OSLO - Tem sido um verão de calor e seca na Europa, afetando a economia e até regiões normalmente frias, um fenômeno agravado pelas mudanças climáticas. A França registrou grandes incêndios florestais, e o Vale do Loire está tão seco que o rio pode ser atravessado a pé.
Na Alemanha, o Rio Reno está muito baixo para transportar o carvão, ao qual o país está recorrendo para compensar a falta do gás russo, reacendendo as conversas sobre investir em energia nuclear.
A Itália está mais seca do que nunca desde 1800, e os produtores de arroz arbóreo agora correm o risco de perder a colheita. E, no Reino Unido, o julho mais seco em quase 90 anos provocou incêndios florestais nos arredores de Londres e deixou milhares de casas sem luz.
Talvez o impacto mais surpreendente da seca esteja no sul da Noruega, onde as ovelhas estão presas em bancos de lama e os salmões não têm água suficiente para migrar rio acima.
O abastecimento de reservatórios hidrelétricos – responsáveis por 90% da eletricidade da Noruega, assim como pelas exportações de eletricidade para vários de seus vizinhos – caiu para o ponto mais baixo em 25 anos, causando uma escassez que elevou os preços, especialmente no sul mais populoso, e provocou tensões políticas.
O calor extremo do verão e a seca devastadora, somados à redução das exportações de gás natural da Rússia – em resposta às sanções da União Europeia pela invasão da Ucrânia – expõem as vulnerabilidades do sistema energético da Europa em lugares inesperados e de maneiras imprevistas e as falhas em adotar outras energias renováveis, como a eólica.
A seca mais severa já registrada na França também afetou a produção de energia do país, já que as usinas nucleares responsáveis por mais de 70% da eletricidade tiveram de cortar suas atividades temporariamente. Muitas das 56 instalações atômicas já estavam desligadas por questões de manutenção.
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Agora, no entanto, os rios que resfriam os reatores ficaram tão quentes por causa do calor que regras rígidas destinadas a proteger a vida selvagem impediram a descarga da água ainda mais quente das usinas de volta aos cursos d’água. O regulador de energia nuclear da França concedeu isenções temporárias este mês, permitindo que cinco usinas continuem descarregando água aquecida em rios, o que qualificou de “uma necessidade pública”.
Mas os efeitos da mudança climática não têm causado problemas somente na Europa. Na China, o calor mais escaldante em seis décadas forçou o fechamento de fábricas no sudoeste do país.
Uma seca severa reduziu os rios, interrompendo o abastecimento de água e energia hidrelétrica da região e levando as autoridades a limitar a eletricidade a empresas e residências. Em duas cidades, os prédios de escritórios foram obrigados a desligar o ar-condicionado para poupar uma rede elétrica sobrecarregada, enquanto em outras partes do sul da China os governos locais pediram aos moradores e empresas que economizassem energia.
Os apagões contínuos e paralisações de fábricas, que afetaram a Toyota e a Foxconn, fornecedora da Apple, demonstram como o clima extremo está ampliando os problemas econômicos da China.
A economia caminha para o ritmo mais lento de crescimento em anos, arrastada pela rigorosa política de bloqueios, quarentenas e restrições de viagens em razão da pandemia de covid, à medida que os consumidores apertam os gastos e as fábricas produzem menos.
Os longos períodos de seca também devem reduzir significativamente a colheita de arroz da China, segundo o Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais.
E os humanos não são os únicos afetados pelo calor. Os zoológicos têm colocado camadas de gelo nas jaulas dos pandas. Os porcos transportados por caminhão na cidade de Chongqing, no sudoeste do país, ficaram desidratados, levando os bombeiros a darem banho de mangueira nos animais. As galinhas rejeitaram a ração e colocam poucos ovos no calor, provocando aumento dos preços do produto em todo o país.
A seca também prejudicou o fornecimento de eletricidade em Sichuan, província fortemente dependente da energia hidrelétrica. A capacidade das usinas caiu pela metade. Especialistas em clima dizem que a frequência e a intensidade de eventos climáticos extremos aumentarão nas próximas décadas, em razão da lenta redução global das emissões de gases de efeito estufa. /NYT
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