farage ser anunciado como líder do partido. A empresa é administrada por Richard Smith, um empresário dono do endereço 55 Tufton Street, uma casa em Westminster que abriga alguns dos grupos de pesquisa e lobby de direita mais influentes do Reino Unido.
O H.R. Smith Group disse que suas vendas eram legais e que o equipamento era destinado a uma rede indiana de busca e salvamento. As peças “apoiam operações de salvamento” e “não são projetadas para uso militar”, disse Nick Watson, advogado da empresa.
Os registros não provam que os produtos da H.R. Smith foram parar na Rússia. Mas mostram que, em alguns casos, a empresa indiana recebeu equipamentos da H.R. Smith e, em poucos dias, enviou peças para a Rússia com os mesmos códigos de identificação do produto.
Os componentes têm usos civis e militares e foram sinalizados pelas autoridades britânicas e americanas como essenciais para o esforço de guerra da Rússia na Ucrânia. As autoridades pediram aos exportadores que realizassem verificações detalhadas para garantir que seus clientes não estejam redirecionando equipamentos restritos para Moscou. A empresa estatal indiana, Hindustan Aeronautics, é identificável em registros públicos como fornecedora do exército russo, mas não está sob sanções financeiras.
A H.R. Smith se recusou a dizer qual foi o procedimento de diligência conduzido antes de fazer as vendas, ou se buscou garantias da Hindustan Aeronautics de que seus produtos não acabariam na Rússia.
A disposição da Índia de negociar com a Rússia, apesar das sanções ocidentais, complicou os esforços para isolar o presidente russo Vladimir Putin e minar suas forças armadas. A Hindustan Aeronautics não respondeu às mensagens solicitando comentários.
Farage está tentando se estabelecer como a nova voz do conservadorismo britânico, mas gerou controvérsia ocasional com alguns comentários vistos como pró-Rússia.
A maioria dos britânicos apoia a Ucrânia, mostram as pesquisas, e no ano passado, o apoio ao Reform UK caiu depois que Farage alegou que o Ocidente havia provocado a Rússia a iniciar a guerra. No mês passado, o ex-líder do Reform UK no País de Gales compareceu ao tribunal sob acusações de aceitar subornos para fazer declarações no Parlamento Europeu que beneficiariam a Rússia e sua invasão da Ucrânia.
Contatado por telefone, Farage disse que “nunca aprovou nada que Putin tenha feito”, mas se recusou a comentar as vendas da H.R. Smith. Um porta-voz do partido disse que a doação era legal.
“Tais tentativas lamentáveis de difamar o Reform UK não funcionarão”, disse o porta-voz.
O que os registros mostram
O New York Times revisou os registros de remessas que mostram que a Techtest, pertencente ao H.R. Smith Group, fez 118 remessas de tecnologia restrita para a Hindustan Aeronautics em 2023 e 2024.
As peças, identificadas usando códigos internacionais específicos, foram vendidas por quase US$ 2 milhões.
Durante esse período, a empresa indiana fez pelo menos 13 remessas do mesmo tipo de peças para um comprador da Rosoboronexport, que está na lista de proibição das autoridades britânicas e americanas. A agência de armas russa pagou mais de US$ 14 milhões pelo equipamento, de acordo com os registros.
Em 2 de setembro de 2023, por exemplo, a Techtest vendeu à Hindustan Aeronautics duas remessas de equipamentos restritos, incluindo transmissores de localização e controles remotos. Dezenove dias depois, a empresa indiana vendeu peças para a Rússia com códigos de identificação correspondentes.
A Techtest vendeu outra remessa de tecnologia restrita para a Índia em 4 de fevereiro de 2024. Dezoito dias depois, a Hindustan Aeronautics vendeu equipamentos com códigos correspondentes para um comprador da Rosoboronexport, mostram dados alfandegários.
Os governos britânico e americano proibiram a venda desses produtos, conhecidos como “itens comuns de alta prioridade”, para a Rússia após a invasão em larga escala da Ucrânia por Moscou em fevereiro de 2022.
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Isso está dentro da lei?
As empresas são obrigadas a investigar seus clientes antes de vender tecnologia sensível. Watson disse que a H.R. Smith leva suas “obrigações da cadeia de fornecimento extremamente a sério” e segue todos os controles de exportação relevantes.
O Times compartilhou detalhes das vendas com cinco especialistas em controle de exportação e sanções do Reino Unido e dos EUA. Todos os especialistas disseram que, dependendo do procedimento de diligência realizado pela Techtest, a empresa pode ter violado os controles de exportação. Alguns disseram que era uma possível violação de sanções.
A National Crime Agency, às vezes chamada de FBI do Reino Unido, emitiu um “alerta vermelho” em 2023 alertando as empresas para ficarem atentas a intermediários que redirecionam equipamentos sensíveis para a Rússia.
Registros corporativos públicos mostram que a Rosoboronexport é o maior parceiro comercial da Hindustan Aeronautics. A empresa indiana também está listada como fornecedora russa em ferramentas de diligência comercial e bancos de dados de triagem que o governo dos EUA aconselha os exportadores a verificar.
A Techtest fez mais de 70 remessas de itens “Nível 2” — uma das categorias de tecnologia mais sensíveis — para a Hindustan Aeronautics de 2023 a 2024, mostram registros alfandegários./TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL
