PARIS - Os oponentes políticos do presidente francês, Emmanuel Macron, discutem nesta segunda-feira, 20, na Assembleia Nacional duas moções de desconfiança apresentadas na sexta-feira contra o governo de sua premiê, Elisabeth Borne.
Macron pediu ontem que a reforma chegue “ao fim de sua jornada democrática com respeito a todos”. O presidente está na defensiva desde que decidiu alterar as regras da previdência usando um dispositivo constitucional que evita a votação no Parlamento.
A reforma aspira aumentar a idade da aposentadoria de 62 para 64 anos e aumentar para 43 anos o período de contribuição necessário para receber uma pensão completa. A medida teve como resposta uma onda de manifestações pelo país.
Depois de semanas de mobilizações nas ruas, o governo recorreu ao artigo 49.3 da Constituição, medida controvertida que permite driblar o voto parlamentar para aprovar a reforma.
Após a manobra, deputados de forças opositoras apresentaram duas moções de censura. Membros do governo Macron esperam sobreviver à votação marcada para hoje porque a oposição está dividida.
Para que seja aprovada uma moção de censura, é necessário que toda a oposição se una. As atenções estão voltadas para a votação do partido de direita Republicanos. Seu líder, Eric Ciotti, anunciou que não votará a moção de censura, por isso espera-se que seus membros o sigam.
Ciotti denunciou via Twitter que sua sede foi vandalizada com pedras e avisou que “não cederá aos novos discípulos do terror”. Outros parlamentares favoráveis à reforma também foram alvo de ataques, o que ilustra a tensão no país europeu.
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Se uma das moções for aprovada, no entanto, seria um grande golpe para Macron: o projeto de lei da pensão seria rejeitado e sua primeira-ministra e todo o gabinete teriam de renunciar. Nesse caso, o presidente precisaria nomear um novo gabinete e descobriria que sua capacidade de aprovar a legislação está enfraquecida.
Macron, porém, manteria poderes substanciais sobre política externa, assuntos europeus e defesa. Como comandante-chefe das Forças Armadas, ele pode tomar decisões sobre o apoio da França à Ucrânia e outras questões globais sem aprovação parlamentar.
Os fortes poderes presidenciais da França são um legado do desejo do general Charles de Gaulle de ter um sistema político estável para a Quinta República que ele estabeleceu em 1958.
Independentemente do resultado de hoje, porém, o Executivo já foi afetado. Macron, que fez da reforma seu projeto estrela do segundo mandato, viu sua popularidade despencar em março, para 28%, a mais baixa desde 2019, segundo uma pesquisa realizada antes da aprovação por decreto da reforma.
Recriar vínculo
A presidente do grupo parlamentar governista, Aurore Bergé, reconheceu que a decisão de aprovar a reforma por via expressa impactou negativamente a opinião pública e que será necessário “recriar o vínculo” com os franceses.
O futuro da primeira-ministra parece menos certo. Se as moções de desconfiança falharem, Macron pode decretar a idade de aposentadoria mais alta, mas tentar apaziguar seus críticos com uma remodelação do governo.
Macron planeja propor novas medidas destinadas a reduzir a taxa de desemprego da França para 5%, de 7,2% agora, até o fim de seu segundo e último mandato.
Para ele, a reforma é necessária para evitar aprofundar o déficit nas próximas décadas, quando a França enfrenta um envelhecimento da população.
Mas seus críticos alegam que a reforma impõe uma carga injusta para trabalhadores com baixos salários, mulheres e pessoas com empregos que envolvem desgaste físico.
Outra opção nas mãos do presidente é dissolver a Assembleia Nacional e convocar eleições parlamentares antecipadas.
Esse cenário parece improvável por enquanto, já que a impopularidade do plano de pensão significa que a aliança de Macron dificilmente garantiria a maioria das cadeiras.
Se outro partido ganhasse, ele teria de nomear um primeiro-ministro da facção majoritária, dando poderes ao governo para implementar políticas que divergissem das prioridades do presidente. / AP e AFP
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