A Justiça eleitoral da Colômbia abriu nesta terça-feira, 6, uma investigação sobre supostas contribuições ilegais à campanha do presidente Gustavo Petro, depois de áudios publicados pela revista A Semana e atribuídos ao ex-embaixador da Colômbia na Venezuela, Armando Benedetti, insinuarem que a campanha recebeu dinheiro do narcotráfico. Em paralelo, a crise política provocada pelo escândalo paralisou o governo nesta semana, com a suspensão da tramitação de reformas do interesse de Petro, entre elas a trabalhista, do sistema de saúde e da previdência.
Os áudios mostram uma suposta conversa entre o então embaixador da Colômbia na Venezuela, Armando Benedetti, com a chefe de gabinete de Petro, Laura Sarabia. Benedetti diz ter arrecadado US$ 4 milhões (cerca de R$ 20 milhões ) para a campanha e dá a entender que parte do dinheiro veio de grupos ligados ao narcotráfico.
“Laura [...] Todos nós afundamos. Estamos todos acabados. Vamos presos [...] Com tanta merda que eu sei, todos nós vamos nos f... Se vocês me f.., eu vou f... vocês”, dizem os áudios.
Benedetti deixou o cargo na semana passada, mas na segunda-feira disse que as mensagens foram tiradas de contexto e estava “com raiva e bêbado quando as enviou”. Ele se recusou a confirmar se o dinheiro de fato vinha de narcotraficantes, mas disse à imprensa colombiana que “não vinha de empresários”.
Petro nega qualquer envolvimento com o caso e disse que sua campanha rejeitou qualquer doação que não tivesse de acordo com critérios legais. Sarabia e Benedetti devem depor no mês que vem à Comissão Nacional Eleitoral sobre o caso.
Na Câmara dos Representantes (equivalente à Câmara dos Deputados), o presidente David Racero disse nesta segunda-feira, 5, que as discussões das reformas estão congeladas até que haja condições políticas para dialogar e “reconstruir a coalizão de governo”. “Discussões tão importantes como essas, que implicam uma profunda transformação para o país, não podem ser mediadas por fatores externos que levem a um resultado negativo para a Colômbia”, disse Racero à imprensa colombiana.
A oposição solicitou que as reformas sejam arquivadas ante a imobilização do governo. “Ante as gravíssimas confissões sobre o financiamento de campanha do presidente Gustavo Petro, o Congresso deve arquivar as reformas apresentadas, no mínimo por ilegitimidade. Querem brincar com a saúde e o bolso dos colombianos”, escreveu o opositor David Luna no Twitter. Petro afirma que a pressão sobre o governo é uma chantagem.
Membros do Congresso também reclamam da demora do governo em enviar as reformas para o Congresso. Petro aprovou sem dificuldades a reforma tributária, a lei de paz total e o Plano Nacional de Desenvolvimento ao longo do primeiro ano do mandato, mas as três reformas em tramitação ainda estão em fase preliminar de discussão. Com o escândalo de Benedetti e Sarabia, dificilmente haverá tempo hábil e clima político para aprová-las antes do término do ano legislativo, como queria Petro.
Entenda o escândalo contra o governo de Petro
O escândalo começou no final de maio, depois que uma pasta com milhares de dólares foi roubada da casa de Sarabia. Uma empregada doméstica da ex-chefe de gabinete foi interrogada com um polígrafo na sede da Presidência e teve as conversas telefônicas interceptadas, por meio de um boletim de ocorrência falso que a ligava a traficantes de drogas.
Sarabia e Benedetti compartilhavam a mesma empregada doméstica e trocam acusações de complô, em uma intrincada história que ainda deixa muitas perguntas. O Ministério Público investiga o caso.
No poder desde agosto de 202, Petro iniciou o seu governo com o apoio da esquerda e de alguns partidos tradicionais no Congresso, mas a coalizão se desmanchou progressivamente e se distancia cada vez mais de suas reformas: reduzir a participação privada no sistema de saúde, redistribuir as terras improdutivas, reformar os sistemas de trabalho e previdência. Também ficou congelada sua iniciativa para desarmar organizações ilegais em troca de benefícios judiciais.
A nova crise política é particularmente dura para a popularidade de Petro, que estava em queda. Segundo a pesquisa mais recente do instituto Invamer, a aprovação de sua gestão caiu de 50% em novembro para 34% em maio. A oposição chegou a afirmar que esse percentual deve chegar perto dos 20% nas próximas pesquisas. /Com informações da AFP
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