A reunião do G-7 realizada em Hiroshima expôs os desafios que a ordem multilateral enfrenta, não apenas no tocante à gestão de crises globais, mas também na busca por diálogo além dos países membros do grupo.
As relutâncias manifestadas pelo Brasil e pela Índia em se alinharem aos líderes do G-7 reforçam a árdua tarefa de avançar na construção de um consenso global. Embora os países do G-7 compartilhem de um entendimento em relação à Ucrânia, condenando veementemente as agressões russas e partilhando a visão de contenção do poderio chinês, a tentativa de obtenção de apoio de Índia, Brasil e Indonésia esbarra na falta de confiança dessas nações.
Já a participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçou, ao final do encontro, a percepção do apoio brasileiro ao Putin. Ao não se reunir com o presidente da Ucrânia, o Brasil se distanciou mais da possibilidade de influenciar futuras negociações. Mesmo que a diplomacia brasileira alegue que o presidente buscou espaço na agenda, a ausência de empenho e diálogo evidencia que outros países adaptaram suas próprias agendas para realizar encontros bilaterais, enquanto o Brasil não o fez.
Apesar disso, o afastamento do Brasil em relação a esse tema específico não implica em uma política externa isolacionista para o país. A reunião do G-7 evidenciou que o Brasil possui condições propícias para se engajar em uma ampla agenda de desafios voltados à construção da ordem multilateral. A temática climática, por exemplo, representa um assunto em que o Brasil tem maior capacidade de influência e liderança nas discussões, o que lamentavelmente não se concretizou durante o encontro do G-7.
Embora a participação do presidente Lula não tenha alcançado o protagonismo almejado pela diplomacia, as reuniões bilaterais com outros líderes demonstraram o elevado interesse que o Brasil desperta e o reconhecimento de sua relevância econômica e regional por outros países.
Esses encontros bilaterais, além de terem resultados práticos, também servem para consolidar a percepção do público brasileiro de que Lula exerce influência e detém prestígio no âmbito internacional, sendo capaz de posicionar o Brasil no centro dos debates globais. Mas, o governo se defronta com um paradoxo ao buscar manter essa retórica, ao mesmo tempo em que, de fato, luta para se manter como interlocutor entre os líderes mundiais.
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Para além disso, a diplomacia brasileira deve incessantemente se esforçar para ressaltar a necessidade de reforma das instituições multilaterais, para ampliar sua capacidade de ação e resolução dos desafios globais. Entretanto, é imprescindível não ceder à ingenuidade diante da crescente bipolaridade mundial, na qual termos como “decoupling” (Estratégia de dissociação) e “de-risking” (Estratégia de diminuição de risco) integram as estratégias dos países ocidentais para conter o avanço da China.
Nesse contexto, o Brasil poderia tirar proveito do momento em que os Estados Unidos e as nações europeias buscam reduzir sua dependência em relação à China. Ainda que haja questões em aberto, tal fato indica a existência de espaço para que o Brasil aumente sua relevância no âmbito internacional.
Nessa nova dinâmica internacional, o Brasil se depara com um paradoxo, no qual vislumbra oportunidades para exercer uma influência cada vez maior, mas, ao mesmo tempo, corre o risco de negligenciar seu capital de prestígio e reputação. Urge, portanto, revisar e readequar a tradição diplomática brasileira aos interesses nacionais e à complexidade global, de modo que o país possa participar de forma efetiva nessa configuração global em constante transformação.
*Denilde Holzhacker é professora de relações internacionais da ESPM
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