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Gabriel Boric compara direita do Chile a Bolsonaro e Trump após acusações de fraude no referendo

Deputado afirmou que sistema eleitoral do Chile não é confiável e pôs referendo em xeque; presidente chileno diz que acusações seguem “manual da direita”

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Por Redação
Atualização:

O presidente do Chile, Gabriel Boric, comparou uma parte dos políticos de direita chilena ao presidente Jair Bolsonaro e ao ex-presidente americano Donald Trump após um deputado afirmar que o sistema eleitoral do país não é confiável. A afirmação foi feita nas vésperas do referendo que define se o Chile vai ter nova Constituição ou não, marcada para o dia 4 de setembro, e põe em dúvida a legitimidade da consulta popular. “Bolsonaro está fazendo isso no Brasil, Trump fez isso nos Estados Unidos”, declarou Boric nesta sexta-feira, 19.

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As acusações foram feitas pelo deputado Gonzalo de la Carrera, do Partido Republicano do Chile. Segundo Carrera, o sistema eleitoral chileno está considerando mortos e desaparecidos como aptos a votar – o que configura fraude, de acordo com ele. “Sabemos que não podemos confiar no Servel (serviço eleitoral do Chile) e que o governo com toda a sua maquinaria tentará roubar a eleição”, afirmou em um vídeo postado na sua conta oficial do Twitter.

As alegações repercutiram após outro tweet do deputado, que mostra uma imagem de pessoas em visita a um cemitério acompanhada da legenda “O Apruebo (grupo defensor da nova Constituição) e o Servel fazendo porta a porta”. Gonzalo faz campanha pelo Rechazo, que rejeita o projeto de nova Constituição, aprovado em julho após dois anos de discussão. Caso vença, o Chile continuará com a Carta Magna atual, escrita no regime de Augusto Pinochet.

Imagem mostra cópias de proposta da nova Constituição do Chile, colocada para referendo no próximo dia 4 de setembro. Se aprovada, texto vai substituir Carta Magna da época de Pinochet Foto: Alberto Valdes / EFE

Em um evento nesta sexta-feira, Boric rechaçou as acusações e afirmou que parte da direita chilena “está seguindo o manual tradicional daqueles que não acreditam na democracia”. “Que é questionar as agências examinadoras para tentar questionar os resultados se esses resultados não os favorecem”, afirmou.

“Como governo do Chile, vamos garantir que os resultados do plebiscito de 4 de setembro sejam aplicados. Eu pessoalmente acredito na sabedoria do povo do Chile”, acrescentou.

A comparação com Bolsonaro e Trump acontece após constantes alegações de fraudes no sistema eleitoral feitas pelos dois políticos. Em julho, o presidente brasileiro reuniu embaixadores de vários países em Brasília – encontro no qual o Chile não esteve presente – para repetir a tese nunca confirmada de que houve fraude nas urnas eletrônicas nas eleições de 2014 e 2018, propagada por ele desde que chegou ao governo. Já Donald Trump acusou fraude e pediu recontagem de votos nas eleições americanas ao perder para Joe Biden em 2021, num episódio que culminou na invasão ao Capitólio.

Segundo o presidente do Conselho de Administração da Servel, Andrés Tagle, o registro de mortos como aptos a votar faz parte de uma falha do sistema por não receberem certidões de óbito do Registro Civil. Em entrevista à rádio chilena Bío Bío, Tagle afirmou que tenta resolver o problema antes do referendo e que, mesmo que não seja resolvido a tempo, há uma segunda checagem na hora da votação. “Preferimos correr o risco de que haja pessoas a mais (no cadastro) do que tirar pessoas e depois prejudicar uma pessoa que tem o direito (de votar)”, declarou.

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Pesquisas recentes mostram que a escolha por uma nova Constituição (Apruebo) está 10 pontos porcentuais atrás da opção de manutenção do atual texto (Rechazo), embora pesquisas divulgadas na semana passada indiquem que a distância foi reduzida para cinco pontos. O resultado começou a reverter após o acordo assinado pelos partidos governistas de Boric que promete reformas no novo texto constitucional caso ele seja aprovado, numa estratégia para aproximar os indecisos e os partidários mais ao centro e centro-direita.

O acordo prevê a alteração via emenda constitucional de artigos mais polêmicos apresentados pelo projeto em votação, aprovado pela Assembleia Constituinte eleita em 2020, dominada por grupos de esquerda. Caberia ao Congresso, com a maioria dos partidos mais ao centro e à centro-direita, amenizar alguns artigos impopulares, sobretudo os relacionados aos direitos dos povos indígenas.

Conheça o projeto em votação

O projeto da nova Constituição, aprovado em julho após quase dois anos de discussão, estabelece que o Chile é “um Estado social e democrático de direito”; reconhece 11 povos indígenas com direito à autonomia e governo livre; consagra unidades territoriais indígena; cria sistemas universais de saúde, educação e segurança; e garante novos direitos, como moradia “digna e adequada”. Ele também estabelece dois sistemas judiciais, o nacional e o indígena.

Entre os pontos acordados, estão questões relacionadas aos direitos indígenas incluídos na Carta Magna em consulta. O acordo garante que as autonomias territoriais dos povos indígenas sejam “consistentes” com o caráter único e indivisível do território do Chile e especifica que os sistemas judiciais dos 11 grupos étnicos reconhecidos são aplicados somente as pessoas do mesmo povo. Além disso, questões de natureza nacional e reformas constitucionais são excluídas das consultas com os povos originários.

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Na educação, o acordo pede que seja acrescentado ao texto em votação um sistema educacional que inclua o ensino privado, frequentado pela maioria dos alunos do ensino médio. O mesmo se aplica à saúde, que vai acrescentar a permissão da saúde privada para os chilenos que querem e podem pagar.

No que diz respeito ao regime de pensões, o texto em votação cria um Sistema Público de Segurança Social. O acordo propõe um “novo modelo misto” e acrescenta a permanência de um componente de capitalização individual, no qual é baseado o atual modelo.

Com relação à segurança, o acordo estabelece a restauração da existência do estado de emergência, que não existe no texto em plebiscito.

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Além destes pontos, os políticos também buscam que os projetos de lei que resultem em gastos fiscais sejam apenas de competência do presidente, e não dos deputados, como propõe o texto para consulta.

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